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Cada vez mais gente quer aprender a tocar fole. O mestre Arlindo dos 8
Baixos é um dos que ensina a mágica e não deixa a sanfona morrer Depois de Luiz Gonzaga contribuir para que o forró ficasse conhecido como uma das marcas registradas da cultura pernambucana, a sanfona passou a ser um instrumento bastante procurado por quem queria estudar música. Tanto que hoje, além dos sanfoneiros que vivem exclusivamente da profissão, há muito mais gente interessada em aprender. No Recife, por exemplo, pode-se encontrar desde crianças que já tocam em shows até intelectuais que pesquisam sobre a cultura popular nordestina. O flautista Sérgio Campello interessou-se pela sanfona porque estava buscando elementos para a formação de músicas do grupo que dirige, o SaGrama. “Já trabalhamos com diversos ritmos regionais, mas queríamos utilizar também os relacionados ao ciclo junino. Então comprei uma sanfona e comecei a estudar”, conta. Campello é aluno de Arlindo dos Oito Baixos há pouco mais de um ano e, mesmo sendo considerado um excelente flautista, quando se fala em sanfona ele diz que nada mais é do que um aprendiz. “Não posso dizer que sou um sanfoneiro profissional, ainda estou começando”, argumenta. De acordo com a professora de música Lúcia Couto, na década de 1960 a sanfona passou a ser um instrumento procurado por pessoas de todo o Brasil. Ela afirma que um dos fatores que influenciaram a demanda foi o custo alto do piano. “Era sinônimo de status ter uma moça ou um rapaz na família que tocasse piano, porém a sanfona era mais acessível, bem mais barata, e por isso muita gente começou a se interessar. Isso só começou a mudar poucos anos depois, com a aparição dos Beatles, quando a moda passou a ser a guitarra”, diz a professora. Ela argumenta que há uns dez anos a procura voltou devido à influência do forró universitário. “Hoje há estudantes de nível superior que estudam acordeão comigo. Há também promotores de Justiça, médicos e profissionais de outras áreas, muitos deles têm origem em famílias de interior e aprendem a tocar para cultivar a sua cultura.” Preocupado com a preservação do forró em Pernambuco, o sanfoneiro Arlindo dos Oito Baixos resolveu fundar uma escola onde se ensina a tocar o instrumento. Uma de suas alunas é a própria neta, Daiane Macedo, de apenas seis anos de idade. “Logo quando percebi que Daiane tinha facilidade para aprender música comprei uma sanfona para ela e comecei a ensinar. Com uma semana ela já tinha aprendido a tocar o Parabéns a Você. Eu ensino à minha neta com gosto, pois ela aprende fácil. Sei que vai ser uma grande sanfoneira”, orgulha-se. No entanto, são poucos os espaços em Pernambuco abertos para ensinar sanfona. No Recife já existiram academias de sanfona, como a extinta Miriam Ramalho. Hoje, é mais fácil encontrar professores particulares, como Arlindo dos Oito Baixos e Lúcia Couto, que ensinam em suas residências. Segundo informações da direção do Conservatório Pernambucano de Música, no espaço não há aulas de sanfona por motivos como o tradicionalismo (a instituição é voltada para ensinar instrumentos de música erudita e de orquestra) e a falta de uma formação teórica dos professores de sanfona (para ser professor do local é necessário ter formação de nível superior, o que é raro entre os sanfoneiros). Onde aprender sanfona no Recife: Arlindo dos Oito Baixos – Avenida Hidelbrando Vasconcelos, 2.900, Dois Unidos. Fone: 3443-9147, Lúcia Couto – Rua Joaquim Amaral Cardozo, 157, Rosarinho. Fone:3241-0118 (© JC Online) Oito baixos oferece maior grau de dificuldade para os principiantes É difícil encontrar algum recifense que não tenha ouvido falar em Arlindo dos Oito Baixos. Há mais de 50 anos tocando sanfona, o artista teve seu talento reconhecido em todo o País. No entanto, muita gente, ao vê-lo com uma sanfona menor, sem teclado e com um número resumido de baixos, não imagina quão difícil é conseguir tocar uma música naquele instrumento. Quem conhece as dificuldades da sanfona de oito baixos raramente se dispõem a aprender, pois é necessário muita dedicação.Historiadora e pesquisadora de sanfona de oito baixos, Leda Dias sempre admirou o ritmo forró e freqüentava a casa de Arlindo aos domingos, quando o artista realiza festas em seu quintal. Ao ouvir o comentário de um colega sobre a dificuldade de se tocar o instrumento, Leda Dias ficou curiosa ao ponto de resolver se tornar aprendiz. “É um instrumento que pouca gente toca, principalmente mulheres. Então, tocá-lo foi um desafio”, conta. O músico e também aluno de Arlindo Sérgio Campello é fã incondicional: “É um instrumento rústico, mas de uma riqueza melódica incrível”, salienta, destacando uma modificação feita pelos músicos pernambucanos ao tocá-lo. “O instrumento é europeu, mas os sanfoneiros daqui fazem umas modificações especiais na afinação e isso facilita para que toquemos vários ritmos.” Para o cantor e radizalista Ivan Ferraz, Arlindo dos Oito Baixos é um dos grandes responsáveis pela preservação do instrumento no Nordeste. “O futuro da sanfona de oito baixos está sob a responsabilidade de pessoas como Arlindo”. (© JC Online) No compasso dos oito baixos de Arlindo Mestre de Beberibe, apelido dado por Luiz Gonzaga, tem o talento reconhecido em documentários que reconstituem a trajetória artísticaMARCOS TOLEDO No projeto O Brasil da Sanfona (2003), trabalho belíssimo que conta com um livro organizado por Myriam Taubkin, com fotografias de Angélica del Rey, e ainda um DVD dirigido por Sérgio Roizenblit, Arlindo dos Oito Baixos está entre os destaques, retratado entre os grandes mestres do instrumento no Brasil. Este ano, o talento de Arlindo volta a ser reconhecido em novos documentários. Arlindo dos Oito Baixos: O Mestre de Beberibe, média-metragem de Anselmo Alves e Leda Dias, faz parte de um grande projeto dos autores que pretende resgatar a história desse modelo de sanfona no Nordeste, onde adquiriu características bastante peculiares. O ponto de partida é o documentário sobre Arlindo, cujas gravações começaram em setembro passado. O vídeo deve ser lançado no próximo mês, logo após os festejos juninos, quando será possível reunir todos ou a maioria dos amigos do músico para lhe prestar uma grande homenagem. O documentário de Anselmo e Leda resgata toda a história do mestre pernambucano dos oito baixos, visitando, em cada locação, um ambiente de um momento importante na vida do sanfoneiro. Desde o município de Sirinhaém, onde ele nasceu e passou boa parte da infância, passando pela casa de farinha próxima à Usina Bom Jesus, no Cabo de Santo Agostinho, onde Arlindo reencontra os amigos sanfoneiros Zequinha Aleixo e Antônio Aleixo, a localidade de Ponte dos Carvalhos, também no Cabo, onde mora sua mãe, hoje com 90 anos, e sua própria casa, na qual criou o espaço Forró de Arlindo dos Oito Baixos, no bairro recifense de Dois Unidos. O vídeo mostra também o músico visitando lugares onde costuma (ou costumava) se apresentar, como o Clube das Pás, Pátio de São Pedro, Espaço Identidade Cultural, todos no Recife. Fora do Estado, ele reencontra outros mestres do instrumento, como Geraldo Correia, em Campina Grande (PB), e Zé Calixto e Luizinho Calixto, que vive em Fortaleza, mas cumpria temporada no Forró da Lua, espaço dedicado ao ritmo nordestino, localizado no município de São José do Mipibu (RN). A produção pretende realizar ainda mais mais um grande encontro, entre Arlindo e seu mestre Manoel Elias, de 91 anos de idade, que reside atualmente no Rio de Janeiro. (© JC Online) Genialidade da alma nada tem a ver com erudição Arlindo dos Oito Baixos que, antes de se dedicar apenas à sanfona exerceu diversas atividades, revela-se no documentário O Mestre de Beberibe (o título é como Luiz Gonzaga se referia ao amigo, que afinou suas sanfonas por duas décadas) um apaixonado pelo cinema. O músico, que perdeu a visão em 1997, possuiu projetores e filmes em 16 mm e diz que seu grande desejo é voltar a ver e montar um cinema, o Cine Vida Nova.“Arlindo foi dizendo como queria que fosse feito o vídeo”, conta o diretor Anselmo Alves. “Ele viu tanto filme e é tão apaixonado por cinema que ele mesmo foi conduzindo o documentário.” O trabalho, contudo, mantém a estrutura determinada por seus realizadores, introduzindo o espectador no instrumento, mostrando a relação com Gonzagão e como funciona seu espaço cultural, e abordando a cegueira do artista e sua volta por cima. “Todos os grandes mestres dizem que Arlindo toca melhor agora. Ele diz que preferia tocar menos e poder ver”, diz o videasta. Anselmo Alves destaca ainda que Arlindo é hoje mais que um músico consagrado. Além de virtuose e afinador, é professor e administrador de um lugar que o diretor define como “uma resistência cultural”. “Não há lugar mais autêntico”, diz. E, tudo isso, sem formação acadêmica. “A genialidade da alma não tem nada a ver com erudição”, acredita a historiadora e curadora do projeto Leda Dias. Ao todo, os realizadores contam com 35 horas de gravação em digital. A meta é gravar 40 horas de material até a edição. O documentário, entretanto, é o núcleo de um projeto maior sobre oito baixos. Sobre sanfona, os produtores já possuem 70 horas de gravação e um acervo de 110 álbuns de 34 sanfoneiros de oito baixos. O próximo vídeo a ser finalizado é Chiquinha do Acordeon: Uma Mulher no Coração do Forró. EXPERIMENTAL – Arlindo dos Oito Baixos é tema de outro documentário recém-finalizado. O projeto experimental dos jornalistas Marcos Lisbôa, Amanda Tavares e Vanessa Montenegro, Arlindo: O Mestre dos Oito Baixos, traz depoimentos de nomes importantes da músicas local sobre a importância do mestre para a cultura brasileira. Além de entrevistas com Leda Dias e os músicos Sérgio Campelo, Xico Bizerra, Ivan Ferraz, Petrúcio Amorim e Santanna, mostra Arlindo ensinando o toque da sanfona a sua neta, Daiane, e, em plena capital, no quintal de sua casa, promovendo o forró ao melhor estilo do interior. (© JC Online) |
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