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E nada aconteceu

11/04/2009

 

 

Foto: Divulgação
GUITARRA, BAIXO E BATERIA
Pedro Sá, Caetano Veloso, Marcelo Callado e Ricardo Gomes: banda afiada, ele é o elo frágil

Em Zii e Zie, de Caetano Veloso, a ideia de dar ao samba um acento rock é boa, mas todo o resto falha

Na última nota, Caetano Veloso estraga uma das melhores músicas de seu novo disco, Zii e Zie. Até ali, sua recriação de Incompatibilidade de Gênios, um samba já clássico de João Bosco e Aldir Blanc, é antológica e ilustra à perfeição o método do disco: transpor as batidas do samba para a guitarra elétrica, acompanhada, à moda roqueira, por baixo e bateria. Enquanto os três instrumentos dão um toque arrevesado ao samba – a guitarra, a certa altura, se distorce –, Caetano vai cantando de maneira grave a letra sobre um sujeito maltratado por sua mulher ("Um cisco no olho, ela em vez de assoprar/Sem dó/Falou que por ela eu podia cegar").

Mas, no instante final, em vez de trazer a melodia para baixo, como fazia até ali, ele afina a voz, sobe o tom e quase dá para imaginá-lo num pulinho com as mãos na cintura quando canta: "Quero me separar". Isso é Caetano fazendo graça, acrescentando uma ironia extra à canção. Não funciona. E esse é o problema do disco: ele tem uma ideia musical clara – "tratar levadas de samba com um timbre elétrico forte", como já disse o cantor –, bem executada pelos jovens músicos Pedro Sá, Marcelo Callado e Ricardo Dias Gomes, mas o que há em volta, das letras ao canto, é fraco. Estranhamente, Caetano é o elo frágil em seu próprio disco.

Caetano Veloso nunca transbordou emoção. Sempre foi, vá lá, uma figura "cerebral" na música popular. Quando faz a diferença – quer para aqueles que o idolatram, quer para aqueles que o acham insuportável –, é por causa das letras superelaboradas, da busca da polêmica. Zii e Zie (Tios e Tias, em italiano) deixa a dever nos dois quesitos. Descontadas bobagens como Tarado Ni Você, até as letras mais ambiciosas têm uns poeticismos meio duvidosos, na linha "a explosão de eu saber quem eu sou".

O comentário político de Guantánamo é canhestro ("O fato de os americanos desrespeitarem os direitos humanos em solo cubano é por demais forte simbolicamente para eu não me abalar"). E, ao contrário de um CD como Noites do Norte, que falava de negros e escravidão, falta ao disco um tema central. Duas músicas, Perdeu e Falso Leblon, chegam a desenhar um comentário sobre as drogas no Rio de Janeiro, do ponto de vista do morro e da Zona Sul, mas isso não basta. Da primeira, a melhor letra do disco, vem uma frase que define o impacto de Zii e Zie na discografia de Caetano Veloso: "O sol se pôs depois nasceu e nada aconteceu".

(© VEJA)


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