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Juízo, pra quê?

30/03/2009

 

 

Lula Queiroga
 

Cantor e compositor Lula Queiroga lança o novo disco Tem juízo mas não usa

José Teles
teles@jc.com.br

Quando Lula Queiroga e sua trupe de barulhinhos bons começaram a arquitetar as músicas de Tem juízo mas não usa, CD que lança hoje com um show no Teatro da UFPE, às 21h, o filho Luca, o lourinho de olhos azuis de 2 anos que ilustra capa, ainda nem existia. Lula não tem pressa em lançar discos. Tem juízo mas não usa fecha a trilogia iniciada há oito anos com Aboiando a vaca mecânica. O segundo disco, Azul invisível vermelho cruel veio em 2004. E agora, cinco anos depois, fecha-se o círculo.

“É uma trilogia mais no estilo das músicas do que mesmo em temas”, diz o autor. “Talvez o Aboiando seja o mais doidinho. O Azul invisível é mais urbano. Este terceiro é uma terceira história, diferente, já tem outros tipos de coloração. São completamente diferentes, mas são a mesma coisa. Sem querer as pessoas vão se acostumando com o estilo, com as sonoridades.”

Inicialmente o título do novo CD seria Tudo enzima. A canção Tem juízo mas não usa é ainda anterior ao projeto do disco. A música foi iniciada há quatro anos, ainda sem este nome, na casa de Pedro Luís (do grupo A Parede), na Lagoa, Zona Sul carioca. Perdeu-se, e foi achada uns dois anos mais tarde. “Era uma frase das muitas que meu pai usava. O texto surgiu inteiro quando achei a gravação. Tem a ver com ecologia, porque o homem não é só irresponsável com a natureza. O homem é irresponsável por natureza”, fala Lula Queiroga.

O pai de Lula, foi compositor (gravado por Luiz Gonzaga e Marinês, entre outros) e redator de textos de humor, Luís Queiroga escreveu praticamente todos os textos do lendário cantor e comediante Coroné Ludugero. A mãe, Mêves Gama, foi cantora da Rádio Jornal do Commercio e gravou vários discos pela Rozenblit. Lula sofreu influência dos dois, tanto para a música, quanto para o texto. Profissionalmente, o texto veio primeiro. Com 18 anos, Lula se tornou redator do programa de Chico Anysio, na TV Globo. “Eu já escrevia com meu pai na Rádio Globo daqui. Quando ele morreu, mandei uns textos para Chico, que gostou e me convidou para escrever para ele. Mas continuei morando no Recife. Chico foi uma pessoa muito legal. Me ajudou bastante por um tempo”, conta.

Música ele diz que faz desde os 15 anos, mas a primeira que gravada foi o caboclinho Essa alegria, por Elba Ramalho, em 1982. O disco de estréia, Baque solto, dividido com Lenine, foi lançado no mesmo ano, não provocou impacto por não ser nem MPB, nem rock, que começaria a dominar o mercado a partir daquele ano. Lula Queiroga continuou compondo, participando de discos de amigos, e suas composições ecoaram Brasil afora na voz de Elba Ramalho e do amigo Lenine. “Nestes anos todos nunca tivemos uma rusga. Discutimos algumas vezes, mas por divergências de opiniões sobre determinada composição. Temos feito menos em parceria, mas, por exemplo, no disco Acústico MTV dele há cinco músicas minhas”, diz.

Lula tem a música como atividade que mais aprecia, porém, trabalha com tantas linguagens quantas lhe é possível. “Comecei este disco há três anos. Mas, nesse intervalo, fiz cinema, produzi o Agora curta, jingles, peças publicitárias, discos, como Qual o assunto que mais lhe interessa? de Elba Ramalho, indicado a um Grammy latino”, lembra.

Neste CD, trabalha com a “máfia da Luni”. A começar pelo sobrinho Yuri Queiroga, parceiro em quatro composições, guitarrista em quase todas elas, quase tudo é parente: Lucky Luciano, Tostão Queiroga, Eduardo Braga, Erick Hoover, Lucas dos Prazeres. É com este pessoal que ele vai para a estrada com o show do disco.

“Terá naturalmente músicas de todos os discos. Não dá para fazer uma turnê só com músicas novas. O pessoal vai para o show a fim de ouvir músicas de que ele gosta, Tiro certeiro, Dois olhos negros, Noite severina, Telefonista. No show na UFPE também será assim. O incrível é que onde quer que a gente faça shows, as pessoas cantam as músicas em coro”, comenta Lula, exultado com a quantidade de acessos que as novas canções têm tido no MySpace: “Foram 1.770 acessos no MySpace, e eles só computam se a pessoa escutar a música inteira. O bom disso é que um pessoa vai passando para outra e daí em diante.”

Com Tem juízo mas não usa Lula Queiroga volta à estrada. “Vamos fazer logo de cara dez capitais e cidades importantes do interior, como Santos, Araraquara e Caxias do Sul. Este vai ser o ano em que vou poder entrar mais nessa brincadeira. Penso que estes dois, três anos vão ser mais voltado para a música, uma cobrança dos amigos daqui, do Rio, de Minas, São Paulo”, conta Lula.

Ele concorda que leva uma vantagem sobre outros artistas: não está preso a deadlines de estúdio ou para finalizar o disco. O trabalho vai sendo feito aos poucos, de acordo com a disponibilidade de tempo. “Tem vez em que passamos 20 dias trabalhando numa música porque outra atividade exige a presença da gente. Mas a música, a composição tenho como uma coisa mais divina. Ando com um iPod sempre que pinta uma idéia enquanto faço outra atividade gravo, anoto. Já outras ficam prontas em 15 minutos. A gente começa do nada. cantarola história, vai cantando, e surge letra e melodia. Foi assim com duas faixas deste disco. Agora, corra e Manga graviola e hortelã. Neste disco são bem claras as influências de duas coisas: Novos Baianos e Mutantes. Tectopop, por exemplo, foi feita pensando em Serginho Baptista, que iria tocar nela, gravar na Luni, mas de última hora não pôde vir”, continua Lula Queiroga.

Se o guitarrista dos Mutantes não pôde, muita gente deu o ar de sua graça em Tem juizo mas não usa: Geraldo Maia, Lenine, Toninho Ferragutti, Lirinha, Silvério Pessoa, Jam da Silva, China, Alceu Valença, Chiquinho (Mombojó), Spok, Jr. Tostói. “A Luni sempre foi aglutinadora de pessoas desde que foi criada, há 13 anos. A Mombojó fez a demo do Homem-espuma aqui, Zé Brown, Zé Neguinho do Coco, gravaram aqui. Até Bráulio Tavares gravou, se bem que Bráulio é uma espécie de lenda urbana de estúdio. Há anos que ele promete lançar o disco. Pior é que ele gravou muita coisa agora”, diz Lula sem esquecer o técnico de som francês Dominique Chaloub. “Muito importante a participação de Dominique, uma pessoa companheira, que tem certas ousadias sonoras. Trouxe o equipamento dele, caixas de 30 anos atrás. Tem umas coisas, umas sonoridades que só ele consegue tirar destes equipamentos”, elogia.

Da mesma forma como aglutina pessoas, um disco de Lula Queiroga aglutina sons, os mais diversos. “São usados de acordo com a necessidade e aí a gente começa a testar, e qualquer coisa. Tem momentos no disco que tiramos som de tampa de chaleira, de calimba, berimboca, e até de um extintor de incêndio”.

(© JC Online)


Lula Queiroga cultiva dom de surpreender
 
O universo musical de Lula Queiroga é um dos mais particulares da MPB, do pop, do rock, já que os limites entre gêneros e estilos estão cada vez mais difíceis de delinear. A melodia é tão importante quanto a letra, na qual a imagética é muito forte: “As pessoas me perguntam como eu consigo clipar uma música minha se tudo está na letra?”, brinca Lula. “Eu tô dançando no escuro/ com vaga-lumes em volta/uma corrente de amor se despreende, se solta/ eu tô ouvindo sereias, lavadeira, cirandeiras/ me levam pro meio da roda”, versos de Você não disse, a canção que abre o repertório do Tem juízo mas não usa.

Além destes dois ingredientes principais, e, claro, as vozes (Lula aprimorou bastante sua forma antes meio displicente de cantar), há o instrumental, as programações, timbragens. A guitarra de Yuri Queiroga é a linha mestra do som do disco. Ele é daqueles que não apenas toca bem, mas sabe que pedal, qual a extensão do solo que deve empregar em cada música.

No universo musical de Lula há lugar para surrealismo, divagações digamos existenciais, como em Altos e baixos (parceria com Yuri Queiroga), que brinca a sério com celebridades, tanto as que realizam alguma coisa, quanto os BBBs da vida, que são famosos por ser famosos: “Eu sou o herói do momento/sou a capa da Veja/ sou o tampa de Crush/ a loura da Nova Schin/ sou a nova coqueluche do inverno/ pobre feliz de mim”. Há lugar para o amor, mas um amor que é meio desamor, e que acaba, senão com um final feliz, com alguma conclusão irônica: “Tem um certo humor nas letras, mesmo quando elas estão tristes. Certas situações acabam ficando engraçadas. Como quando canto ‘o que vou dizer em casa pras paredes”, que soa como uma ironia, em cima de um jargão. Vou dizer pra quem?” Coração burro (todo grande amor vem de um coração burro) tem o contraponto na percussão feita em um extintor de incêndio por Yuri Queiroga. Lula Queiroga ainda é dos poucos na música brasileira que continuam com o dom de surpreender. (J.T.)

(© JC Online)


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