JORNAL DO COMMERCIO Como é estar levando a
exposição Viva a Vida! para o Rio de Janeiro, um lugar onde você já morou e já
foi tema de suas pinturas?
GUITA CHARIFKER É bom para mim estar
levando este trabalho para o Rio, é emocionante, estou feliz. Eu tenho muito carinho
pelas imagens e paisagens do Rio. Já pintei a Urca, Ipanema, a Gávea. Mas, ao mesmo
tempo, penso em parar com a minha vida artística depois desta exposição. Outro dia,
estava vendo na televisão um grande jogador de beisebol americano encerrando a sua
carreira, com um último jogo. Achei tão bonito ele anunciar o fim de seu trabalho ainda
jogando. Eu tenho impressão que vou anunciar o fim da minha carreira com este maravilhoso
projeto. É uma honra para um artista ver publicado um livro sobre suas obras. Vou
começar, a partir de agora, a trabalhar sem me preocupar com exposições. Penso em
encerrar com chave de ouro uma carreira que começou há muito tempo.
JC Pensa em parar de pintar?
GC Não, de jeito nenhum. Não vou parar
de pintar. Eu vivo da minha arte, se possível, vou continuar vendendo meus quadros. Só
não quero me preocupar com mostras e dar satisfações do que estou fazendo. Quero me
isolar em uma casa de campo e começar outra fase do meu trabalho, que não vai ter nada a
ver com os meus anteriores. Acho que todo mundo deveria saber a hora de parar, enquanto as
coisas ainda estão funcionando bem. Agora queria descobrir um paraíso novo, em um
sítio, de preferência, afastado da cidade.
JC Este seu interesse pela natureza
revela-se mesmo em toda a sua obra. Como surgiu a vontade de trabalhar com isso nas suas
pinturas?
GC Isto começou no México. Eu ganhei
um prêmio e participei de uma bienal interamericana. Era para passar uma semana e eu
fiquei seis meses. Eu comecei a fazer aquarela lá, olhando para a natureza, para o
colorido das feiras, das roupas mexicanas. Fiquei num sítio e me inspirei para pintar os
bichos, as árvores. Me lembro de um imenso pé de serigüela. Eu pintava o que via e
faço isso até hoje. Não são coisas que eu invento, não. Se as pessoas olharem
direitinho também são capazes de ver as belezas da natureza.
JC Faz questão, então, de retratar sempre
o lado belo e positivo da vida. E quando você está triste? Em nenhum momento o lado
negativo da vida se refletiu em seus trabalhos?
GC Quando eu estou triste, não pinto.
Vou fazer outra coisa, lavar prato, varrer a casa. A minha arte nunca vai transparecer
tristeza. Não é isso que quero passar para as pessoas. O melhor elogio que recebi na
minha vida foi de um jornalista, que agora não me lembro o nome. Ele me disse que tinha
um quadro meu em seu quarto e todos os dias quando acordava se sentia feliz ao vê-lo. Tem
coisa melhor para um artista? Saber que deixa alguém para cima e de bom humor? É este o
meu objetivo.
JC Você começou pintando no ateliê
de Abelardo da Hora e, naquela época, as mulheres não tinham muito espaço para
trabalhar com arte. Como foi que você enfrentou este preconceito?
GC Um dia, estava passando pela frente
do ateliê de Abelardo, acho que tinha meus 16 anos, e me interessei por aquele clima, já
gostava de desenhar. Eles me aceitaram como aluna. Eu era a garotinha da
turma. Era complicado a mulher se envolver com arte naquela época, mas eu tive
sorte de conviver com pessoas maravilhosas, como Zé Cláudio, Tiago Amorim, Tavares e
José Barbosa. Formamos em 64 o movimento Ribeira. Nos reuníamos sempre para realizar
protestos e aclamar a arte.
JC Qual sua visão neste período de
guerra? Dá para produzir alguma coisa com tantas notícias ruins no mundo?
GC Não, não dá. Sou totalmente
pacifista. Tenho vontade de me isolar em algum paraíso, sem televisão e rádio, só para
não ouvir estas notícias ruins. Sou de uma geração que acreditava que, no século 21,
o homem não seria mais capaz de fazer esses tipos de barbaridades. E esta guerra, por
motivos totalmente gananciosos. Tudo por causa de dinheiro. Para mim, o homem só iria
evoluir se adotasse o sistema de troca. Por mim, o petróleo do mundo inteiro acabaria e
nós andaríamos a pé, vendo de perto as belezas do mundo. Sem esta pressa toda.
(© Jornal do
Commercio-PE) |