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Tragédia nordestina sob a ótica crua de atores de Mossoró

13/06/2008

 

 

Foto: Divulgação

 

Dirigida por Marcelo Flecha, a Cia. A Máscara retrata de forma seca a dor sertaneja na peça Deus Danado, de João Denys

Beth Néspoli

''Uma estética sem temperos ou preparos excessivos que cozinhem o ator deixando-o pronto para a degustação. Encenação indigerível, não degustável para aqueles que perderam o contato com o inigualável sabor do cru. Arte vendida em lata tem data de validade. Vence. Apodrece. A encenação pronta para o consumo padece.'' Esse é um trecho do ''manifesto danado'' lançado pelo diretor Marcelo Flecha em Mossoró (RN) na estréia de Deus Danado, que inicia temporada amanhã no Sesc da Avenida Paulista.

Argentino radicado na cidade de São Luís, no Maranhão, Flecha é diretor especialmente convidado pelos quatro atores da Cia. Máscara de Teatro com o objetivo de aprimorar o trabalho do grupo fundado em 1999, em Mossoró. Com eles, encenou Medéia, Um Fragmento e, no fim do ano passado, Deus Danado, peça de João Denys - professor da Universidade Federal de Pernambuco. No palco, os atores se revezam atuando em dias alternados para retratar a existência de dois homens - interpretados por Tony Silva e Damásio Costa ou por Luciana Duarte e Jeyzon Leonardo - que passam seus dias cavando a terra, no árido sertão nordestino, em busca de uma mítica botija que lhes trará riqueza.

''Com esse trabalho damos continuidade à pesquisa que o grupo desenvolve com Flecha, centrada na busca da palavra bem dita e de um trabalho físico que expresse o máximo com o mínimo'', diz Tony Silva. ''A grande questão do texto é como lidar com a falta, a ausência, a carestia no sertão nordestino'', afirma Flecha. O diretor enfatiza que a montagem se realiza na chave ''existencial'' e busca fugir da visão estereotipada da tragédia nordestina tratada muitas vezes de forma glamourosa ou cômica. ''É profundamente doloroso não ter água ou comida e essa vivência tentamos tratar na sua essência, sem efeitos, sem enfeites para tornar degustável para o público. Meu trabalho com os atores é eliminar muletas para buscar a expressão visceral, porém seca, crua.''

Com 250 mil habitantes, situada a 277 km de Natal, Mossoró tem movimento teatral singular. A cidade realiza três grandes espetáculos anuais ao ar livre, entre eles o Auto da Liberdade - narrativa de feitos locais como a abolição dos escravos antes da Lei Áurea - já dirigido por Amir Haddad, Gabriel Villela, Fernando Bicudo, Marcelino Freire e Marcelo Flecha. Daí o convite para dirigir a Cia. Máscara, o que só foi possível graças ao apoio do Prêmio Fomento, da prefeitura, que se assemelha ao Programa Municipal de Fomento ao Teatro de São Paulo. ''Por que a iniciativa privada apoiaria um trabalho que leva tempo para fazer e poucos vêem? Mais fácil investir num show de forró feito em três dias que chama atenção da imprensa. Pensar a longo prazo tem de ser papel do poder público.''

(© Estadão)


Festival de Teatro traz Deus danado ao Recife

A realidade do homem nordestino que convive com a seca, a fome e o descaso público será encenada no espetáculo Deus danado, nesta quinta e sexta-feira (12 e 13), às 20h, no Teatro do Armazém 14. A peça, que integra o Festival de Teatro Brasileiro (FTB) – Cena Baiana, etapa Pernambuco, tem texto do professor do Departamento de Teoria da Arte e Expressão Artística da UFPE, João Denys, e direção da arte-educadora baiana, Alda Valéria.

Deus danado
dá destaque ao homem sertanejo que migra para a cidade grande em busca de sobrevivência, sonhando com um dia voltar e sobreviver de forma digna na terra natal. Vencedor de 13 prêmios em diversas categorias de festivais nacionais, o espetáculo é bastante influenciado pelo gesto (corpo-voz), imagem e sensações, sendo rico de simbolismo e metáforas. A peça faz parte da tetralogia do Seridó, que inclui A Pedra do Navio, Flores D'américa e Os Pés Feridos D'américa.

SERVIÇO:
Deus danado
Quinta e sexta-feira (12 e 13), às 20h, no Teatro Armazém

Ingressos: R$ 5 (meia) e R$ 10 (inteira)
Censura: maiores de 12 anos
Tempo de duração – 70 minutos
Telefone: (81) 3082.4871

(© JC Online)

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