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Cacá Diegues faz comédia para celebrar a imperfeição

31/01/2003

Antônio Fagundes como Deus: projeto de investigar o Brasil e os brasileiros   Zeca Guimarães/Divulgação

 

'Deus É Brasileiro', que estréia em mais de cem salas do País, traça divertido retrato do Brasil

LUIZ CARLOS MERTEN

  No início, a idéia de Carlos Diegues era adaptar os contos de Livro de Histórias, de João Ubaldo Ribeiro, reeditado com o título de Já Podeis da Pátria Filhos. O diretor conheceu o escritor nos anos 1960, num encontro promovido por Glauber Rocha. Cacá não hesita em definir João Ubaldo como um dos melhores criadores de tipos da literatura brasileira. Apaixonou-se pelo Livro de Histórias, mas não conseguiu achar um eixo para integrar todas as narrativas curtas, como Robert Altman fez com Short Cuts - Cenas da Vida, de Raymond Carver. Optou por fazer um só filme baseado no conto O Santo Que não Acreditava em Deus. Talvez tenha sido melhor assim.

   Com o título de Deus É Brasileiro, o 15.º longa de Cacá conta justamente a história de Deus que vem à Terra em busca de um santo que o substitua durante as férias - que ele necessita porque não agüenta mais a bagunça em que o homem transformou o universo por ele criado. O filme estréia hoje em mais de cem salas de todo o País. Em quatro cidades - São Paulo, Rio, Brasília e Campinas -, o público terá a possibilidade de ver Deus É Brasileiro em projeção digital de HD (alta definição). Não representa pouca coisa, considerando-se que o filme apresenta efeitos que estão certamente entre os melhores da história do cinema brasileiro, desenvolvidos para o diretor pela TeleImage. Cacá explica que não quis fazer um filme com efeitos para exibir a tecnologia de ponta de que o cinema brasileiro dispõe, mas porque eles são necessários à história.

   Deus, que procura o santo brasileiro e descobre que o escolhido não acredita nEle, é interpretado por Antônio Fagundes e o ator afirma que poucas vezes teve tanto prazer ao criar um personagem. "Como ninguém sabe como Deus fala ou anda, pude ficar à vontade para criar o meu Deus", ele diz. Espera, de qualquer maneira, que o público não pense que o cabotinismo do personagem de Cacá Diegues seja coisa dele. Deus, no filme, adora os bajuladores. Diz frases divertidas como: "Sou uma pessoa fácil de se conviver, só não suporto que discordem de mim."

   O filme também oferece belos papéis a Paloma Duarte e a Wagner Moura, que a dupla de jovens atores, respectivamente de A Partilha e As Três Marias, valoriza com suas atuações inspiradas. Como o conto de João Ubaldo é curto, tratando basicamente do encontro de Deus com o santo, Cacá pôde desenvolver quase um roteiro original. "O próprio João Ubaldo me ajudou a desenvolver a história e a criar os personagens, mas como não gosta de escrever roteiros me deixou livre para trabalhar com o João Emmanuel Carneiro e minha mulher, a produtora Renata Almeida Magalhães." Para o diretor, o filme prossegue com seu projeto de investigar o Brasil e os brasileiros, mas se você pede que ele defina Deus É Brasileiro ele não define: diz que o filme faz o elogio da imperfeição. O mais curioso é isso: é um filme divertido, inteligente, 'quase' perfeito. Sobre as imperfeições do homem e do mundo.

(© O Estado de S. Paulo)


Cacá Diegues recusa dogmas e mantém fé no País

Diretor de 'Deus É Brasileiro' vê seu filme em sintonia com o momento vivido pela nação

LUIZ CARLOS MERTEN

  Carlos Diegues não planejou as coisas dessa maneira, mas não esconde a felicidade. Há cinco anos ele vinha trabalhando no projeto de Deus É Brasileiro. Não poderia imaginar que o filme estrearia justamente no quadro de um Brasil cheio de esperança, como está sendo nesse início da presidência de Luiz Inácio Lula da Silva. Deus É Brasileiro tem a cara deste País novo, que olha para dentro de si mesmo esperando um renascimento. Nem por isso o filme idealiza o povo e o Brasil. "Meu filme faz o elogio da imperfeição."

   Não técnica, que o filme é muito bem acabado, com efeitos de ponta, produzidos na TeleImage. A imperfeição é do homem, que transformou o mundo numa bagunça tão grande que o próprio Deus vem à Terra em busca de um santo para substitui-lo. Deus está estressando, é a verdade. Precisa de férias.

   Escolhe um santo brasileiro e descobre que justamente ele, o escolhido, não acredita em Deus. Chama-se justamente assim, O Santo Que não Acreditava em Deus, o conto que deu origem ao filme. É um relato curto, de três páginas, de João Ubaldo Ribeiro em Livro de Histórias, rebatizado, na reedição, como Já Podeis da Pátria Filhos. Cacá queria aproveitar ao máximo os personagens do livro, fundindo todas as histórias num só roteiro. "Não encontrei a forma ideal de fazê-lo", ele admite. Optou então por O Santo Que não Acreditava em Deus e pelo próprio João Ubaldo, para ajudá-lo a desenvolver a história e os personagens, quase todos criados especialmente para o filme: o Taoca de Wagner Moura, a Madá de Paloma Duarte.

   "Conheço o João Ubaldo desde os anos 1960 e o considero um grande criador de tipos populares brasileiros", diz. Os dois foram apresentados por Glauber Rocha e, nos últimos anos, trabalharam juntos no roteiro de Tieta do Agreste, que Cacá adaptou do romance de Jorge Amado. João Ubaldo trabalhou algum tempo com o diretor em Deus É Brasileiro, mas não ficou até o fim do projeto. "Ele não acha a menor graça em escrever roteiros", explica Cacá.

   "Aquela coisa do sujeito que entra por uma porta parece muito boba para ele; não tem a menor densidade, a menor profundidade." Mesmo abandonando o projeto, João Ubaldo continuou apadrinhando o filme e gostou do resultado, informou Cacá na coletiva realizada na semana passada, no Hotel Caesar Park.

   Estavam com ele os atores Antônio Fagundes e Wagner Moura, a produtora Renata Almeida Magalhães e a cúpula da Columbia, que distribui o filme em cerca de 130 salas de todo o Brasil. É um projeto que já dura cinco anos.

   João Ubaldo apresentou seu primeiro rascunho de sinopse a Cacá em 1998, quando o diretor mixava Orfeu nos EUA. Justamente Orfeu. Ao fazer o filme com Toni Garrido, Cacá queria exorcizar a profunda impressão que teve ao assistir à peça de Vinicius de Moraes, nos anos 1950. A música, o morro, o elenco negro, tudo aquilo mexeu muito com a cabeça do garoto de 16 anos, que quis fazer cinema em boa parte movido por aquele impacto.

   Pouco antes, ao fazer Tieta, Cacá também exorcizava outro fantasma, o do escritor Jorge Amado, decisivo no desenvolvimento do seu conceito de brasilidade. Dois filmes com fantasmas demais, mas que tendem a crescer com o tempo e as revisões. Cacá não se surpreende com isso. Gosta de citar o crítico francês Serge Daney, que dizia que as obras se modificam com o olhar do público. Fica feliz da vida ao saber que o repórter gosta bem mais de Tieta do que na época do lançamento. Não esconde seu carinho por Orfeu, a ponto de ter chamado Toni Garrido para o papel de porteiro do céu em Deus É Brasileiro. "Precisava de um homem bonito", explica.

   Desta vez, trabalhou livre das pressões de fantasmas. Fez um filme de estrada, inspirado pela cultura da margem esquerda do Rio São Francisco, percorrendo vários Estados, de Tocantins a Alagoas, onde nasceu. Cacá já havia feito de Bye-Bye Brasil um filme de estrada. Foi seu maior sucesso internacional e ele gosta da fórmula porque lhe permite descobrir o Brasil e os brasileiros. É uma herança do seu passado cine-novista, quando seus companheiros de geração e ele tinham idéias revolucionárias muito firmes. A utopia cine-novista pode ter mudado, mas não morreu. A idéia de Deus, o criador, ele reconhece, atua como uma óbvia metáfora da condição do diretor de cinema, que também (re)cria na tela o mundo e os homens. E o bom é que Cacá nunca se sentiu mais leve e livre. Contrário a todo dogma, recusa as idéias da pesquisadora Ivana Bentes, que vê no cinema brasileiro atual uma cosmética da fome que estaria na contramão da estética da fome defendida pelo Cinema Novo, nos anos 1960. Cacá acha que esse tipo de dogma assassina a criatividade de toda uma geração de novos diretores. Lembra que o próprio Glauber Rocha não ficou atrelado ao seu manifesto da estética da fome. "Ele passou a defender depois a estética do sonho", conta. Seu lema é liberdade.

   Deus É Brasileiro nasceu assim, com essa idéia. O sonho de Cacá é chegar ao coração do público, com seu filme que tem tudo a ver com o Brasil atual.

(© O Estado de S. Paulo)


Deus brasileiro não gosta de milagres

Trabalho fala de um país belo e problemático em que o arcaico convive com o moderno

LUIZ ZANIN ORICCHIO

   Como diz o "personagem" principal do conto de João Ubaldo O Santo Que não Acreditava em Deus, adaptado por Cacá Diegues, "nem toda pesca rende peixes". Ou seja, o ato de pescar é mais importante do que o peixe que vem na rede ou na ponta da linha. Equivale a dizer que a travessia é melhor do que a chegada, pois o real está no meio do caminho, e não de onde se parte ou aonde se chega, como dizia a "voz" narrativa de Guimarães Rosa, o Riobaldo de Grande Sertão: Veredas.

   Todo road movie - e Deus É Brasileiro pertence ao "gênero" - põe fé no deslocamento, no processo. Os resultados da locomoção contam menos do que o ato inaugural de sair de um lugar em busca de outro. Nessa troca da segurança pela aventura, aparece um dos mais antigos mitos humanos - o da viagem como fator de transformação.

   Na viagem negamos o comodismo primordial que nos manda ficar onde bem estamos. Vai-se em busca do desconhecido, encontram-se novas pessoas e novas paisagens. No cinema, tem dupla vantagem. Os personagens mudam e a paisagem também. Tudo é dinâmico, o que beneficia uma arte do movimento.

   Por isso justifica-se a aproximação primeira de Deus É Brasileiro com Bye Bye Brasil, filme de estrada de Cacá feito em 1979 e lançado em 1980. O nome do País está nos títulos dos dois - e isso não é coincidência. São obras de estrada especiais. Entram País adentro e têm dupla vocação, tanto de descoberta quanto de redescoberta. Vai-se em busca do que não se conhece, mas também se procura algo que se sabe existente mas que por algum motivo está oculto ou recalcado.

   Cacá, não custa lembrar, é um dos nomes fundadores do Cinema Novo. Fez parte daquele grupo de jovens que, com suas câmeras, procurava descobrir um país então desconhecido. Anos 60, esses rapazes de classe média documentavam (mesmo quando faziam ficção) cenas pouco habituais para quem achava que o mundo começava e terminava na zona sul do Rio de Janeiro. Punham na tela as favelas dos morros cariocas e o sertão nordestino. Expunham fraturas e contradições do tecido social. O Brasil de então ignorava a si mesmo e os filmes funcionavam um pouco como espelhos, mostrando à classe média "esclarecida" que ela não povoava sozinha o País. Muito pelo contrário.

   Chamava-se político a esse cinema, o que não é errado. Mas poderia se dizer também que era civilizatório na medida em que escancarava o que se queria encobrir.

   Já Bye Bye Brasil não era filme de denúncia em sentido estrito, mas de constatação de que se chegara ao período terminal da ditadura militar e havia acontecido aquilo que se chamou de "modernização conservadora". Esta se traduziu, em sua face mais visível, pelo avanço da TV sobre a cultura popular. Emblemas maiores dessa mudança seriam as antenas de televisão que começavam a pipocar mesmo em regiões remotas.

   Em Deus É Brasileiro há também essas parabólicas espalhadas pelo sertão. O processo em curso em Bye Bye Brasil já se consolidou a ponto de ninguém mais reparar nele. O que se previa como catástrofe não se cumpriu e a cultura nova convive com a antiga. Raízes e parabólicas se contradizem mas coexistem, talvez em equilíbrio precário e com a balança pendendo para um dos lados. Mas o rock não matou o maracatu e o artesanato em argila pode ser montado ao lado de cybercafé. Como essa contradição entre o moderno e o arcaico não promete desfecho imediato, pode-se dizer que o tom de Deus É Brasileiro parece mais otimista do que outra coisa.

   Certo, a viagem dos personagens por três Estados reencontra o velho Brasil, com as carências que todos conhecem. Mas o olhar que se lança a essa periferia do consumo é compreensivo, terno, amoroso. Nada tem daquele furor revolucionário, do messianismo enragé de outros tempos. Aliás, Cacá nunca teve vocação xiita. Mesmo seus trabalhos mais presos a uma estética da denúncia conservam o tempero de uma saudável atenção para com a alegria popular.

   Mas convém ao espectador ficar alerta para alguns elementos de estranheza espalhados ao longo da história, como a brevíssima aparição daquele personagem que sofre de câncer e, desesperado, quebra o quarto para desabafar. Ou o fato de que esse Deus moderno (Antônio Fagundes) não passa a mão na cabeça de ninguém e nem promete milagres - "dá um trabalho danado".

   São contrapontos à beleza natural, à sensualidade e à simpatia, à música e à arte.

   Ou seja, convivemos com a modernidade e o arcaísmo, o País é bonito e problemático, não se pode esperar por soluções mágicas de uma hora para outra, mas a vida continua bela. Não parece um bom programa para o Brasil do século 21?

(© O Estado de S. Paulo)


Efeitos especiais foram criados no Brasil

Realizadas pela TeleImage, cenas foram finalizadas em sistema digital de alta definição

UBIRATAN BRASIL

  Em mais de 40 anos de carreira, o cineasta Carlos Diegues jamais desfrutou de tantas vantagens tecnológicas - quando estava no interior do Tocantins, rodando cenas de Deus É Brasileiro, ele recebia via satélite as imagens que havia filmado poucos dias antes. "Assim, mesmo distante vários quilômetros dos grandes centros, eu pude acompanhar o processo de perto, pois via o trabalho pronto", conta o diretor.

   O processo envolveu uma complicada operação logística, que começava com o cineasta enviando o rolo de filme gravado por avião para a TeleImage, co-produtora do longa e uma das mais bem equipadas empresas de efeitos tecnológicos. Em São Paulo, o negativo era revelado, em seguida era feita a telecinagem, o sincronismo até que as cenas finalmente eram enviadas, por satélite, até o diretor, que as captava por meio de um aparelho munido de uma pequena antena parabólica.

   "Cerca de 36 horas depois de despachar o material, o Cacá já podia ver como ficou o resultado", conta Marcelo Siqueira, supervisor de pós-produção e efeitos digitais da TeleImage. "Pelo sistema normal, no qual o copião voltaria de carro, avião ou qualquer outro meio, o set e a equipe teriam de ficar mobilizados, esperando pelo menos o dobro desse tempo."

   Como boa parte do filme foi rodada no interior do País, a pré-produção foi decisiva tanto para o planejamento da filmagem como para a preparação dos efeitos especiais. Para isso, além da preparação de detalhados story-boards (desenhos que mostram como serão feitas as cenas), Diegues contou com a presença de Siqueira nas cenas mais complicadas.

   Uma deles acontece logo no início do filme, quando Deus (Antônio Fagundes) apresenta-se a Taoca (Wagner Moura). A fim de demonstrar seus poderes, Deus faz com que peixes saiam da água e "ataquem" o rapaz. Como a cena utiliza animação computadorizada em 3D, os peixes são modelos digitais construídos a partir de texturas filmadas de peixes reais. Assim, Moura foi orientado por Siqueira sobre os movimentos que deveria fazer, simulando o ataque.

   Outro momento que exigiu horas de trabalho para que o resultado fosse satisfatório é a cena final, quando Taoca está abraçado a Madá (Paloma Duarte), dentro do bote. A câmera, que os focaliza a partir do céu, vai subindo em movimentos levemente circulares. "Subiu até uma altura de três metros; o restante, foi inserido por computador", conta Patrick Siaretta que, ao lado de Siqueira, foi responsável pela criação dos principais efeitos.

   O resultado é uma das mais belas cenas do filme: à medida que sobe, a câmera revela a canoa em que se encontra o casal até descortinar toda a foz do rio, em sincronia com a música Melodia Sentimental, de Villa-Lobos, interpretada por Djavan. O plano, de dois minutos e meio, foi executado em estúdio com a canoa sobre um chão "cromado", que depois foi substituído pela imagem do rio. O tom poético veio com os peixes pulando sobre o casal, além da imagem da lua, que reflete justamente sobre a canoa - tudo criado pelos artistas da TeleImage e processado em um grande computador chamado de Inferno.

(© O Estado de S. Paulo)

O roteiro das férias de Deus pelo Nordeste

 
Paloma Duarte e Antônio Fagundes: produção estréia no quadro de um Brasil cheio de esperança, neste início da presidência de Lula

Em 'Deus é Brasileiro', o diretor Cacá Diegues traz o Criador ao sertão nordestino, onde ele faz um tour por um vale de lágrimas e misérias. É um filme cuja única ambição é a de divertir o público

   São 110 minutos praticamente de uma piada só. O filme de Cacá Diegues, 'Deus é Brasileiro' mostra Deus vindo à Terra, mais exatamente ao Nordeste, acompanhado por dois estereótipos: Taoca, um borracheiro-pescador esperto, e por Madá, uma garota que quer fugir de casa e ir para a cidade grande. A graça estaria na viagem do Criador, alguém que tudo pode, através da miséria e dos pecados deste vale de lágrimas.

   Quando o filme cita ou lembra 'Bye-Bye Brasil', o filme que o diretor fez em 1979, surgem os melhores momentos. Diegues sabe que o público gosta de (re)descobrir o País nos seus prazeres e martírios em viagens cinematográficas. Serve humor ou denúncia conforme o instante. Deus está querendo férias e tenta buscar um santo novo para ser seu regra três, escolhendo para o cargo um certo Quinca das Mulas.

   Finalmente eles se encontram, mas Quinca não tem exatamente o perfil ideal para o cargo de substituto de Deus. Taoca e Madá após desencontros conseguem descobrir que estão apaixonados, embora a garota tenha uma visível quedinha pelo Senhor barbudo e cool.

   A história é baseada livremente num conto de João Ubaldo Ribeiro e tem os suspeitos habituais da ficção do escritor baiano, tanto nas virtudes quanto nos defeitos. A irreverência e o humor, o tom fácil de causo, as pitadas de sexo, dendê e outros exotismos (a trilha sonora é perfeita), as cores de cartão-postal são fielmente transpostas do texto para a tela. A superficialidade de tudo também é respeitada, de Ubaldo a Diegues.

   'Deus é Brasileiro', porém, não parece ambicionar mais do que isso. Ser uma história um tanto divertida, um tanto "tudo pelo social". Sem ir mais fundo do que um caso especial da TV, E a presença dos atores globais como Antonio Fagundes e Paloma Duarte não desmente isso. Fagundes, com sua presença impressionante de cena, faz Deus com, por assim dizer, um pé nas costas. Tem um timing notável de comédia e é quem arranca a maior parte das risadas do filme, com suas observações cortantes sobre os humanos em geral e os brasileiros em particular. Wagner Moura ('Abril Despedaçado') faz o que pode, mas não escapa à mesmice do papel que interpreta, a enésima reencarnação do nordestino abusado, falastrão e sobrevivente nato, da linhagem, por exemplo do João Grilo de 'O Auto da Compadecida'.

   O texto de Suassuna, aliás, poderia ser um contraponto nobre de 'Deus é Brasileiro'. Mas o filme de Cacá Diegues, ao seu modo, é uma das visões que o cineasta apresenta do seu jeito de ver o Brasil. É, aliás, muito melhor que 'Orfeu', desmentindo felizmente a impressão de decadência do diretor, cuja filmografia é das mais consistentes dos que nasceram com o Cinema Novo. GERALDO GALVÃO FERRAZ

(© Jornal da Tarde)


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