da Folha Online
O artista plástico
pernambucano Cícero Dias morreu hoje de manhã, aos 95 anos, em sua casa em Paris, de
falência múltipla dos órgãos.
Ele estava acompanhado
da mulher, a francesa Raymonde, e da filha, Sylvia. O pintor teve anemia há cerca de um
mês e recebia cuidados médicos em casa. O enterro será na segunda-feira, no cemitério
de Montparnasse, na capital francesa.
O artista é considerado um dos maiores nomes do modernismo brasileiro. Ele
nasceu em 5 de março de 1907 na pequena cidade de Escada, no interior de Pernambuco.
Em 1920, aos 13 anos, Cícero se mudou para o Rio de Janeiro. Foi interno no
mosteiro de São Bento. Entre 1925 e 1927, teve seu primeiro contato com os modernistas.
Em 1928, realizou sua primeira exposição, em que expôs o célebre painel
"Eu vi o Mundo", de 15 metros de largura. Em 1931, abriu uma exposição no
Salão de Belas Artes.
No ano de 1937, foi para Paris. Um anos depois, Dias realizou suas primeiras
exposições na cidade. Nessa época, em busca de novos rumos para seu trabalho, entrou em
contato com as obras dos artistas da Escola de Paris.
O encontro causou um impacto muito grande, o que pode ser percebido nos seus
quadros do início dos anos 40, entre eles "Mulher na Praia" e "Mulher
Sentada com Espelho". Há claramente uma inspiração nas obras de Pablo Picasso.
Em 1945, ingressou no grupo Espace. No ano seguinte, mostrou seus trabalhos
na mostra na Exposition Internationale d'Art Moderne, no Museu de Arte Moderna de Paris.
No início dos anos 60, o artista pintou diversas telas com retratos de
mulheres.
Em 2000 inaugurou uma praça projetada por ele mesmo em Recife.
Em fevereiro do ano passado, Dias esteve na capital pernambucana para o
lançamento de um livro sobre sua trajetória artística e fez uma exposição na galeria
Portal, em São Paulo.
(© Folha Online)
Obra emblemática de Cícero Dias é destaque em mostra da FAAP, em São Paulo
Da Redação
Até 2 de março, o paulistano pode ver a mais emblemática e precoce obra de
Cícero Dias. O painel "Eu vi o Mundo... Ele começava no Recife", produzido
pelo artista entre 1926 a 1929, é grande destaque na exposição "Brasil, da
Antropofagia a Brasília 1920 - 1950", montada no Museu da FAAP, na zona Oeste de
São Paulo.
Em carta enviada a Tarsila do Amaral, em 1931, o escritor Mario de Andrade
relatava à amiga pintora que a obra de Dias estava fazendo com que "rachassem as
paredes" da Escola Nacional de Belas Artes, tamanho o impacto causado em sua segunda
exposição ao público, no Salão de Artes daquele ano. A obra é considerada ainda hoje
como marco zero da nova pintura brasileira.
Produzido quando Dias tinha 21 anos, o painel foi feito em técnica mista,
sobre papel e cola de peixe. Nele figuram cenas da vida do nordeste brasileiro, danças,
procissões, um auto-retrato do pintor, ícones da cultura popular em livre justaposição
de escalas e pontos de vista diferentes. Tinha originalmente 15 metros de extensão por
2,5 metros de altura. Vítima de ato de vandalismo, foram extirpados cerca de 3 metros de
seu lado esquerdo, área do quadro em que figuravam nus femininos exuberantes, com sexos
destacados.
Na sua nova versão "reduzida" forçosamente, foi também grande
destaque durante a 8º Bienal Internacional de São Paulo.
Com curadoria do professor Jorge Schwartz, a mostra da FAAP exibe, além do
grande painel de Cícero Dias, obras representativas de literatura, pintura, arquitetura,
fotografia, música e cinema do período que eclode na Semana de 22 e prossegue
"modernista" até os anos 50.
Brasil, da Antropofagia a Brasília (1920-1950)
Curadoria: Jorge Schwartz
Onde: Museu de Arte Brasileira da Faap (r. Alagoas, 903, SP, tel. 0/xx/11/3662-7198)
Quando: de ter. a sex., das 10h às 20h, sáb. e dom., das 13h às 18h (até 2/3/2003)
Quanto: entrada franca
(© UOL Arte)
Opiniões sobre Cícero Dias
(Publicadas no dia 21.02.2002, no Jornal do
Commércio do Recife)
Francisco Brennand Minha
fase preferida de Cícero Dias foi aquela da sua exposição em Lisboa, que ele realizou
depois de ter saído de Paris por causa da guerra. Era impressionante. Um homem, como ele
mesmo disse, que criou seu próprio modernismo. Cícero é um grande artista, que ainda
não recebe o respeito merecido em Pernambuco. A sua obra no Marco Zero, um trabalho de
tanta importância, não tem o tratamento devido, nem por essa gestão da Prefeitura, nem
pela anterior. Usam a Praça para shows musicais e, como se fosse pouco, colocaram lá
aquela escultura vermelha (no caso, o Marco Zero).
Betânia Correia de Araújo Gosto de
Cícero Dias daquele primeiro momento seu, no qual ele registrava as paisagens da Zona da
Mata. E também do seu painel Eu Vi O Mundo... Ele foi um homem da aristocracia
nordestina que saiu para buscar novas formas de influência. Deixar o Nordeste para buscar
informação parece até óbvio, mas temos de lembrar que, no seu tempo, a disponibilidade
de informações era pequena, bem ao contrário de hoje em dia.
Guita Charifker Sou uma apaixonada
pelo trabalho de Cícero Dias. Na minha opinião, ele é o maior de todos os nossos
aquarelistas.
Bete Gouveia Respeito o trabalho de
Cícero Dias, mas pessoalmente não gosto muito. Reconheço sua importância para o
modernismo brasileiro, porém sua obra, para mim, não é muito empolgante. Sua fase
abstracionista tem função apenas decorativa, não vejo maiores rupturas nela. Nos anos
50 e 60, os concretos e neo-concretos no Brasil causavam, sim, rupturas artísticas, o que
não vejo em Cícero.
(© Jornal do Commercio)
Repercussão
Amigos lamentam morte de Cícero Dias
Mais do que admiradores, o pintor Cícero
Dias deixou muitos amigos em Pernambuco. Havia muita aproximação entre nossas
famílias e isso me tornou também muito próximo dele. Dias é para todos uma
inspiração e um influência, independente das polêmicas de sua obra", declarou
Francisco Brennand.
Para o também artista plástico Abelardo da Hora, Dias era
"gente muito boa". "Sempre tive contato com ele. Dias sempre valorizava a
nossa cultura popular e nossa história. Todo o mundo cultural brasileiro está de
luto".
O desejo de Cícero Dias de ter o engenho Judiaí, onde nasceu, tombado pelo
patrimônio histórico foi lembrado pelo escritor César Leal: "É lamentável, que
durante mais de 12 anos, tantas pessoas interessadas em ver realizado aquele que seria o
maior sonho de Cícero Dias tenham sido frustradas. Como amigo dele, proponho às
autoridades que prestem essa homenagem póstuma ao grande homem, ao grande pintor, o que
melhor viu o sol do Nordeste", sugeriu.
Quando vinha ao Recife, o pintor pernambucano que morava em Paris há
mais de 60 anos - era hóspede de Margot Monteiro. "Descobri em 1992, quando dirigia
o Museu de Arte Contemporânea (MAC), que Cícero vinha sempre ao Recife, sem que ninguém
lhe desse atenção, e se hospedava em hotéis. Fui procurá-lo para tirar dúvidas sobre
sua arte e daí surgiu uma grande amizade. Passei a hospedá-lo sempre e a levá-lo para
revisitar locais do Estado que marcaram sua vida. Diante de alguns, ele chegava a chorar.
Seu estilo era verdadeiro, ele respeitava a intuição. Era um dos pernambucanos mais
autênticos, como artista e como pessoa", contou.
Com informações de Julio Cavani, especial
para o PERNAMBUCO.COM
Comentário dos
Leitores
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"Será uma das maiores lacunas da pintura
brasileira. Pernambuco está de luto. Esperamos, que pelo menos agora a Prefeitura do
Recife respeite as obras públicas do pintor em nossa cidade. Respeite na Praça do Marco
Zero a obra de Cícero, constantemente vitimada pelas ferragens dos eventos promovidos
pela secretaria de cultura. É estranho que Cícero, com tantos amigos em Recife, conforme
os depoimentos, nenhum ousou protestar sobre o desmando com suas obras e a falta de
reconhecimento dos governantes com esse pernambucano, uma das maiores expressões da
pintura neste século. Lucia M. Ferreira "
(© Pernambuco.com) |