Notícias
A hora e vez de João Miguel virar Matraga

04/01/2009

 

 

Foto: Divulgação

João Miguel, ator de 'Estômago', fará remake de Matraga
 

Até a temporada das secas em Minas Gerais chegar, entre junho e agosto, oferecendo a aridez necessária para as filmagens de A hora e a vez de Augusto Matraga começarem, João Miguel já estará dominando todas as angústias existenciais de um mito da literatura de João Guimarães Rosa (1908-1967). Anti-herói "duro, doido e sem detença", nas palavras de seu criador, Matraga rendeu uma das maiores obras-primas do cinema brasileiro, em 1965, sob a direção de Roberto Santos (1928-1987), interpretado por Leonardo Villar, assim como incendiou os palcos há 20 anos, na versão teatral encenada por Antunes Filho, com Raul Cortez (1932-2006) no papel central. Chegou a hora e a vez de Matraga renascer.

"Matraga é a metáfora para o sertão que existe na alma de cada homem", diz Miguel, preparando-se para abrir mão do traquejo cômico que imprimiu em filmes como Estômago (2007) e Cinema, aspirinas e urubus (2005). De comédia, Matraga não tem nada. E em 2009, sob a direção de um estreante em longas-metragens, o diretor de TV Vinícius Coimbra (JK, Queridos amigos), o ator baiano de 38 anos vai assumir o manto e os fardos morais do ex-fazendeiro cujo orgulho o leva a uma jornada de violência e derrota até renascer, dividido entre a fé e a vingança. A hora e a vez.

Matraga, nascido nas páginas de Sagarana, em 1946, vira um coronel caído após ser vítima de uma emboscada e deixado à beira da morte. Salvo por um casal de negros, ele renega seu passado, entregando-se a Deus. Mas seu instinto guerreiro vai explodir, quer queira, quer não. "Matraga é um personagem com duas naturezas conflitantes. Uma é a de guerreiro", diz o ator. "A outra é uma natureza religiosa que ele traz de infância", explica o diretor Vinícius Coimbra, que filmará A hora e a vez... Em solo mineiro, nos arredores de Diamantina, em São Gonçalo do Rio das Pedras. "Só que o primeiro mandamento cristão, 'Não matarás', não se aplica a ele. Por isso ele é um homem angustiado, em processo de autodestruição".

No livro, Rosa diz: "Matraga não é Matraga, não é nada. Matraga é Esteves. Augusto Esteves, filho do Coronel Afonsão Esteves, da Pindaíbas e do Saco-da-Embira. Ou Nhô Augusto - o homem". Mas na tela grande, na pele de Leonardo Villar, as inquietações de Matraga se corporificaram em uma imagem trágica e poética. Até hoje, críticos formam coro para afirmar que o filme A hora e vez de Augusto Matraga (que não tem, no título, o segundo artigo "a", como na edição original da novela), de Roberto Santos, é uma das raras produções nacionais equiparáveis ao glauberiano Deus e o diabo na Terra do Sol (1964) e a Os fuzis (também 1964), de Ruy Guerra, em vigor estético.

"O meu Matraga não é definitivo. Existem muitos caminhos para fazê-lo. O meu caminho foi me apaixonar pelo personagem e ler muito Guimarães", diz Leonardo Villar, apontando um caminho que Miguel pode seguir. A versão de A hora e vez... que Villar estrelou é inédita em DVD, raríssima em retrospectivas e de difícil circulação nas TVs. Em 2003, o filme chegou a ser retirado de uma mostra sobre o sertão no cinema nacional, o que sugeriu a hipótese de que a família de Rosa teria embargado sua circulação. A escritora Vilma Guimarães Rosa, filha do autor, refuta essa versão: "Recentemente, antes de participar de homenagens a papai em Londres e Berlim, eu pude rever A hora e vez...", E ele me emocionou muito. Não existe problema algum nosso com o filme", diz Vilma, lembrando que a obra de seu pai teve resultados felizes em transposição para o teatro, incluindo Augusto Matraga, como, por exemplo, a montagem em tom de musical encenada por André Paes Leme, em 2007, com o ator Vladimir Brichta.  

(© JC Online)

 

Com relação a este tema, saiba mais (arquivo NordesteWeb)


powered by FreeFind