25/01/2003
Tuberculoso,
o poeta Castro Alves (1847-1870) voltou para sua terra natal no interior da Bahia, e
reencontrou uma amiga de infância que desenvolveu por ele um sentimento profundo
São Paulo
- Tuberculoso, com um pé amputado e
deprimido, o poeta Castro Alves (1847-1870) voltou para sua terra natal no interior da
Bahia, Curralinho (cidade que hoje leva seu nome), buscando repouso e alívio para seus
sofrimentos. Lá, reencontra Leonídia Fraga (1844-1927), amiga de infância que
desenvolveu por ele um sentimento profundo e um tanto irreal. A história dos raros
encontros do casal motivou a pesquisadora Myriam Fraga a escrever Leonídia - A Musa
Infeliz do Poeta Castro Alves (Fundação Casa de Jorge Amado, 273 páginas, R$ 20),
que será lançado amanhã, na Pinacoteca do Estado, em São Paulo.
O poeta voltou à
casa da infância por orientação médica, em 1870, quando lhe restavam alguns meses mais
de vida. Tempo suficiente, porém, para uma convivência mais demorada com Leonídia, que
se permitiu alimentar uma grande paixão. "Mas não acredito que esse amor tenha sido
algo mais que platônico", conta Myriam, que iniciou a pesquisa há dez anos, quando
apresentou uma conferência na Academia de Letras da Bahia. "O que primeiro me chamou
a atenção foi a coincidência dos nossos sobrenomes. Depois, fiquei intrigada com um
romance que os biógrafos de Castro Alves só mencionam de forma ligeira."
A presença da
mulher, entretanto, deixou marcas profundas. O poeta havia recém-terminado seu romance
com a atriz portuguesa Eugênia Câmara e o carinho de Leonídia foi reconfortante.
"Creio que o mais provável é que o poeta tenha alimentado com atenções e poemas a
devoção da mulher", comenta Myriam, que localizou na obra de Castro Alves versos
inspirados na amiga.
Como em Anjos da
Meia-Noite - 7ª Sombra: "Certo... serias tu, donzela casta,/ Quem me tomasse em
meio do Calvário/ A cruz da angústia, que o meu ser arrasta!..." Há fortes
referências também em O Hóspede e Fé, Esperança e Caridade, sugestivo
título que retratava uma situação. E, segundo o escritor e estudioso Afrânio Peixoto,
o poeta dedicou-lhe ainda Os Perfumes.
Aos 23 anos, Castro
Alves era um homem bonito e famoso e apesar da saúde precária, era muito cortejado pelas
moças. Por sua condição de mulher interiorana, Leonídia não teve coragem de revelar
seu amor, contentando-se com a rara convivência com o poeta.
Castro Alves acabou
voltando para Salvador, onde morreu. Leonídia casou-se com outro, mas logo se separou -
seguiu acreditando em uma paixão que lhe marcou a existência. Aos poucos, foi se
afastando da realidade e mergulhando em um sonho. "Morta a esperança, resta a
alienação, morte em vida", observa Edinha Diniz, que escreveu o texto de
apresentação do livro. Em 1913, foi internada no Hospício São João de Deus, em
Salvador. Na ficha de inscrição, escreveu que foi forçada a se separar do marido porque
era noiva do poeta Castro Alves. Carregava uma trouxinha com poemas manuscritos, receitas
de doces preferidos do poeta e um caderno em que anotava seus delirantes pensamentos.
Leonídia Fraga viveu
naquele hospício durante 14 anos, até sua morte, segundo consta, agarrada à trouxinha.
"Foi a densidade dessa figura trágica que me cativou", conta Myriam, que
retomou o assunto há três anos, quando descobriu que os documentos do hospício estavam
em ordem e bem guardados no Arquivo Público do Estado da Bahia.
A pesquisadora
conseguiu o valioso testemunho de Raimundo Nonato de Almeida Gouveia, médico e biógrafo
de Castro Alves, que acompanhou os últimos anos de Leonídia. Conversaram durante três
horas, em 1998, quando ele forneceu mais detalhes sobre a musa do poeta. A entrevista
está reproduzida no fim do volume. (Ubiratan Brasil)
Serviço - "Leonídia
- A Musa Infeliz do Poeta Castro Alves". De Myriam Fraga. Editora: Fundação Casa de
Jorge Amado. 273 páginas. R$ 20,00.
(© estadao.com.br)
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(arquivo NordesteWeb)
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