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 Chico e Caetano lerão obra de Jorge Amado em SP

 

 

Jorge Amado
 

MIGUEL ARCANJO PRADO
da Folha Online

Chico Buarque e Caetano Veloso vão ler trechos da obra do escritor baiano Jorge Amado (1912-2001) no Sesc Pinheiros, em São Paulo. A leitura será na terça (25), às 20h, no Teatro Paulo Autran, que tem 1.010 lugares (r. Paes Leme, 195, Pinheiros, São Paulo - tel. 0/xx/11/3095-9400).

A entrada será gratuita e a distribuição dos convites está marcada para a quarta (19) às 14h, em todas as unidades do Sesc SP, através do sistema informatizado de ingressos da instituição.

O evento terá ainda participação de Alberto da Costa e Silva, Mia Couto e Milton Hatoun. Não está previsto que Caetano e Chico cantem juntos, mas, segundo uma pessoa da organização do evento, é possível que Caetano dê uma canja, com canções que falam da obra de Jorge Amado.

É bom lembrar que Caetano Veloso compôs "A Luz de Tieta", para o filme "Tieta do Agreste" (1996), de Cacá Diegues, baseado no livro homônimo de Amado. Caetano também cantou o sucesso "Meia Lua Inteira", de Carlinhos Brown, que foi tema da novela "Tieta" (1989-1990), de Aguinaldo Silva.

Já Chico Buarque foi responsável pela canção-tema "O Que Será", do filme "Dona Flor e Seus Dois Maridos" (1976), dirigido por Bruno Barreto e também baseado em obra homônima de Jorge Amado.

Show

Nos dias 27 e 28 de março, às 21h, no mesmo Teatro Paulo Autran, haverá show de homenagem a Jorge Amado, com Nana, Dori e Danilo Caymmi. O show se chama "A Música de Jorge Amado".

Na apresentação, os três irmãos vão resgatar a parceria entre o pai deles, Dorival Caymmi, e Jorge Amado, com Cristóvão Bastos ao piano. Os ingressos vão custar entre R$ 7,50 e R$30. Os eventos fazem parte do relançamento da obra de Jorge Amado pela Companhia das Letras.

Biografia

Filho do fazendeiro de cacau João Amado de Faria e de Eulália Leal Amado, Jorge Amado nasceu em 10 de agosto de 1912, na fazenda Auricídia, no distrito de Ferradas, município de Itabuna, sul do Estado da Bahia.

Com um ano de idade, foi para Ilhéus, onde passou a infância. Fez os estudos secundários no Colégio Antônio Vieira e no Ginásio Ipiranga, em Salvador. Neste período, começou a trabalhar em jornais e a participar da vida literária.

Publicou seu primeiro romance, "O país do carnaval", em 1931. Casou-se em 1933, com Matilde Garcia Rosa, com quem teve uma filha, Lilá (morta em 1949).

Formou-se pela Faculdade Nacional de Direito, no Rio de Janeiro, em 1935. Militante comunista, foi obrigado a exilar-se na Argentina e no Uruguai entre 1941 e 1942, período em que fez longa viagem pela América Latina. Ao voltar, em 1944, separou-se de Matilde Garcia Rosa.

Em 1945, foi eleito membro da Assembléia Nacional Constituinte, na legenda do Partido Comunista Brasileiro (PCB), tendo sido o deputado federal mais votado do Estado de São Paulo. Jorge Amado foi o autor da lei, ainda hoje em vigor, que assegura o direito à liberdade de culto religioso. Nesse mesmo ano, casou-se com a paulistana Zélia Gattai.

Entre 1950 e 1952 o casal viveu na antiga Tchecoslováquia (hoje República Tcheca).

Com Zélia, Jorge teve dois filhos: João Jorge Amado e Paloma Amado. Ele morreu em 6 de agosto de 2001, em Salvador. Suas cinzas foram enterradas no jardim da casa onde vivia, no bairro do Rio Vermelho, em Salvador, no dia em que completaria 89 anos.

Jorge Amado ocupava a cadeira de número 23 da Academia Brasileira de Letras. Hoje, a cadeira é ocupada por sua viúva, a também escritora, Zélia Gattai.

A obra literária de Jorge Amado foi traduzida em 55 países e em 49 idiomas, existindo também exemplares em braile e em fitas gravadas para cegos.

(© Folha Online)


A revanche de Jorge Amado

Companhia das Letras relança autor em pacote que pretende repensar sua importância para a literatura brasileira

Schneider Carpeggiani
carpeggiani@gmail.com

A pensadora argentina Beatriz Sarlo tem uma máxima bem eficiente para descrever como o eixo Europa-Estados Unidos vê o resto do mundo. Cada povo teria características rígidas a seguir, sendo proibido atravessar o sinal vermelho do clichê. Os asiáticos seriam os trabalhadores, pessoas frias com religião e calendário esquisitos. Os africanos, aqueles que vivem morrendo de fome entre elefantes & girafas. O Oriente Médio, bem, esses são terroristas perigosíssimos, a nação do kamikaze. Já os latino-americanos, eternos exóticos massacrados pelo sol com sexualidade à flor-da-pele. É claro que as literaturas desses países devem acompanhar seus clichês. Assim é possível entender a resistência que as primeiras traduções de Machado de Assis sofreram.

Machado nunca foi um autor solar. Sua literatura era pontuada por uma ironia e um experimentalismo que incomodavam, por exemplo, os franceses. Qual a razão de importar um igual a nós (mesmo que esse igual supere muitas vezes o “original”)? O que um livro como Dom Casmurro tinha a oferecer, quando a França acreditava ter similares em suas prateleiras? Num mundo onde o exótico é moeda, fica fácil entender o sucesso arrebatador de Jorge Amado (1912-2001), autor de histórias calorosas narradas em temperatura idem. Em sua literatura, Jorge Amado criou um Brasil sedutor para seus pares, o mercado e gringos, mas longe de ser unanimidade de crítica. Tal desdém passa agora por uma reavaliação.

Chegou esta semana às livrarias a primeira parte da reedição da obra completa (ver arte ao lado) que a Companhia das Letras arquiteta do autor baiano. A editora comprou em leilão ano passado os direitos de publicação, que estavam nas mãos da Record, por um valor não revelado para a imprensa. Sob a coordenação de Alberto da Costa e Silva e Lilia Moritz Schwarcz, os títulos voltam ao mercado com novo projeto gráfico e preparam o terreno para as comemorações do centenário de nascimento do escritor (em 2012). Além dos romances e livros de memória, a idéia dos editores é preparar versões em quadrinhos e edições de bolso de algumas das principais obras de JA.

A leva inicial conta com Dona Flor e seus dois maridos, Capitães de areia, Mar morto, A morte e a morte de Quincas Berro d’água e Tocaia grande. A novidade é que os livros chegam com posfácios que procuram “corrigir” as alfinetadas da crítica. É a máxima machadiana: ele está morto, então podemos elogiar à vontade.

A diversidade de nomes que asseguram a importância de Jorge Amado é imensa. Estão lá Milton Hatoum, Mia Couto, José Saramago, Ana Maria Machado, Tatiana Belinky, Lygia Fagundes Telles, Roberto DaMatta, entre outros. Os afagos para o baiano chegam com altíssimo quilate.

O português José Saramago não poupou elogios no posfácio de A descoberta da América pelos turcos – “Durante muitos anos Jorge Amado quis e soube ser a voz, o sentido e a alegria do Brasil. Poucas vezes um escritor terá conseguido tornar-se, tanto como ele, o espelho e o retrato de um povo inteiro. Uma parte importante do mundo leitor estrangeiro começou a conhecer o Brasil quando começou a ler Jorge Amado. E para muita gente foi uma surpresa descobrir nos livros de Jorge Amado, com a mais transparente das evidências, a complexa heterogeneidade, não só racial, mas cultural da sociedade brasileira.” O antropólogo Roberto DaMatta, para o famigerado Dona Flor e seus dois maridos, escreveu que “Na Salvador mágica de Jorge Amado, é possível conciliar formas exageradas, distantes e extremadas da vida”.

O problema com Jorge Amado é que ele não se preocupou em ir além dele mesmo. Em seus livros estão sua posição política, sua despreocupação em seguir as vanguardas do modernismo ou grandes devaneios psicológicos. Jorge gostava das veias abertas dos seus personagens, era mais externo que interno. Sua atenção se voltava para a história – uma fidelidade artística que foi, ao mesmo tempo, seu inferno com a crítica e sua salvação perante o mercado.

Não que o autor tenha passado a vida inteira sendo um só. Não. Havia o Jorge Amado político, o sexual, o religioso e o pitoresco. Só para citarmos alguns. No entanto, sua personalidade era tão forte que ele parecia estar escrevendo uma só história durante todo o tempo, em cada página. Quem procurava Jorge Amado, sabia o que iria encontrar. E pelo estardalhaço que a Companhia das Letras está fazendo com essa reedição, quem procurou acabou encontrando.

(© JC Online)


ENTREVISTA » ANA MARIA MACHADO
Jorge Amado está bem vivo”

Apesar de ser um dos autores mais famosos que o Brasil já conseguiu produzir e exportar, Jorge Amado está longe de ser um consenso de crítica. Para tentar entender o canto da sereia que o baiano desperta, Ana Maria Machado escreveu o ensaio Romântico, sedutor e anarquista – como e por que ler Jorge Amado hoje?, publicado em 2006 pela Editora Objetiva. Em meio ao relançamento mega promovido pela Companhia das Letras, a reportagem do JC procurou Ana Maria Machado (que escreveu um novo posfácio para Mar morto) para repensar o legado do homem que recriou a Bahia. Para ela, um problema da aceitação de Jorge Amado é que as pessoas exigem algo que ele não se propôs a oferecer. (S.C.)


JORNAL DO COMMERCIO – Escrever um ensaio defendendo um autor tão marginal no circuito intelectual como Jorge Amado é um ato de rebeldia em relação ao cânone literário? Ou apenas um caso de intensa afinidade literária?

ANA MARIA MACHADO – Na verdade, não pensei nisso. Sou uma rebelde por natureza, não por intenções. Minha idéia foi fazer apenas uma releitura crítica, sem endeusamentos nem linchamentos. E mais: convém não esquecer que a rigor é impossível negar que Jorge Amado é um autor canônico, a esta altura. Membro da Academia, nome sempre lembrado para o Nobel, detentor de uma quantidade extraordinária de prêmios internacionais, objeto de teses e estudos, tem uma fundação com seu nome num lugar de honra na Bahia. Não dá para dizer que é marginal. Marginal é aquele autor de província que não consegue vencer as barreiras do mercado e projetar sua obra, por mais qualidade que tenha. Como Carlos Emílio Correia Lima no Ceará ou Reinaldo Santos Neves no Espírito Santo. Isso foi uma experiência que Jorge Amado jamais conheceu. Fez sucesso sempre, desde o início, editou quando quis e como quis, foi traduzido, ganhou prêmios. Apenas não é aceito por todo o circuito intelectual — sobretudo nos meios lusitanos e paulistas ou por eles influenciados. Mas esse próprio questionamento tem suas razões, que merecem ser examinadas. E foi isso que tentei fazer no meu livro.

JC – O preconceito em relação a Jorge Amado é mais extraliterário (sua posição política, as adaptações para o cinema e TV...) do que literário?

ANA MARIA – Eu não diria que é mais extraliterário, mas que também é. Creio que algo fundamental para se examinar a imagem de Jorge Amado é levar em consideração que raramente sua obra é examinada com objetividade. Quase sempre é comentada com paixão. E isso leva a extremos. Foi mais celebrada do que deveria, talvez. Então, foi também mais execrada do que merecia. Até mesmo por reação. E nesses processos, fatores extraliterários pesaram muito. Houve exageros no julgamento. E esses exageros depois ajudaram a desenvolver uma má-vontade e a gerar preconceitos. Primeiro, houve quem o detestasse porque era membro do Partido Comunista. Depois, quem o atacasse porque saiu do Partido Comunista. Depois, porque usou uma linguagem coloquial brasileira, então considerada vulgar e chula. Ou porque celebrou a sensualidade de uma forma solar, às vezes considerada pornográfica. Depois, porque fez sucesso. Depois, porque entrou para a Academia. Depois, porque virou personagem turístico baiano, etc. Ao mesmo tempo, houve quem o elogiasse sem admitir qualquer objeção crítica, exatamente por essas mesmas razões, sucessivamente. Em termos literários, acho que muitas vezes a crítica universitária exigiu dele alguns aspectos que não faziam parte de sua proposta estética nem de seu pacto com o leitor. Por exemplo, uma ironia sutil como as de Machado ou Graciliano, uma recriação de linguagem como a de Rosa, uma acuidade psicológica como a de Clarice. Tais cobranças revelam lacunas realmente existentes, mas não justas porque não fazem parte das promessas implícitas do autor a seus leitores. Seria comparável a cobrar originalidade temática de autores clássicos para quem esse parâmetros não eram uma exigência, quando o ideal não era ser original mas imitar os modelos consagrados. A meu ver, uma crítica deveria procurar entender essas variáveis de época, contexto e temperamento do autor.

JC - Você usa três adjetivos para definir Jorge Amado – romântico, sedutor e anarquista –, qual deles mais você admira como leitora?

ANA MARIA – Não é bem por aí, mas acho que, por meu temperamento rebelde, admiro uma certa anarquia. E um leitor tem prazer em ser seduzido por uma obra.

JC – Que falta faz um autor como Jorge Amado na literatura brasileira de hoje?

ANA MARIA – Não faz falta nenhuma. Ele continua aí, com sua obra, é só ler. Jorge Amado está vivo e bem em seus livros, ainda mais agora com essas reedições tão bonitas. Quanto ao surgimento de um novo autor como ele, acho que se surgisse estaria fora de época. Mas muitos outros têm elementos dispersos que ele também tinha, mais como afinidades do que como herança — de João Ubaldo Ribeiro a Aldir Blanc.

(© JC Online)

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