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Ceará tem só jazz em plena folia

23/02/2009

 

 

Foto: Divulgação

Domingos, destaque no Festival de Jazz & Blues de 2009

Mostra de som instrumental que ocorre em Guaramiranga completa dez anos

Livia Deodato

 
Guaramiranga é daqueles locais difíceis de acreditar que são reais. Ali, no município incrustado no Maciço de Baturité, região serrana do Ceará, as pessoas passeiam de gorros e luvas e saboreiam fondue em restaurantes da praça. A maioria não está acostumada à temperatura de 17°C que tem feito estes dias, quando a noite cai. A população, estimada em 5 mil habitantes, triplica nesta época do ano, mas não é para se sacudir ao som do frevo, maracatu, samba ou axé. Se no lugar do abadá, centenas de jovens, famílias com crianças e idosos vestem malhas de lã e botas, em vez de tamborins eles preferem dar ouvidos a guitarras, baixos, bateria e piano.

Há dez anos esse movimento contrário à lógica brasileira em pleno verão carnavalesco vem se firmando, graças ao Festival de Jazz & Blues, que ocorre todo ano na cidade. Músicos e bandas nacionais e internacionais enfrentam 1h30 de estrada bem pavimentada (com vista para infinitas carnaúbas) desde Fortaleza, a fim de realizarem ensaios abertos e concertos no Teatro Rachel de Queiroz, oficinas na Escola Zélia Matos Brito e jam sessions na quadra municipal, até quase 3 horas da madrugada do dia seguinte. Três pontos que os turistas são capazes de conhecer em menos de 20 minutos, dada a localização comum na principal rua de Guaramiranga, Joaquim Alves Nogueira. "Não temos a intenção de virar um festival de multidão, mesmo porque a cidade não comporta. Seria bom que tivéssemos muitos festivais como este, para poucas pessoas, em todo o País", diz Maria Amélia Mamede, de 46 anos, idealizadora do evento ao lado de Rachel Gadelha, da Via de Comunicação e Cultura.

A iniciativa privada, que conta com apoio da Lei Rouanet desde a 2ª edição, e captou cerca de R$ 1,5 milhão para a comemoração destes 10 anos, tem mesmo inspirado outros eventos em diversas partes do País (leia box nesta página). Sem contar que já se estabeleceu como referência entre os músicos que se dedicam exclusivamente à arte que preza harmonia, arranjo e melodia em detrimento à voz. Um dos notáveis nomes que demonstraram alegria por participar do festival pela primeira vez foi Cesar Camargo Mariano, que se apresentou às 22 h de domingo para uma plateia lotada. "Há dez anos há esse namoro entre mim e o festival, mas não conseguíamos acertar as agendas. Finalmente, estou aqui e vou mostrar um pouquinho do meu trabalho com um trio de piano, baixo e bateria, formação com que iniciei minha carreira há 50 anos", disse ele logo após fazer um solo de Samambaia. Antes de convidar Julinho Moreira (bateria) e seu filho Marcelo Mariano (baixo) para subirem ao palco, Cesar deu boas-vindas também aos morcegos, cuja diversão era dar rasantes durante todas as apresentações no teatro. "Bem-vindos sejam os Batmans também", disse arrancando gargalhadas do público.

Cesar manteve a simpatia do ensaio gratuito que realizou na tarde de domingo para apresentar as mais variadas músicas de um repertório que visitou Johnny Alf (O Que É Amar) a João Bosco e Aldir Blanc (Bala com Bala). O silêncio absoluto não abandonou o teatro no fim de semana de abertura do Festival Jazz & Blues. Prova de que um público interessado e cativo já se formou no alto da serra. "Quando começamos a idealizar este festival, tínhamos a intenção de oferecer algo que fosse o oposto ao carnaval, pois sempre soubemos de pessoas que não gostam da festa tradicional", conta Maria Amélia. "Quando se pensa no Ceará, logo vem a imagem de praia e, seguindo a lógica a que tínhamos nos proposto, deveríamos subir a serra. Deu tão certo que, por volta da 4ª edição, houve muitas solicitações de se levar o festival para Fortaleza também." Neste ano, o gaitista belga Toots Thielemans, o próprio Cesar e os paulistas da Dixie Square Jazz Band, que se apresentaram em Guaramiranga entre sábado de carnaval e hoje, seguem para a capital cearense, para se espetáculos de quinta a sábado que vem (mais informações no site www.jazzeblues.com.br).

Destaque também foi Dominguinhos, homenageado desta edição e que também pela primeira vez no festival. O pernambucano de 68 anos, que poderia ganhar honrarias pela extrema solicitude que lhe é característica, começou o show tocando seus clássicos de forma instrumental, como Isso Aqui Tá Bom Demais, foi atender aos pedidos dos fãs e cedeu ao canto das belíssimas Lamento Sertanejo e De Volta Pro Aconchego. O maior sanfoneiro do País, que começou a tocar acordeão aos 8 anos na feira de Garanhuns para ajudar no sustento da família, frisou a importância do festival de Guaramiranga, que oferece espaço aos instrumentistas, artistas que sempre tiveram dificuldade maior para apresentar seus trabalhos. "Mas isso está mudando, graças a Deus. Eu mesmo observo interesse cada vez maior dos jovens em aprender a tocar o acordeão, que foi relegado à época da bossa nova e obrigou os sanfoneiros a tocar piano, ainda que tivessem dificuldade com a mão esquerda", relembra ele que, por sua vez, nunca abriu mão do instrumento que o consagrou. Foi aplaudido de pé, pouco depois de fazer todo mundo arrastar o pé com Respeita Januário, de autoria de seu padrinho Luiz Gonzaga.

O Festival Jazz & Blues ofereceu música instrumental mais experimental com o Trio + 1, formado por Benjamin Taubkin (piano), Zeca Assumpção (contrabaixo), Sérgio Reze (bateria) e Joatan Nascimento (trompete), cuja sonoridade sincopada cativou logo no início. O baixista cearense Nélio Costa, que cursou música na Universidade Estadual do Ceará (UEC) e se aprimorou na Alemanha, onde passou oito anos, também surpreendeu. Nélio já lançou dois álbuns, independentes, Das Origens (2000) e Só Alegria (2002). O guitarrista Lanny Gordin, que se apresentou ao lado de três feras - Fábio Sá (baixo e contrabaixo), Guilherme Held (guitarra) e José Aurélio (timba) -, montou ótima seleção com Caetano Veloso e Gilberto Gil, entre outros. Enquanto isso, lá fora, os milhares de jovens se dividiam entre ouvir jam sessions com os cariocas da Beale Street na quadra municipal, e dançar ao som de Estúpido Cupido, da jovem guarda, que saía da caixa de som de um centro cultural. Alguns podem até chamar de samba do crioulo doido, mas para os presentes, isso, sim, é que é carnaval.

(© Estadão)

 


 

Vai começar a 10ª edição do Festival Jazz & Blues

Ao todo serão 21 atrações, sendo dez do Ceará, dez nacionais e um convidado internacional, que se apresentarão entre os dias 21 e 28 de fevereiro, em Guaramiranga e Fortaleza

Instrumentos afinados, atrações confirmadas e estrutura montada. Está tudo pronto para a 10ª edição do Festival Jazz & Blues. Nas ruas e palcos de Guaramiranga e Fortaleza estarão presentes cantores, guitarristas, gaitistas e outros tantos músicos brasileiros e estrangeiros. Ao todo serão 21 atrações, sendo dez do Ceará, dez nacionais e um convidado internacional, que se apresentarão entre os dias 21 e 28 de fevereiro, em Guaramiranga e Fortaleza.

O carnaval jazzístico começa nessa sexta-feira, 20, com a homenagem que o Festival vai prestar a Dominguinhos, um dos grandes nomes deste ano, na cidade de Guaiúba, a 38 km de Fortaleza. Uma festa às 16h, no Centro de Arte e Cultura Portal da Serra (Cearc) vai reunir Rodolf Forte e vários sanfoneiros cearenses, de todas as idades, que compartilham a mesma dedicação ao instrumento que consagrou Luiz Gonzaga, Sivuca e o próprio Dominguinhos.

No sábado, 21, um dia após a homenagem, o Festival Jazz & Blues sobe a serra. Serão quatro dias de muita música de qualidade e atividades diversas dia e noite. A programação musical em Guaramiranga começa à tarde. Às 14h, o homenageado Dominguinhos faz o primeiro Ensaio Aberto do evento, no Teatro Rachel de Queiroz. Essa é uma boa oportunidade para ter um contato mais próximo com o sanfoneiro, além de ter uma pequena mostra do que será apresentado no show à noite no mesmo palco.

O primeiro dia também será marcado pelo início das oficinas de Flauta, ministrada por Bob mesquita, de 21 a 23; de Gaita, com Jefferson Gonçalves, de 21 a 24; e de Percussão, com Vanildo Franco, de 21 a 24. As aulas acontecem às 15h, na Escola Zélia Matos Brito, com inscrições gratuitas, que podem ser feitas na secretaria do Festival, em Guaramiranga, ao lado do Teatro Rachel de Queiroz.

A 10ª edição do Festival também vai promover uma oficina de Confecção de Instrumentos, realizada pela Coelce e ministrada pelo instrutor Vanildo Franco. A aula, que acontece no domingo, de 10h às 12h, também na Escola Zélia Matos Brito, vai trabalhar com os alunos o resgate de instrumentos típicos do Nordeste, como a zabumba, as caixas cabaçais e os ganzás. Vanildo Franco vai utilizar materiais como o alumínio e o eucatex, que alcançam uma sonoridade muito próxima dos instrumentos construídos em madeira, com acabamento ao mesmo tempo rústico e discreto, além da durabilidade, leveza e praticidade na construção.

Atrações do Festival Jazz & Blues 2009
Artistas renomados, de carreiras consolidadas, vão marcar esta edição comemorativa de 10 anos do Festival Jazz & Blues. Além do mestre Dominguinhos, estarão presentes no palco do Teatro Rachel de Queiroz o belga Toots Thielemans, reconhecido como um dos maiores gaitistas de jazz do século XX; o pianista, arranjador e compositor César Camargo Mariano, um dos músicos brasileiros mais celebrados e requisitados no mundo; Arthur Maia, considerado pela crítica especializada um dos melhores baixistas do mundo; a cantora Ná Ozzetti, que vem com quarteto formado por Dante Ozzetti (violão), Mário Manga (guitarra e violoncelo), Sérgio Reze (percussão) e Zé Alexandre Carvalho (contrabaixo); o Trio + 1, com o pianista, compositor e arranjador Benjamin Taubkin, o baixista Zeca Assumpção, Sérgio Reze e o trompetista Joatan Nascimento; o guitarrista Lanny Gordin, um dos maiores instrumentistas que surgiu no movimento tropicalista; e um dos pioneiros do blues no Brasil, Paulo Meyer, fundador da hoje lendária banda Expresso 2222, que marcou época e influenciou toda uma geração de ‘bluesmen’ paulistanos.

Além de shows, durante o dia, o público do Festival pode conferir ensaios abertos, onde atrações da noite conversam com a platéia e dão uma prévia do que vai acontecer no palco às 22h30. Este ano os ensaios abertos serão com Dominguinhos, César Camargo Mariano, Ná Ozzetti e Toots Thielemans.

Programação jazzística em Fortaleza

Depois dos quatro dias no fiozinho da serra, o Festival desce a Fortaleza na quarta-feira de cinzas para, de quinta a sábado, levar mais shows aos amantes da boa música. Subirão ao palco do Theatro José de Alencar o gaitista Toots Thielemans, na quinta-feira, 26, e César Camargo Mariano, na sexta-feira, 27. Já no Ideal Clube, onde vai acontecer no sábado, 28, a festa de encerramento do Festival Jazz & Blues, apresenta-se a Dixie Square Jazz Band. Os três shows terão início às 21 horas

Em Fortaleza, também no sábado, 28, às 14h30, Toots Thielemans fará uma apresentação exclusiva no Theatro José de Alencar para alunos e professores da rede pública municipal de ensino. O acesso será mediante a apresentação de carteira de estudante e, para o professor, documento que comprove o exercício da profissão na rede pública de Fortaleza.

Serviço:
10º Festival Jazz & Blues – Dia 20 de fevereiro, homenagem a Dominguinhos em Guaiúba. De 21 a 24 Festival em Guaramiranga e de 26 a 28 em Fortaleza. Informações gerais: 3262 7230 (até o dia 20 e a partir do dia 25) e 85-3321.1321 (Secretaria do Festival em Guaramiranga, de 21 a 24).

(© O Povo, 17.02.2009)


SITE

Festival Jazz & Blues

VÍDEO

MAKING OF JAZZ & BLUES GUARAMIRANGA 2008 - PARTE I

 


 

MAKING OF JAZZ & BLUES GUARAMIRANGA 2008 - PARTE II

 

Com relação a este tema, saiba mais (arquivo NordesteWeb)


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