AI DE TI COPACABANA
Alceu Valença
Eu te procuro
No Leblon, Copacabana
Vejo velas de umbanda
Um buquê jogado ao mar
Um marinheiro, estrangeiro, desumano
Deixou seu amor chorando querendo se afogar
No mar,
Oh, oh, no mar
Eu te procuro nos lençóis da minha cama
Ai de ti, Copacabana, será duro o teu penar
Pelo pecado de esconderes quem me ama
Ai de ti, Copacabana, será submersa ao mar
No mar
Oh, oh, no mar
O riacho navega pro rio
E o rio desagua no mar
Pororoca faz um desafio
No encontro do rio com o mar
No mar
Oh, oh, no mar
Então mergulho no meu sonho absurdo
Entre carros, conchas, búzios
Entre os peixinhos do mar
Lembro Caymmi, Rubem Braga, João de Barro
E sigo no itinerário da princesinha do mar
No mar
Oh, oh, no mar
ANJO
AVESSO
Carlos Fernando
Safada era a cara do anjo
Que no quarto noturno pintou
No meu ouvido falou
Loucuras de amor
Pegou minha mão e saímos na troca de passos
Que beijo molhado, escandalizado
Que até minha gata se escandalizou
Com um penacho de índio ele me coroou
Sou anjo avesso, sou Tupã presente
Guerreiro sempre, galho da semente
Do algodão, do pau-brasil
Da serpentina que coloriu
Os olhos do cego, a voz do anão
A vida e o meu coração de leão
ANJO DE FOGO
Alceu Valença
Eu sou como o vento que varre a cidade
Você me conhece e não pode me ver
Presente de grego, cavalo de Tróia
Sou cobra jibóia, Saci Pererê
Um anjo de fogo endemoniado
Que vai ao cinema, comete pecado
Que bebe cerveja e cospe no chão
Um anjo caolho que olhou os dois lados
Dormiu no presente, sonhou no passado
Olhou pro futuro e me disse que não
ANUNCIAÇÃO
Alceu Valença
Na bruma leve das paixões que vêm de dentro
Tu vens chegando pra brincar no meu quintal
No teu cavalo peito nu cabelo ao vento
E o sol quarando nossas roupas no varal
Tu vens, tu vens
Eu já escuto os teus sinais
A voz do anjo sussurrou no meu ouvido
E eu não duvido já escuto os teus sinais
Que tu virias numa manhã de domingo
Eu te anuncio nos sinos das catedrais
AGALOPADO
Alceu Valença
Quando eu canto, seu coração se abala
Pois eu sou porta-voz da incoerência
Desprezando seu gesto de clemência
Sei que o meu pensamento lhe atrapalha
Cego o sol seu cavalo de batalha
Faço a lua brilhar no meio-dia
Tempestade eu transformo em calmaria
Dou um beijo no fio da navalha
Pra dançar e cair nas suas malhas
Gargalhando e sorrindo de agonia
Se acaso eu chorar não se espante
O meu riso e o meu choro não têm planos
Eu canto a dor, o amor, o desengano
E a tristeza infinita dos amantes
Dom Quixote liberto de Cervantes
Descobri que os moinhos são reais
Entre feras, corujas e chacais
Viro pedra no meio do caminho
Viro rosa, vereda de espinhos
Incendeio esses tempos glaciais
ATEU COMOVIDO
Alceu Valença
Eu vinha descendo a ladeira
E ouvi no sussurro do vento
Que a vida se dá por inteiro
Ao homem que é só sentimento
Descendo a ladeira
Da Igreja da Sé
Ateu comovido
Em busca de fé
Fé em Deus, fé na terra, nos astros
Nos riachos, nas matas, nos lagos
No trabalho, fé nos sindicatos
Fé nos búzios, nas conchas do mar
AMIGA DE GRAÇA
Alceu Valença
Amiga de Graça de Aparecida
Tu lembras das patas dos porcos
da casa amiga
Dos velhos telhados das vozes da
brisa
Timbu coroado dançando nos caibros, amiga
Amiga de Graça de Aparecida
Minha amiga de Graça desaparecida
Tu lembras das patas dos porcos
da casa amiga
Nas novas barracas com búzios e figas.
Amigos do peito beberam
e trataram nossas feridas
ALGA MARINHA
(Alceu Valença)
Maria, minha rainha
Como nos contos de fadas
Te chamarei de Esmeralda
Isadora, tua dança
Te chamarei de Esperança
Ilha de Itamaracá
Maria, alga marinha
Como os peixes
Como as águas
Tu és mãe
Pois és mãe
Pois és Maria
Tu és filha de Iemanjá.
AMIGO DA ARTE
Alceu Valença
Caboclinho, é bonito te ver
Com sua flecha, cocar e tacape
A minha amada tem olhos de festa
E o nosso amor é amigo da arte
Dos caboclinhos de Tamandaré
Tejipió Chié
Caboclinho, eu carrego no peito
Teu coração rebelde e selvagem
A minha amada tem olhos de flecha
E o nosso amor é amigo da arte
ANDAR, ANDAR
Alceu Valença
Eu compus esta canção
Andando de Ipanema
Para o Baixo Leblon
Procurando te encontrar
No meu Rio de Janeiro
Eu compus esta canção
Andando de Ipanema
Para o Baixo Leblon
Feito um cão abandonado
Como o povo brasileiro
Andar, andar
Nas ruas do Rio
Do Rio de Janeiro
Dezembro, abril
"A todo mundo eu dou psiu
procurando por meu bem"
Ainda resta um assobio
Um desejo, nada além
Tudo vira desejo
Desejo de te encontrar
Conjugação de desejos
Nascendo do verbo amar
Amor e amar
Céu de anil
Serra do Mar
Meu pau-brasil
Somos filhos de um só ventre
Dessa terra mãe gentil
E as elites nos dividem
Como vai mal meu Brasil
E tudo vira desejo
Desejo e nada mais
Brasil, nação de desejos
Na triste praça da paz
AMOR QUE FICA
Alceu Valença
Fica o dito e não dito
Fica o dedo e fica o dado
Fica o feito e o desfeito
O carinho e o cuidado
Fica a chama, fica a vela
Fica a casa e fica a rua
A toalha na janela
Linda, caminhavas nua
Amor que fica é amor que fica
Fica a cama, fica o quarto
Um retrato e uma figa
Duas mãos e não mais quatro
Duas vidas divididas
AMOR QUE VAI
Alceu Valença
Amor que vai, amor que vem
Amor foge e vai embora
Amor que leva seus teréns
Pra não ter motivo de voltar
Amor que vai
Num cavalo alado chamado brisa
Amor que vem
Num galope rasgado na beira-mar
Amor maltrata, deseja
Amor comendo a maçã
Amor é pura incerteza
O que será amanhã?
ADMIRÁVEL GADO NOVO
Zé Ramalho Vocês que fazem parte
dessa massa
Que passa nos projetos do futuro
É duro tanto ter que caminhar
E dar muito mais do que receber
E ter que demonstrar sua coragem
À margem do que possa parecer
E ver que toda essa engrenagem
Já sente a ferrugem lhe comer
Eh! Oh! Oh! Vida de gado
Povo marcado eh! Povo feliz...
Lá fora faz um tempo confortável
A vigilância cuida do ¨normal¨
Os automóveis ouvem a notícia
Os homens a publicam no jornal
E correm através da madrugada
A única velhice que chegou
Demoram-se na beira da estrada
E passam a contar o que sobrou
Eh! Oh! Oh! Vida de gado
Povo marcado eh! Povo feliz.....
O povo foge da ignorância
Apesar de viver tão perto dela
E sonham com melhores tempos idos
Contemplam esta vida numa cela
Esperam nova possibilidade
De verem esse mundo se acabar
A arca de noé, o dirigível
Não voam nem se pode flutuar
Não voam nem se pode flutuar
AMANHÃ É
DISTANTE, O
Bob Dylan - versão: Geraldo Azevedo/Babau
E se hoje não fosse essa estrada
Se a noite não tivesse tanto atalho
O amanhã não fosse tão distante
Solidão seria nada pra você
Se ao menos o meu amor estivesse aqui
E eu pudesse ouvir o seu coração
Se ao menos mentisse ao meu lado
Estaria em minha cama... outra vez
Meu reflexo não consigo ver na água
Nem fazer canções sem nenhuma dor
Nem ouvir o eco dos meus passos
Nem lembrar meu nome quando alguém chamou
Se ao menos o meu amor estivesse aqui
E eu pudesse ouvir o seu coração
Se ao menos mentisse ao meu lado
Estaria em minha cama... outra vez
A beleza no rio do meu canto
A beleza em tudo o que há no céu
Porém nada com certeza é mais bonito
Quando lembro dos olhos do meu bem
Se ao menos o meu amor estivesse aqui
E eu pudesse ouvir o seu coração
Se ao menos mentisse ao meu lado
Estaria em minha cama... outra vez
ARREIO DE PRATA
Tito Lívio/Rodolfo Aureliano
O meu cavalo de arreio prateado
A namorada muito amada agarrada na garupa
Me protegendo dos malefícios da vida
E agarrada, muito amada, na garupa do cavalo
Iê, iê, arreio de
prata
Uô, uô, eu todo prateado
Muita boiada, muita cerca colocada
As meninas proibidas de fazer amor mais cedo
O meu cavalo e sua égua malhada
fazendo amor no terreiro da morada das meninas
Iê, iê, arreio de
prata
Uô, uô, eu todo prateado
E relinchavam pois gozavam liberdade
e as meninas não podiam nem gozar da vaidade
e as meninas até sonhavam com a cidade
e com os rapazes que porventura encontrassem
Iê, iê, arreio de prata
Uô, uô, eu todo prateado
E olhavam tanto , tanto para o meu cavalo
se imaginavam éguas e eu todo prateado
E olhavam tanto , tanto para o meu cavalo
se imaginavam éguas e eu todo prateado
Iê, iê, arreio de
prata
Uô, uô, eu todo prateado
AMOR COVARDE
Alceu Valença
Amor covarde, que morde que arde
Cadela magra, metade de mim
A madrugada se arrasta, tão lenta assim
Dor...dor...dor...
Moça bonita, novilha tão rara
Não há quem valha metade de mim
A dor do amor, navalhada que arde assim
Dor...dor...dor...
Estrela d´alva, pedaço de lua
A pele nua, cheirando a jasmim
Boca cereja, bandeja de prata do-in
Dor...dor...dor...
Moça bonita, novilha tão rara
Não há quem valha metade de mim
Nascemos sós, só seremos serenos no fim
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