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Domingos, destaque no Festival de Jazz & Blues de
2009 |
Mostra de som instrumental que ocorre em Guaramiranga completa
dez anos
Guaramiranga é daqueles locais difíceis de acreditar que são reais.
Ali, no município incrustado no Maciço de Baturité, região serrana
do Ceará, as pessoas passeiam de gorros e luvas e saboreiam fondue
em restaurantes da praça. A maioria não está acostumada à
temperatura de 17°C que tem feito estes dias, quando a noite cai. A
população, estimada em 5 mil habitantes, triplica nesta época do
ano, mas não é para se sacudir ao som do frevo, maracatu, samba ou
axé. Se no lugar do abadá, centenas de jovens, famílias com crianças
e idosos vestem malhas de lã e botas, em vez de tamborins eles
preferem dar ouvidos a guitarras, baixos, bateria e piano.
Há dez anos esse movimento contrário à lógica brasileira em pleno
verão carnavalesco vem se firmando, graças ao Festival de Jazz &
Blues, que ocorre todo ano na cidade. Músicos e bandas nacionais e
internacionais enfrentam 1h30 de estrada bem pavimentada (com vista
para infinitas carnaúbas) desde Fortaleza, a fim de realizarem
ensaios abertos e concertos no Teatro Rachel de Queiroz, oficinas na
Escola Zélia Matos Brito e jam sessions na quadra municipal, até
quase 3 horas da madrugada do dia seguinte. Três pontos que os
turistas são capazes de conhecer em menos de 20 minutos, dada a
localização comum na principal rua de Guaramiranga, Joaquim Alves
Nogueira. "Não temos a intenção de virar um festival de multidão,
mesmo porque a cidade não comporta. Seria bom que tivéssemos muitos
festivais como este, para poucas pessoas, em todo o País", diz Maria
Amélia Mamede, de 46 anos, idealizadora do evento ao lado de Rachel
Gadelha, da Via de Comunicação e Cultura.
A iniciativa privada, que conta com apoio da Lei Rouanet desde a 2ª
edição, e captou cerca de R$ 1,5 milhão para a comemoração destes 10
anos, tem mesmo inspirado outros eventos em diversas partes do País
(leia box nesta página). Sem contar que já se estabeleceu como
referência entre os músicos que se dedicam exclusivamente à arte que
preza harmonia, arranjo e melodia em detrimento à voz. Um dos
notáveis nomes que demonstraram alegria por participar do festival
pela primeira vez foi Cesar Camargo Mariano, que se apresentou às 22
h de domingo para uma plateia lotada. "Há dez anos há esse namoro
entre mim e o festival, mas não conseguíamos acertar as agendas.
Finalmente, estou aqui e vou mostrar um pouquinho do meu trabalho
com um trio de piano, baixo e bateria, formação com que iniciei
minha carreira há 50 anos", disse ele logo após fazer um solo de
Samambaia. Antes de convidar Julinho Moreira (bateria) e seu filho
Marcelo Mariano (baixo) para subirem ao palco, Cesar deu boas-vindas
também aos morcegos, cuja diversão era dar rasantes durante todas as
apresentações no teatro. "Bem-vindos sejam os Batmans também", disse
arrancando gargalhadas do público.
Cesar manteve a simpatia do ensaio gratuito que realizou na tarde de
domingo para apresentar as mais variadas músicas de um repertório
que visitou Johnny Alf (O Que É Amar) a João Bosco e Aldir Blanc
(Bala com Bala). O silêncio absoluto não abandonou o teatro no fim
de semana de abertura do Festival Jazz & Blues. Prova de que um
público interessado e cativo já se formou no alto da serra. "Quando
começamos a idealizar este festival, tínhamos a intenção de oferecer
algo que fosse o oposto ao carnaval, pois sempre soubemos de pessoas
que não gostam da festa tradicional", conta Maria Amélia. "Quando se
pensa no Ceará, logo vem a imagem de praia e, seguindo a lógica a
que tínhamos nos proposto, deveríamos subir a serra. Deu tão certo
que, por volta da 4ª edição, houve muitas solicitações de se levar o
festival para Fortaleza também." Neste ano, o gaitista belga Toots
Thielemans, o próprio Cesar e os paulistas da Dixie Square Jazz
Band, que se apresentaram em Guaramiranga entre sábado de carnaval e
hoje, seguem para a capital cearense, para se espetáculos de quinta
a sábado que vem (mais informações no site www.jazzeblues.com.br).
Destaque também foi Dominguinhos, homenageado desta edição e que
também pela primeira vez no festival. O pernambucano de 68 anos, que
poderia ganhar honrarias pela extrema solicitude que lhe é
característica, começou o show tocando seus clássicos de forma
instrumental, como Isso Aqui Tá Bom Demais, foi atender aos pedidos
dos fãs e cedeu ao canto das belíssimas Lamento Sertanejo e De Volta
Pro Aconchego. O maior sanfoneiro do País, que começou a tocar
acordeão aos 8 anos na feira de Garanhuns para ajudar no sustento da
família, frisou a importância do festival de Guaramiranga, que
oferece espaço aos instrumentistas, artistas que sempre tiveram
dificuldade maior para apresentar seus trabalhos. "Mas isso está
mudando, graças a Deus. Eu mesmo observo interesse cada vez maior
dos jovens em aprender a tocar o acordeão, que foi relegado à época
da bossa nova e obrigou os sanfoneiros a tocar piano, ainda que
tivessem dificuldade com a mão esquerda", relembra ele que, por sua
vez, nunca abriu mão do instrumento que o consagrou. Foi aplaudido
de pé, pouco depois de fazer todo mundo arrastar o pé com Respeita
Januário, de autoria de seu padrinho Luiz Gonzaga.
O Festival Jazz & Blues ofereceu música instrumental mais
experimental com o Trio + 1, formado por Benjamin Taubkin (piano),
Zeca Assumpção (contrabaixo), Sérgio Reze (bateria) e Joatan
Nascimento (trompete), cuja sonoridade sincopada cativou logo no
início. O baixista cearense Nélio Costa, que cursou música na
Universidade Estadual do Ceará (UEC) e se aprimorou na Alemanha,
onde passou oito anos, também surpreendeu. Nélio já lançou dois
álbuns, independentes, Das Origens (2000) e Só Alegria (2002). O
guitarrista Lanny Gordin, que se apresentou ao lado de três feras -
Fábio Sá (baixo e contrabaixo), Guilherme Held (guitarra) e José
Aurélio (timba) -, montou ótima seleção com Caetano Veloso e
Gilberto Gil, entre outros. Enquanto isso, lá fora, os milhares de
jovens se dividiam entre ouvir jam sessions com os cariocas da Beale
Street na quadra municipal, e dançar ao som de Estúpido Cupido, da
jovem guarda, que saía da caixa de som de um centro cultural. Alguns
podem até chamar de samba do crioulo doido, mas para os presentes,
isso, sim, é que é carnaval.
(©
Estadão)
Ao todo serão 21 atrações, sendo dez do
Ceará, dez nacionais e um convidado internacional, que se apresentarão entre
os dias 21 e 28 de fevereiro, em Guaramiranga e Fortaleza
Instrumentos afinados, atrações
confirmadas e estrutura montada. Está tudo pronto para a 10ª edição
do Festival Jazz & Blues. Nas ruas e palcos de Guaramiranga e
Fortaleza estarão presentes cantores, guitarristas, gaitistas e
outros tantos músicos brasileiros e estrangeiros. Ao todo serão 21
atrações, sendo dez do Ceará, dez nacionais e um convidado
internacional, que se apresentarão entre os dias 21 e 28 de
fevereiro, em Guaramiranga e Fortaleza.
O carnaval jazzístico começa nessa sexta-feira, 20, com a homenagem
que o Festival vai prestar a Dominguinhos, um dos grandes nomes
deste ano, na cidade de Guaiúba, a 38 km de Fortaleza. Uma festa às
16h, no Centro de Arte e Cultura Portal da Serra (Cearc) vai reunir
Rodolf Forte e vários sanfoneiros cearenses, de todas as idades, que
compartilham a mesma dedicação ao instrumento que consagrou Luiz
Gonzaga, Sivuca e o próprio Dominguinhos.
No sábado, 21, um dia após a homenagem, o Festival Jazz & Blues sobe
a serra. Serão quatro dias de muita música de qualidade e atividades
diversas dia e noite. A programação musical em Guaramiranga começa à
tarde. Às 14h, o homenageado Dominguinhos faz o primeiro Ensaio
Aberto do evento, no Teatro Rachel de Queiroz. Essa é uma boa
oportunidade para ter um contato mais próximo com o sanfoneiro, além
de ter uma pequena mostra do que será apresentado no show à noite no
mesmo palco.
O primeiro dia também será marcado pelo início das oficinas de
Flauta, ministrada por Bob mesquita, de 21 a 23; de Gaita, com
Jefferson Gonçalves, de 21 a 24; e de Percussão, com Vanildo Franco,
de 21 a 24. As aulas acontecem às 15h, na Escola Zélia Matos Brito,
com inscrições gratuitas, que podem ser feitas na secretaria do
Festival, em Guaramiranga, ao lado do Teatro Rachel de Queiroz.
A 10ª edição do Festival também vai promover uma oficina de
Confecção de Instrumentos, realizada pela Coelce e ministrada pelo
instrutor Vanildo Franco. A aula, que acontece no domingo, de 10h às
12h, também na Escola Zélia Matos Brito, vai trabalhar com os alunos
o resgate de instrumentos típicos do Nordeste, como a zabumba, as
caixas cabaçais e os ganzás. Vanildo Franco vai utilizar materiais
como o alumínio e o eucatex, que alcançam uma sonoridade muito
próxima dos instrumentos construídos em madeira, com acabamento ao
mesmo tempo rústico e discreto, além da durabilidade, leveza e
praticidade na construção.
Atrações do Festival Jazz & Blues 2009
Artistas renomados, de carreiras consolidadas, vão marcar esta
edição comemorativa de 10 anos do Festival Jazz & Blues. Além do
mestre Dominguinhos, estarão presentes no palco do Teatro Rachel de
Queiroz o belga Toots Thielemans, reconhecido como um dos maiores
gaitistas de jazz do século XX; o pianista, arranjador e compositor
César Camargo Mariano, um dos músicos brasileiros mais celebrados e
requisitados no mundo; Arthur Maia, considerado pela crítica
especializada um dos melhores baixistas do mundo; a cantora Ná
Ozzetti, que vem com quarteto formado por Dante Ozzetti (violão),
Mário Manga (guitarra e violoncelo), Sérgio Reze (percussão) e Zé
Alexandre Carvalho (contrabaixo); o Trio + 1, com o pianista,
compositor e arranjador Benjamin Taubkin, o baixista Zeca Assumpção,
Sérgio Reze e o trompetista Joatan Nascimento; o guitarrista Lanny
Gordin, um dos maiores instrumentistas que surgiu no movimento
tropicalista; e um dos pioneiros do blues no Brasil, Paulo Meyer,
fundador da hoje lendária banda Expresso 2222, que marcou época e
influenciou toda uma geração de ‘bluesmen’ paulistanos.
Além de shows, durante o dia, o público do Festival pode conferir
ensaios abertos, onde atrações da noite conversam com a platéia e
dão uma prévia do que vai acontecer no palco às 22h30. Este ano os
ensaios abertos serão com Dominguinhos, César Camargo Mariano, Ná
Ozzetti e Toots Thielemans.
Programação jazzística em Fortaleza
Depois dos quatro dias no fiozinho da serra, o Festival desce a
Fortaleza na quarta-feira de cinzas para, de quinta a sábado, levar
mais shows aos amantes da boa música. Subirão ao palco do Theatro
José de Alencar o gaitista Toots Thielemans, na quinta-feira, 26, e
César Camargo Mariano, na sexta-feira, 27. Já no Ideal Clube, onde
vai acontecer no sábado, 28, a festa de encerramento do Festival
Jazz & Blues, apresenta-se a Dixie Square Jazz Band. Os três shows
terão início às 21 horas
Em Fortaleza, também no sábado, 28, às 14h30, Toots Thielemans fará
uma apresentação exclusiva no Theatro José de Alencar para alunos e
professores da rede pública municipal de ensino. O acesso será
mediante a apresentação de carteira de estudante e, para o
professor, documento que comprove o exercício da profissão na rede
pública de Fortaleza.
Serviço:
10º Festival Jazz & Blues – Dia 20 de fevereiro, homenagem a
Dominguinhos em Guaiúba. De 21 a 24 Festival em Guaramiranga e de 26
a 28 em Fortaleza. Informações gerais: 3262 7230 (até o dia 20 e a
partir do dia 25) e 85-3321.1321 (Secretaria do Festival em
Guaramiranga, de 21 a 24).
(©
O Povo, 17.02.2009)
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