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 Telas de Guita Charifker vão a SP e Rio

22/04/2003

 

 

 

A artista plástica Guita Charifker

 

Aquarelista pernambucana que celebra a vida nas suas paisagens expõe na Pinacoteca e no Museu de Belas Artes

JOANA AQUINO

   Neste tempo em que guerra e violência são as manchetes constantes dos jornais mundiais, ver um quadro da artista plástica Guita Charifker é algo reconfortante. A pernambucana, que é uma das aquarelistas mais importantes do País, conquista e encanta com suas pinturas de cores vivas e que transmitem alegria e paz. “Este é meu objetivo”, esclarece. E os encantos da arte de Guita vão estar no eixo Rio-São Paulo a partir do dia 24. A exposição Viva a Vida!, que traz algumas de suas principais obras, é pauta do Museu de Belas Artes, no RJ, e da Pinacoteca, em SP, dois dos principais espaços de arte do Brasil.

   “Em Viva a Vida!, é possível se apreciar parte das obras de Guita nos últimos trinta anos. A exposição permite acompanhar desenhos do início de sua carreira ou, por exemplo, identificar o delicado momento em que ela troca o desenho pela aquarela”, afirma Ronaldo Correia de Brito, curador da mostra.

   A exposição, que já esteve em cartaz no Recife no final de 2001, faz parte de um projeto que inclui um livro sobre a vida e obra da artista. Uma idealização da produtora cultural Carla Valença. Completando 50 anos de ligação com a arte (ela começou em 1953 como aluna do ateliê de Abelardo da Hora), Guita pensa agora em se despedir dos compromissos da vida artística.

   “Com esta exposição devo encerrar a minha carreira. Quero me isolar numa casa de campo e não me preocupar em realizar mostras dos meus trabalhos. Mas, vou continuar pintando, claro”, diz.

   Apesar de já ter vivido muito tempo fora do Estado, inclusive no Rio, a artista faz questão de mostrar que sua origem pernambucana nunca foi abandonada. Entrar no seu ateliê, no Amparo, em Olinda, é como penetrar em sua própria obra. A aquarelista trabalha a natureza e o colorido da Cidade Alta. “Nunca esqueço as minhas raízes, que estarão sempre presentes em meus trabalhos”, afirma.

   Mas, Guita foi buscar longe inspiração para começar a se relacionar com a aquarela. Foi no México, em 1980, que ela começou as suas experimentações com a técnica da aquarela. “Me inspirei no colorido das feiras e das roupas mexicanas”, lembra.

   De lá para cá, ela trabalha o lado positivo do mundo, com intensão de passar sensação de leveza e esperança. “Se estou triste, não pinto. Só trabalho quando estou de bom humor”, revela. “ Da alma do trabalho de Guita emana uma satisfação de vida e isto é transmitido para as pessoas”, comenta Carla Valença.

Serviço

Exposição Viva a Vida!. De 24 de Abril a 25 de maio – Museu Nacional de Belas Artes, RJ. Fone: 0xx21-2240.0068. De 07 de junho à 20 de julho- Pinacoteca, em SP. Fone: 0xx11-229.9844.

(© Jornal do Commercio-PE)

“Já é hora de parar de expor”

JORNAL DO COMMERCIO – Como é estar levando a exposição Viva a Vida! para o Rio de Janeiro, um lugar onde você já morou e já foi tema de suas pinturas?

GUITA CHARIFKER – É bom para mim estar levando este trabalho para o Rio, é emocionante, estou feliz. Eu tenho muito carinho pelas imagens e paisagens do Rio. Já pintei a Urca, Ipanema, a Gávea. Mas, ao mesmo tempo, penso em parar com a minha vida artística depois desta exposição. Outro dia, estava vendo na televisão um grande jogador de beisebol americano encerrando a sua carreira, com um último jogo. Achei tão bonito ele anunciar o fim de seu trabalho ainda jogando. Eu tenho impressão que vou anunciar o fim da minha carreira com este maravilhoso projeto. É uma honra para um artista ver publicado um livro sobre suas obras. Vou começar, a partir de agora, a trabalhar sem me preocupar com exposições. Penso em encerrar com chave de ouro uma carreira que começou há muito tempo.

JC – Pensa em parar de pintar?

GCNão, de jeito nenhum. Não vou parar de pintar. Eu vivo da minha arte, se possível, vou continuar vendendo meus quadros. Só não quero me preocupar com mostras e dar satisfações do que estou fazendo. Quero me isolar em uma casa de campo e começar outra fase do meu trabalho, que não vai ter nada a ver com os meus anteriores. Acho que todo mundo deveria saber a hora de parar, enquanto as coisas ainda estão funcionando bem. Agora queria descobrir um paraíso novo, em um sítio, de preferência, afastado da cidade.

JC – Este seu interesse pela natureza revela-se mesmo em toda a sua obra. Como surgiu a vontade de trabalhar com isso nas suas pinturas?

GCIsto começou no México. Eu ganhei um prêmio e participei de uma bienal interamericana. Era para passar uma semana e eu fiquei seis meses. Eu comecei a fazer aquarela lá, olhando para a natureza, para o colorido das feiras, das roupas mexicanas. Fiquei num sítio e me inspirei para pintar os bichos, as árvores. Me lembro de um imenso pé de serigüela. Eu pintava o que via e faço isso até hoje. Não são coisas que eu invento, não. Se as pessoas olharem direitinho também são capazes de ver as belezas da natureza.

JC – Faz questão, então, de retratar sempre o lado belo e positivo da vida. E quando você está triste? Em nenhum momento o lado negativo da vida se refletiu em seus trabalhos?

GCQuando eu estou triste, não pinto. Vou fazer outra coisa, lavar prato, varrer a casa. A minha arte nunca vai transparecer tristeza. Não é isso que quero passar para as pessoas. O melhor elogio que recebi na minha vida foi de um jornalista, que agora não me lembro o nome. Ele me disse que tinha um quadro meu em seu quarto e todos os dias quando acordava se sentia feliz ao vê-lo. Tem coisa melhor para um artista? Saber que deixa alguém para cima e de bom humor? É este o meu objetivo.

JC – Você começou pintando no ateliê de Abelardo da Hora e, naquela época, as mulheres não tinham muito espaço para trabalhar com arte. Como foi que você enfrentou este preconceito?

GCUm dia, estava passando pela frente do ateliê de Abelardo, acho que tinha meus 16 anos, e me interessei por aquele clima, já gostava de desenhar. Eles me aceitaram como aluna. Eu era a ‘garotinha da turma’. Era complicado a mulher se envolver com arte naquela época, mas eu tive sorte de conviver com pessoas maravilhosas, como Zé Cláudio, Tiago Amorim, Tavares e José Barbosa. Formamos em 64 o movimento Ribeira. Nos reuníamos sempre para realizar protestos e aclamar a arte.

JC – Qual sua visão neste período de guerra? Dá para produzir alguma coisa com tantas notícias ruins no mundo?

GCNão, não dá. Sou totalmente pacifista. Tenho vontade de me isolar em algum paraíso, sem televisão e rádio, só para não ouvir estas notícias ruins. Sou de uma geração que acreditava que, no século 21, o homem não seria mais capaz de fazer esses tipos de barbaridades. E esta guerra, por motivos totalmente gananciosos. Tudo por causa de dinheiro. Para mim, o homem só iria evoluir se adotasse o sistema de troca. Por mim, o petróleo do mundo inteiro acabaria e nós andaríamos a pé, vendo de perto as belezas do mundo. Sem esta pressa toda.

(© Jornal do Commercio-PE)


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