JUNHO
Alceu Valença/Geraldo Valença
Eu sei que é junho, o doido e gris seteiro
Com seu capuz escuro e bolorento
As setas que passaram com o vento
Zunindo pela noite, no telheiro
Eu sei que é junho, esse relógio lento
Esse punhal de lesma, esse ponteiro,
Esse morcego em volta do candeeiro
E o chumbo de um velho pensamento
Eu sei que é junho, o barro dessas horas
O berro desses céus, ai, de anti-auroras
E essas cisternas, sombra, cinza, sul
E esses aquários fundos, cristalinos
Onde vão se afogar mudos meninos
Entre peixinhos de geléia azul
JÚLIA,
JULHO
Alceu Valença
Júlia gostava de julho
Que amava o inverno
Sombrio e soturno
Júlia gostava de julho
Julho era o seu agasalho
Manteau, guarda-chuva
Marquise noturna
Umbigo e abrigo
A fera e a fauna
Paixão e libido
Júlia gostava de julho
Em cima da cama
E debaixo do seu cobertor
Mas Júlia sabia que agosto viria
E julho partia morrendo de amor
Quando chega o mês de julho
Me lembro do meu amor
JACAREPAGUÁ BLUES
Zé Ramalho
Tão indecente
Foi o jeito que essa mina
Descarada, arranhada, repulsiva
Me jogou de repente
Eu já sabia das suas intenções
Maléficas contra mim
Por isso me precavi com todo alho e cebola
Que eu consegui encontrar
Mas o que eu não sabia
Era que você era
exata e precisa
Nos seus movimentos
Por isso confesso
Eu tô num terrível astral
Minha família me mandou um cartão postal
Pois tal cartão
Conseguiu me fazer chorar
E o reco-reco que eu brincava
E, mãe,
A senhora me bateu
Por que eu troquei
por um isqueiro
Pra poder fumar
Um tal negócio ou coisa parecida
Que faz
bem ou mal a saúde
Não me interessa, mãe
Vá perguntar ao Gabeira
se você pode fumar
Mas o capítulo
Da novela dolorida,
colorida, comovida
Que eu pedi pra ver
O personagem que encenava a contra a mão da gancho
A oficina telepática me sorria
Como um camafeu
Mas que a senhora não saiba
Que essa trama toda
Ia cair nas costas da pessoa que vos fala e
relata
O que aconteceu
|