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Gullar, João Cabral e Machado ganham caixas

04/01/2009

 

 

Foto: Sidinei Lopes/Folha Imagem

O poeta e cronista Ferreira Gullar é um dos autores homenageados pela editora

Os três autores motivam os lançamentos de compilações representativas realizadas pela editora Nova Aguilar

De Gullar, caixa traz a reedição do primeiro livro, lançado quando ele tinha 19 anos, além da reprodução de um poema inédito

EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

O poeta Ferreira Gullar, colunista da Folha, brinca com a novidade de ter boa parte de sua obra pela primeira vez reunida em um só volume. "Quando recebi o livro, e vi minha cara, eu disse: "Não acredito, quem é essa figura numa coleção de clássicos da Nova Aguilar?'", diz Gullar, que divide com Machado de Assis (1839-1908) e João Cabral de Melo Neto (1920-1999) a trinca de lançamentos da editora neste fim de ano.

O volume dedicado a Gullar tem, entre as novidades, "Um Pouco Acima do Chão", livro de estréia, que ele lançou aos 19 anos, no Maranhão, e considera "imaturo": "Quando escrevi, ainda tinha formação parnasiana, falava em decassílabos ainda. Eu estou ali, não nego, mas ainda chupando dedo".

O livro nunca havia sido reeditado comercialmente. Quem convenceu o poeta da inclusão, ainda que num apêndice, foi o acadêmico Antonio Carlos Secchin, responsável por prefácio, organização e estabelecimento de texto do volume. "Documentalmente, era importante a inclusão. Decidimos que o livro viria como "Apêndice", fora do conjunto principal, mas ao alcance do leitor", diz Secchin.

O volume com a obra de Gullar traz ainda a reprodução do manuscrito do poema inédito "Uma Corola", que será lançado em 2009, pela editora José Olympio, no livro "Em Alguma Parte Alguma". O último livro inédito de poemas de Gullar foi "Muitas Vozes", publicado há quase dez anos. O lançamento da Nova Aguilar tem ainda dois textos teatrais "rigorosamente inéditos", segundo Secchin:

"Um é bem recente. O outro, "Romance Nordestino", é de 1983, uma peça engraçadíssima, mergulhada na linguagem e na cultura populares".

Secchin também é responsável pela introdução, organização, notas e estabelecimentos de texto de "Poesia Completa e Prosa", de João Cabral de Melo, que traz modificações em relação à edição de 1994. "Entre os inéditos, além de poemas, incluí a transcrição de uma interessantíssima palestra, com debates, que João Cabral proferiu na Faculdade de Letras da UFRJ, em 1993."

Machado

Em homenagem ao centenário de morte do Bruxo do Cosme Velho, a Nova Aguilar lançou recentemente a "Obra Completa de Machado de Assis". A edição anterior é de 1959 e foi organizada por Afrânio Coutinho. Agora, acrescida de um quarto volume, a caixa organizada por Aluizio Leite, Ana Lima Cecílio e Heloisa Jahn traz textos que foram reconhecidos como sendo de Machado no período.

Ou retira alguns atribuídos a ele, e que posteriormente tiveram sua autoria reconhecida. Caso de "Queda que as Mulheres Têm Para os Tolos" (1861), atribuído a Machado até que o professor e ensaísta francês Jean-Michel Massa afirma ter descoberto o original que o brasileiro traduziu.

A fortuna crítica traz "novidades", como um texto do crítico Antonio Candido, ainda não escrito quando Coutinho organizou a edição de 1959. A bibliografia foi também atualizada com trabalhos publicados neste ano por conta do centenário de morte do autor. E o conjunto de textos reconhecidos como sendo de autoria de Machado aumentou: o número de páginas total passou de 3.600 para 6.000.

A seção de Crônicas passou de 210 para 610 textos. Segundo o editor Sebastião Lacerda, da Nova Aguilar, apenas as seções Romance e Correspondência não foram modificadas.

TRECHO

- "Tudo que é triste,
tudo que é bom,
tudo que é belo,
tudo que existe,
tudo que sonhas poder olhar;
todas as cousas
que inda não viste
- todas as cousas
estão no mar:

barcos fantasmas,
velhas galeras
jazem tristonhas
sobre as areias,
dormindo cheias
de ouro e de prata;
por suas salas
passeiam peixes
entre piratas,
- homens-fantasmas-
que, embebedados,
cantam cantigas
e bebem rum;

tristes escunas
de velas rotas,
mastros quebrados
só de acenar
para a lembrança
do último porto
- tristes escunas
de casco roto
só de chorar!..."

(e o marinheiro ouvia absorto)

"Tudo que é morto vive no mar!...

Crianças mortas
de olhos de pérola,
boquinha de âmbar,
como a sonhar,
arrumam búzios,
conchas, estrelas,
pedrinhas brancas
cor de luar.

Deusas formosas
de claros braços,
cabelos de algas,
ventre de espuma,
líquido olhar
- dançam frementes,
bulindo os seios,
gingando o ventre
para Netuno
se deleitar.
Vênus perfeitas
como a de Milo,
que não desejam
sair do mar...

trecho de "Marinheiro", de "Um Pouco Acima do Chão" (Ferreira Gullar, 1949)

(© Folha de S. Paulo)

 

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