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 Brennand expõe desenhos sobre mulheres em SP

 

 

Danilo Verpa/Folha Imagem

"A Feiticeira', trabalho sobre papel de 1979 de Francisco Brennand, integra a mostra do artista
 

Um dos maiores escultores do país, pernambucano exibe traço mais livre e admite a influência da idade sobre essa mudança

"Firmeza já não é mais a mesma", diz o artista de 80 anos, conhecido por suas cerâmicas e esculturas de grande carga erótica

SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL

Um ovo de cerâmica está pendurado no teto do ateliê de Francisco Brennand, em Recife. Centenas dos mesmos ovos estão espalhados pela propriedade. "Ali está a origem de tudo", diz o artista pernambucano, que fez do nu feminino e da reprodução humana motes centrais de sua produção.

Em São Paulo para a abertura ao público, hoje, de uma mostra com 59 desenhos e quatro esculturas, Brennand recebeu a reportagem da Folha segurando nas mãos um livro sobre Gustave Courbet, o realista francês que pintou "A Origem do Mundo" -retrato despudorado de uma vagina.

"Mesmo Courbet tinha vontades surrealistas, tons fantásticos", afirma, aproximando a obra dura do francês dos desenhos de sua produção recente, de um traço mais livre.

Tido como um dos maiores escultores vivos do país, Brennand, agora com 80 anos, admite que a idade tem a ver com a mudança estética que propõe nesses novos desenhos.

"A firmeza no traço já não é a mesma. A silhueta das coisas começa a escapar, e eu faço cada vez mais pressão sobre o papel", conta o artista, que se apóia numa bengala ao caminhar, movimentando-se com dificuldade.

No lugar das cerâmicas e esculturas de carga erótica que o tornaram conhecido, Brennand mostra na Caixa Cultural Paulista uma série de aquarelas e desenhos a lápis e nanquim -quase todos retratando mulheres, algumas recatadas, como "Cretense" (2006), e ninfetas nuas, como "A Modelo" (2000) e "O Beco" (2002).

Nas duas últimas, o pintor retrata jovens voluptuosas, de curvas mais generosas que o padrão atual de beleza. "Não se trata de uma mulher, é o grande mistério da humanidade, a matriz da reprodução", diz Brennand. "É a nudez valorizada. Elas precisam de formas amplas, não são manequins, cabides para mostrar roupas."

A sensualidade transbordante de suas musas aparece ao lado de figuras mais austeras em outros desenhos. Uma mulher de manto negro, personificação da morte, abraça uma jovem, com a pele à mostra, em "A Morte e a Donzela" (2002).

"O sexo nos deixa mais perplexos do que a morte", diz o artista, que ainda faz brigar as pulsões -reprodução e extinção- em seus desenhos e esculturas.

FRANCISCO BRENNAND
Quando:
de ter. a sáb., das 9h às 21h; dom., das 10h às 21h; até 25/5
Onde: Caixa Cultural - galeria Paulista (av. Paulista, 2.083, tel. 3321-4400)
Quanto: entrada franca

(© Folha de S. Paulo)


Brennand e seu templo de mito e erotismo construído no Brasil

RECIFE (AFP) — Um universo mítico de marcado erotismo e milhares de esculturas compõem o estúdio-museu construído pelo escultor, pintor e ceramista brasileiro Francisco Brennand durante as últimas quatro décadas no Recife.

"Este não é um cetro, é uma bengala que preciso para andar", apresenta-se com simpatia Francisco Brennand. Acomodado em uma poltrona no centro de seu templo-museu, parece mais um rei, um Netuno dos mares, com sua barba branca, ávidos olhos risonhos e um sorriso esplêndido.

Brennand, de 80 anos, dedicou quase a metade de sua vida construindo este imenso estúdio de esculturas em cerâmica que ele chama sua "Oficina", onde continua trabalhando ativamente e que surgiu das ruínas da velha olaria que pertenceu a seu pai.

Uma frase do filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein gravada em um dos seus jardins dá a idéia da magnitude: "a arquitetura imortaliza e glorifica, por isso não pode haver arquitetura na qual não haja nada para glorificar".

O universo mítico das esculturas que povoam os galpões e os jardins está repleto de figuras eróticas e falos, alegorias religiosas, formas totêmicas quase aborígines e bestas surgindo à vida a partir de extraordinários ovos.

"Minha preocupação é a reprodução: a vida é eterna porque reproduz, e não pode haver reprodução sem sexualidade", explica Brennand.

"Aqui existe uma sexualidade sem pudores, que tem ao mesmo tempo algo de primitivo e ao mesmo tempo cruel e inevitável", afirmou o curador Olivio Tavares de Araújo.

Brennand se lançou no mundo da cerâmica em uma viagem à Europa. O artista chegou a Paris em 1949, interessado por pintura e com "sérios preconceitos contra a cerâmica", material que seu pai usava para fazer azulejos e telhas.

Quando se deparou com os trabalhos de Pablo Picasso, de Joan Mirò, de Paul Gauguin e do arquiteto de Barcelona Antoni Gaudí, mudou de opinião. "Me senti encantado e humilhado, porque percebi que perdi os melhores anos da minha vida para fazer cerâmica".

Em 1971 decidiu instalar sua oficina na olaria em ruínas fundada em 1917 por seu pai. "Vi o espaço como um território livre" onde poderia desenvolver sua arte, explica.

As ruínas continuam ali, mas sobre elas surgiu um templo, e não destruir essas ruínas significa preservar sua infância que floresceu feliz nesse espaço.

As paredes de seus imensos galpões foram revestidas com um azulejo "da cor do tempo". São todos marrons e dourados, com uma tonalidade que muda de acordo com a luz do dia, proporcionando um efeito visual que "somente o tempo e o fogo conseguem emitir", conta apaixonado.

Mais de duas mil esculturas ocupam o lugar. "Tive que criá-las para preencher esses espaços imensos, não tinha como encher o galpão de murais", brinca Brennand.

Seu interesse se voltou para a forma e a matéria. A coloração parece muitas vezes uma insinuação, "existe e foi devorada pelo magenta" dos fornos, explica o ceramista - um caso curioso para o artista que começou a carreira pintando.

"A cerâmica me fez desconfiar das cores", revela.

Brennand passou os primeiros anos trabalhando sozinho. Deixou as finanças nas mãos de seu genro economista e o projeto se tornou viável produzindo azulejos semi-artesanais nos mesmos fornos nos quais o artista preparava suas maravilhosas esculturas.

Hoje em dia, aproximadamente quatro mil pessoas o visitam por mês e 100 operários trabalham no local, muitos são artesãos que produzem decorações baseadas nos trabalhos de Brennand.

Suas esculturas atualmente decoram espaços importantes no Brasil, onde é considerado um grande escultor e ceramista, e já percorreram cidades da Europa e dos Estados Unidos. Neste sábado inaugura exposição em São Paulo (na Caixa Cultural) e no segundo semestre inaugura outra mostra itinerante nas grandes capitais do país.

(© AFP-Google)

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