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Elomar faz show e critica a cultura

14/02/2003

Elomar: “Os EUA não têm cultura nenhuma”   J.F.Diório/AE

 
 

JOÃO DOMINGOS

  BRASÍLIA - O compositor e cantor baiano Elomar pede a Deus - "expressão em desuso", segundo ele - que o governo Lula dê certo, mas não crê no sucesso do conterrâneo Gilberto Gil no Ministério da Cultura. "O Gil, ao lado de Xangai (cantor, compositor e contador de causos também da Bahia), é o artista com a maior presença de palco que conheço. Daí a ser um sucesso no Ministério da Cultura, sei não...", disse ele, na noite de terça-feira, para uma surpresa platéia da capital federal.

   O comentário de Elomar foi feito após sua apresentação única no evento Transgressores, patrocinado pelo Banco do Brasil. Deu-se um acontecimento inédito nos 65 anos de vida de Elomar. "Recebi uma ordem superior para polemizar com a platéia. Isso nunca tinha ocorrido depois de uma apresentação, depois de cantar tantas árias de minhas óperas", afirmou para os fãs, que se recusavam a ir embora sem ouvir suas opiniões políticas e culturais.

   Ele declarou que o mal da cultura brasileira é o seu apego ao que ocorre nos Estados Unidos, ao rock, ao jazz. "Os Estados Unidos não têm cultura nenhuma", disse. Criticou também a arquitetura de Niemeyer e disse que prevê um futuro sombrio para Brasília: "Daqui a 30 anos, isto aqui será uma selva de prédios, como nas cidades grandes. Será tudo cartucho."

   A próxima apresentação de Elomar Figueira de Melo será no Rio, no dia 18 de março, no Centro Cultural do Banco do Brasil. É uma das raras oportunidades de vê-lo, porque Elomar é um compositor de obra tão vasta quanto gigantes são suas óperas. Ainda mais, acompanhado do filho João Omar, ao violão. Não costuma fazer apresentações - shows, nunca, porque rejeita o estrangeirismo incorporado à língua portuguesa. Continua a produzir como nunca, na fazenda onde mora, às margens do Rio Gavião, no sul da Bahia.

   Elomar é um viajante do tempo, das culturas, das artes e das línguas. Já vasculhou tudo o que é sertão. Passou pelo Piauí, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Goiás e, sobretudo, a Bahia. Em suas óperas, exalta o retirante, os vaqueiros, o pedreiro dependurado numa corda, a moça que procura os parentes sumidos na cidade grande, os índios, a miséria, os pobres, os despossuídos, os desvalidos. Estes são seus heróis.

   Trata-se de um fenômeno musical. Compõe óperas e não músicas de consumo fácil. Embora não grave nada novo há tanto tempo, a cada dia Elomar incorpora mais e mais jovens ao seu público, que vai ao delírio quando ataca conceitos históricos de Brecht e de Maiakovski, que falam na necessidade de levar a arte para o povão. Elomar rejeita essa idéia. Diz que não grava para o povão, mas para um público pequeno, "porque o povão já tem milhares que produzem para ele".

   A prosa de suas letras é toda escrita em linguagem desconstruída - ou sertaneja, na sua versão. Mas, no debate com a platéia, regressa à Grécia clássica, a Roma, exalta o latim de Cícero e Virgílio. Desculpando-se por falar tanto, contou ter lido no original as obras de autores franceses como Victor Hugo, Rousseau, Stendhal, Molière, e tantos outros. Pula do polígono da seca para Jung e chega às teorias da física quântica.

(© O Estado de S. Paulo)


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