'Estamos tratando os livros de Jorge como se inaugurassem
a Companhia', diz o editor do projeto, Luiz Schwarcz
Ubiratan Brasil, de O Estado de S. Paulo
Com um abraço afetuoso, Roman Polanski iniciou sua amizade com Jorge
Amado. "Sua literatura inspirou a minha adolescência na Polônia", disse o
cineasta ao escritor, quando se encontraram na Bahia. "Embora o governo
polonês nos obrigasse a apenas ler obras com temática realista-socialista,
seus livros traziam uma prosa solar e de amor ao próximo." São justamente
essas duas qualidades que marcam, em grande estilo, o retorno da obra de
Amado às prateleiras - na segunda-feira, nada menos que seis livros ganham
nova edição, iniciando o trabalho de republicação, agora sob a chancela da
Companhia das Letras.
"Trata-se de
um dos nossos maiores projetos editoriais", comenta o editor Luiz Schwarcz.
"Estamos tratando os livros de Jorge como se inaugurassem a Companhia." De
fato, trata-se de um desafio provocador. Desde sua morte, em 6 de agosto de
2001, a quatro dias de completar 89 anos, Jorge Amado revelava-se cada vez
mais um autor na contramão da tendência dominante na literatura
contemporânea, tão pouco dado a mergulhar na introspecção psicológica que
parecia até recusar a própria condição de modernidade.
Preocupada
com os arranhões que a obra sofria diante da crítica (embora ainda vendesse
bem), a família do escritor decidiu promover um leilão no ano passado entre
as maiores editoras brasileiras. Com um projeto de 40 páginas, a Companhia
das Letras ganhou a preferência por justamente oferecer um programa que
inclui, além do relançamento, a divulgação da escrita de Amado por meio de
palestras, concursos, shows e mostras de fotografia e cinema em quatro
cidades do País.
"Queremos
também preparar novos leitores, oferecendo cadernos de leituras que serão
distribuídos nas escolas, além de cursos de capacitação de professores",
acrescenta Schwarcz. A idéia agradou em cheio à família Amado. "Meu pai
dizia que só depois de 50 anos de sua morte é que sua obra seria lembrada",
conta João Jorge. "Felizmente não precisamos esperar tanto."
(©
Estadão)
Confira na íntegra texto de José Saramago sobre Jorge
Amado
Texto publicado no catálogo promocional do
relançamento da obra de Jorge Amado, pela Cia. das Letras
Da Redação
Raimundo Valentim/AE
Escritor Jorge Amado
SÃO PAULO - Confira na íntegra o texto
do escritor José Saramago sobre Jorge Amado que foi publicado no
catálogo promocional do relançamento das obras do escritor pela
Companhia das Letras.
Uma Certa Inocência,
por José Saramago*
Durante muitos anos Jorge Amado quis e soube ser a
voz, o sentido e a alegria do Brasil. Poucas vezes um escritor terá
conseguido tornar-se, tanto como ele, o espelho e o retrato de um povo
inteiro. Uma parte importante do mundo leitor estrangeiro começou a
conhecer o Brasil quando começou a ler Jorge Amado. E para muita gente
foi uma surpresa descobrir nos livros de Jorge Amado, com a mais
transparente das evidências, a complexa heterogeneidade, não só racial,
mas cultural da sociedade brasileira.
A generalizada e estereotipada visão de que o Brasil
seria reduzível à soma mecânica das populações brancas, negras, mulatas
e índias, perspectiva essa que, em todo caso, já vinha sendo
progressivamente corrigida, ainda de que de maneira desigual, pelas
dinâmicas do desenvolvimento nos múltiplos sectores e actividades
sociais do país, recebeu, com a obra de Jorge Amado, o mais solene e ao
mesmo tempo aprazível desmentido.
Não ignorávamos a emigração portuguesa histórica nem,
em diferente escala e em épocas diferentes, a alemã e a italiana, mas
foi Jorge Amado quem veio pôr-nos diante dos olhos o pouco que sabíamos
sobre a matéria. O leque étnico que refrescava a terra brasileira era
muito mais rico e diversificado do que as percepções europeias, sempre
contaminadas pelos hábitos selectivos do colonialismo, pretendiam dar a
entender.
Diz-se que pelo dedo se conhece o gigante. Aí está,
pois, o dedo do gigante, o dedo de Jorge Amado.
* José Saramago, de 85 anos, é escritor português,
premiado com o Nobel de Literatura de 1998, é autor de Memorial do
Convento, Ensaio sobre a Cegueira, O Evangelho Segundo
Jesus Cristo, entre outras obras.
(©
Estadão)
Obra completa de Jorge Amado é relançada com novas edições,
livro inédito e eventos
PATRICIA DE CIA
Colaboração para o UOL
Entra em ação este mês o grande projeto editorial para revitalizar a obra de
Jorge Amado (1912-2001), criador de personagens icônicos como Dona Flor e
Gabriela. Serão 33 volumes até 2011 e mais atividades educativas, festival
de cinema, website, simpósio e até mesmo um CD, tudo chancelado por nomes de
peso como José Saramago, Chico Buarque, Fernanda Montenegro e Roberto Da
Matta.
Capa da nova edição de "Dona Flor e Seus Dois Maridos",
parte dos primeiros relançamentos da obra de Jorge Amado
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"Capitães da Areia" também faz parte dos primeiros
relançamentos do autor pela editora Cia. Das Letras
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É uma operação ambiciosa, rara no mercado editorial brasileiro, que busca
reavivar a importância literária do autor e ao mesmo tempo ressaltar a
contribuição de sua literatura para a interpretação e a formação da
identidade nacional.
"Dona Flor e Seus Dois Maridos", "Capitães da Areia", "Mar Morto", "A Morte
e a Morte de Quincas Berro Dágua", "Tocaia Grande" e o infantil "A Bola e o
Goleiro" iniciam no dia 10 de março a reedição da obra completa do escritor
baiano pela Companhia das Letras.
Até o final do ano, 16 títulos chegarão às livrarias, entre eles o inédito
"Hora da Guerra", reunindo artigos escritos por Amado na década de 1940 para
um jornal baiano sobre a Segunda Guerra Mundial.
Todos os livros incluem posfácios de grife, como Saramago, Milton Hatoum,
Mia Couto, Nelson Pereira dos Santos, Affonso Romano de Sant'Anna, Lygia
Fagundes Telles, Moacyr Scliar, Reginaldo Prandi, José Paulo Paes e Ana
Miranda.
Um dos objetivos é atrair leitores desses autores para a obra de Amado. A
inclusão do português Saramago e do moçambicano Mia Couto pretende ressaltar
a acolhida do baiano por escritores de língua portuguesa em todo o mundo.
Alguns dos livros, como "Dona Flor e Seus Dois Maridos" e "A Morte e a Morte
de Quincas Berro Dágua", trazem também cadernos de imagens com reproduções
fac-similares de capas de 1º edição e manuscritos, fotos do autor tiradas
por sua mulher, Zélia Gattai, ilustrações de artistas baianos como Rubens
Carybé e imagens de adaptações para o cinema e TV.
Todos os textos foram estabelecidos a partir dos originais de Jorge Amado,
fruto de um trabalho iniciado nos anos 1990 pela filha do autor, Paloma.
Embora pouca coisa tenha mudado, algumas grafias de termos do candomblé
foram atualizadas, com consultoria do sociólogo Reginaldo Prandi.
2008
"Hora da Guerra"
"Terras do Sem-Fim"
"Gabriela, Cravo e Canela"
"O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá"
"Tenda dos Milagres"
"Tereza Batista Cansada de Guerra"
"A Descoberta da América Pelos Turcos"
"O Capitão-de-Longo-curso"
"Jubiabá"
"O Milagre dos Pássaros"
2009
"Tieta do Agreste"
"O Compadre de Ogum"
"Farda, Fardão, Camisola de Dormir"
"São Jorge dos Ilhéus"
"ABC de Castro Alves"
"Bahia de Todos os Santos"
"Seara Vermelha"
"Suor"
"O Menino Grapiúna"
2010
"O País do Carnaval"
"O Cavaleiro da Esperança"
"O Amor do Soldado"
"Os Pastores da Noite"
"O Sumiço da Santa"
"Cacau"
"Os Subterrâneos da Liberdade"
"Os Ásperos Tempos"
"Agonia da Noite"
"A Luz no Túnel"
2011
"Navegação de Cabotagem"
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LANÇAMENTOS PREVISTOS |
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O projeto começou a ser idealizado em fevereiro de 2007, com coordenação da
antropóloga Lilia Moritz Schwarcz e do diplomata e ex-presidente da Academia
Brasileira de Letras Alberto da Costa e Silva. Em agosto, a Companhia venceu
concorrência pelos direitos da obra de Amado, publicada pela Record desde
1975. Segundo a editora, a abrangência do projeto foi um dos fatores
decisivos na negociação com os herdeiros do escritor.
Atividades educativas
A escola foi um dos caminhos escolhidos para levar a literatura de Amado a
um novo público leitor. Para isso, foi criado material didático, produzido
pela própria editora, que será distribuído para professores em outubro.
Serão dois cadernos de leitura, um direcionado a literatura e língua
portuguesa e o outro voltado para aspectos socioculturais, com enfoque para
o "Brasil mestiço, suas tradições e complexidades sociais".
Um programa de capacitação de professores percorrerá algumas cidades do país
e haverá dois concursos, um para alunos e outro para professores. Serão
premiados o melhor projeto de aplicação da obra em sala de aula e melhor
texto ou audiovisual inspirado na vida e na obra de Amado.
Eventos culturais
São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Belo Horizonte terão uma programação
com mostras de cinema, shows e exposições fotográficas até outubro, em
parceria com o Sesc e o Instituto Moreira Salles. Em 27 e 28 de março,
acontece em São Paulo show de Nana, Dori e Danilo Caymmi. A partir do dia 19
de março no Rio e 21 em São Paulo será realizado um festival de cinema com
filmes e documentários relacionados ao escritor, entre eles o recordista de
bilheteria no país até hoje, "Dona Flor e Seus Dois Maridos" (1976), e
"Jorjamado no Cinema", de Glauber Rocha
No dia 10 de março, entra no ar o site
Jorge
Amado, realizado em parceria com a Fundação Casa de
Jorge Amado, com detalhes das reedições e da programação de eventos.
Por fim, está programado o lançamento de um CD da Biscoito Fino em que os
atores Fernanda Montenegro e Lázaro Ramos farão leituras dos textos de Amado
com música de Francis Hime.
"Dona Flor e Seus Dois Maridos"
Posfácio: Roberto DaMatta
Preço: R$ 51
"Capitães da Areia"
Posfácio: Milton Hatoum
Preço: R$ 33
"Mar Morto"
Posfácio: Ana Maria Machado
Preço: R$ 33
"A Morte e a Morte de Quincas Berro Dágua"
Posfácio: Affonso Romano de Sant'Anna
Preço: R$ 24,00
"Tocaia Grande"
Posfácio: Mia Couto
Preço: R$ 51
"A Bola e o Goleiro"
Preço: R$ 25
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