Jornalista José Teles, do JC, vence
concurso de ensaios sobre o frevo, promovido
pela Prefeitura do Recife
Tatiana Notaro
tnotaro@jc.com.br
O compositor Nelson Ferreira dizia que o
frevo deveria manter-se longe de evoluções e
continuar sendo o simples frevo, “na sua
mais rigorosa expressão popular”. O
jornalista do Jornal do Commercio, José
Teles foi em busca das peculiaridades do
centenário ritmo pernambucano, as atitudes
arbitrárias e xenófobas tomadas em sua
defesa, e narrou origens e casos que foram
registrados no ensaio A difícil caminhada do
frevo para chegar aos 100 anos, vencedor do
concurso promovido pela Prefeitura do
Recife.
No concurso, concorreram outros quatro
textos, entre eles O canto do frevo – letras
e vozes do frevo canção, de Júlio Vila Nova,
que recebeu menção honrosa. Antes do
Carnaval de 2008, o ensaio de José Teles,
originário de uma vasta pesquisa ganhará
edição pela Fundação de Cultura, e será mais
um registro do ritmo da nossa história.
Com anos de pesquisas, do arquivo do JC a
exemplares antigos de revistas e livros,
Teles costurou peças perdidas, buscou os
pormenores e conseguiu um grande acervo de
pequenos e grandes momentos. Desde os
primeiros acordes às versões baianas. Todo
material vai virar um livro completo, ainda
em estágio de feitura.
Com Atrás do trio elétrico, de 1969,
Caetano Veloso fez um frevo “sem orquestra,
com o timbre piscodélico da guitarra
elétrica de Lanny Gordin. Se você comparar,
vai ver que os compassos dessa música são
iguais aos da Marcha nº1 de Vassourinhas”,
explica José Teles. Com sua composição,
Caetano acabou criando um “frevo baiano”,
nomenclatura, no mínimo, polêmica.
Mesmo cercado de defensores bairristas, o
frevo não teve uma trajetória fácil. De sua
origem proletária, no final do século 19,
somente chegaria à classe média na primeira
metade dos anos de 1920. Ainda assim,
concorreu com músicas como o samba carioca,
que chegava por aqui “tanto em forma de
bolachões de cera de carnaúba em 78 rpm,
quanto em partituras”, segundo descreve José
Teles em seu ensaio.
A burguesia jamais sairia misturada ao “o
poviléo mal cheiroso”, mas aos poucos foram
cedendo espaço. Incluíam alguns “frevos” aos
repertórios dos pequenos blocos e aos clubes
sociais. Já em fevereiro de 1924, a
orquestra do Apois Fum saiu com uma
orquestra grandiosa, que tocava frevos sob
regência de Felinto Moraes.
Como forma de proteção (como se o frevo
fosse algo frágil), a diretoria dos Turunas
de São José, por exemplo, assim anunciava
suas prévias carnavalescas: “Para esta
festa, a diretoria dos Turunas resolveu que
só serão executadas músicas genuinamente
pernambucanas”. A Tramways (companhia
inglesa de eletricidade e transportes)
incentivava o bairrismo patrocinando
programas de rádio que tocavam frevos e
maracatus, por aqui, em outros Estados e até
no exterior. “Em 1936, pela Rádio Clube, às
sexta-feiras, ia ao ar um programa mantido
pela Federal Carnavalesca: ‘Nos quais são
irradiadas exclusivamente música
carnavalescas de Pernambuco’. Este programa
tinha duração de 60 minutos, e seu nome já
dizia tudo: Hora de Pernambuco”, descreve
Teles. Em 1935, teatrólogo Valdemar Oliveira
criticava as orquestras que insistiam em
tocar sambas. “Já temos matéria de primeira
qualidade para construir um ambiente
carnavalesco sem similar em qualquer Estado
do Brasil”, disse.
Com esses registros resgatados, fica a
certeza de que, resistente, nosso frevo é um
senhor centenário que atravessou os anos
como hino de Pernambuco. A segregação,
entretanto, talvez seja empecilho para uma
nova formação musical, como previa Gilberto
Freyre, ainda em 1956. “Talvez do encontro
não fortuito, mas profundo do samba carioca
com o frevo recifense resulte uma inesperada
combinação nova, deliciosamente brasileira
de dança e de música”.