Sepultado o cantor e compositor maranhense Antônio Vieira
13/04/2009
Foto: Imirante
O compositor maranhense Antonio Vieira, que
morreu vítima de AVC
Muita emoção. Esse foi o clima que marcou o enterro do cantor e
compositor maranhense Antônio Vieira. Muitos nomes da música maranhense
estiveram presentes no cemitério do Gavião, na Madre Deus, para homenagear
"o mestre", como era conhecido Seu Vieira.
O artista morreu por volta das 7h30 desta terça-feira, 7, vítima de
falência múltipla dos órgãos, ocasionada por um acidente vascular cerebral
(AVC). Ele estava internado desde a madrugada da última quinta-feira, 2, no
Hospital UDI/Jaracati.
Nascido em São Luís, em 9 de maio de 1920, Antônio Vieira foi criado por
um parente próximo da família, tendo, em sua infância, a oportunidade de
estudar e concluir seus estudos, coisa rara para um menino negro da época.
Formado em ciências contábeis, Vieira entrou no Exército, chegando ao posto
de sargento. Antes disso, havia tentado a vida como comerciante. Em meio a
essas atividades, compunha sambas. Sua primeira música foi “Mulata bonita”,
composta aos 16 anos.
Vieira compôs mais de 400 canções (a maioria inspirada em ditos populares),
mas seu primeiro disco só foi apresentado em 1986 (“Os Pregoeiros”, com
músicas dele e de Lopes Bogéa).
Em 1997, a cantora maranhense Rita Ribeiro, até então desconhecida, decidiu
gravar duas músicas do “mestre”: “Tem quem queira” e “Cocada” – esta última
foi indicada ao Prêmio Sharp 98 de Melhor Canção. Com este trabalho, Rita
Ribeiro alcançou projeção nacional.
Depois, vieram os CDs “O samba é bom”, produzido por Zeca Baleiro, e
“Antoniologia Vieira”, produzido por Adelino Valente.
Em 2004, os sucessos “Tem quem Queira” e “Banho Cheiroso” fizeram parte da
trilha sonora da novela “Da cor do pecado”, da Rede Globo, que teve trechos
rodados em São Luís do Maranhão e que apresentou pela primeira vez na Globo
uma protagonista negra, papel desempenhado pela atriz Taís Araújo. (Da
Redação do JP)
O cantor e compositor Antônio Vieira morreu
vítima de um acidente vascular cerebral (AVC)
Histórico
Antonio Vieira nasceu em
9 de maio de 1920, na rua de São João, em São Luís do Maranhão. O filho de
dona Maria cresceu próximo ao Mercado Central, local de efervescências
sociais e culturais, com seus muitos personagens. Era a gente do povo.
Naquela época, quando nem se sonhava com supermercados, a cidade borbulhava
de vendedores típicos ambulantes, os chamados pregoeiros, que vendiam (ou
compravam) de tudo de porta em porta, anunciando-se com seus pregões
cantados e bem-humorados, que tanto fascinavam o menino. Tudo isso, e a paz
de uma cidade ainda civilizada,ficou para sempre gravado na memória de Seu
Vieira.
Começou a se interessar
por música e a compor muito jovem. Ainda menino, prometeu à sua segunda
mãe:"minha madrinha, quando eu souber escrever, eu vou fazer o poema para o
azul, a cor que eu mais gosto". Aos 16 anos fez sua primeira música, com o
entusiástico título de "Mulata Bonita", um samba cadenciado e bem moderno
para a época. Mais tarde compôs o "Poema Para o Azul", cumprindo a promessa
de menino. Para compor, Vieira usa sua marca registrada, a simplicidade. Ao
longo de sua extensa carreira, a sua principal fonte de inspiração tem sido
a vida do homem comum, da gente das ruas, o amor e o sofrimento das pessoas
simples.
O Samba é Bom
O CD "O Samba é Bom" do
cantor e compositor Antônio Vieira é o primeiro disco solo de sua carreira.
Aos 89 anos, Mestre Vieira foi representante de uma geração de músicos
maranhenses da qual se tem pouco registro. Gravado ao vivo nos dias 19 e 20
de janeiro de 2001 no Teatro Arthur Azevedo em São Luís, o disco tem
participações de Elza Soares, Sivuca e Rita Ribeiro, além de seu produtor e
idealizador Zeca Baleiro. A canção "Cocada", também gravada no cd "Rita
Ribeiro" de 97, valeu ao autor uma indicação ao Prêmio Sharp na categoria
"Melhor Canção". Com um acervo de mais de trezentas composições - entre
sambas, valsas, boleros e ritmos regionais, como baralho e carimbó
maranhense - seu trabalho permaneceu praticamente desconhecido do grande
público, a exemplo de outros grandes artistas brasileiros, como Cartola,
Nelson Cavaquinho, Nelson Sargento, Clementina de Jesus e Batatinha, que só
tiveram suas obras reconhecidas tardiamente, e hoje fazem parte da história
musical do país.
Os gritos dos vendedores ambulantes de São Luís (MA) tanto fascinavam
Antônio Vieira que ele resolveu gravá-los num disco, com o amigo Lopes
Bogea, na década de 1980. A obra foi chamada de "Pregões de São Luís".
São bordões de vendedores de cocada,
sorvete e outros produtos tradicionais do Nordeste que ele colecionava na
memória desde pequeno.
Nascido na capital maranhense, Vieira nunca
morou em outro lugar. Fincou raiz, tal qual escreveu em "Cocada", música
gravada em 1997 pela cantora Rita Ribeiro: "Ai, meu Deus, se eu pudesse eu
abria um buraco/ Metia os pés dentro, criava raiz". No ano seguinte, a
música foi indicada ao Prêmio Sharp.
Compositor de mais de 400 músicas, segundo
o amigo Manoel Rubim, só veio a ganhar dinheiro com a arte nos últimos 20
anos, quando teve canções gravadas por nomes famosos. Seu sustento era como
contador.
Além de Rita, as letras de Vieira também
ganharam vida nas vozes de Elza Soares e Zeca Baleiro, entre outros. Em
2007, sua composição "Tem Quem Queira" foi tema da novela "Da Cor do
Pecado", da Rede Globo.
Em 2003, toda sua obra foi lançada em 17
CDs. Ele compunha desde os 16, lançando mão de temas regionais ou cotidianos
em ritmos como samba, carimbó e baralho.
Deixou de fazer músicas após um AVC
(acidente vascular cerebral). Morreu na última terça. "Solteiro convicto",
não deixa filhos.
Compositor, que morreu dia 7, teve
reconhecimento tardio
Lauro Lisboa Garcia
Faz uma semana que morreu o veterano
compositor maranhense Antonio Vieira. Infelizmente, a notícia passou
meio batida nos meios de comunicação. Ironicamente, o reconhecimento
tardio faz parte de sua história. Mestre Vieira só ganhou notoriedade
fora do Maranhão quando teve uma deliciosa canção gravada pela
conterrânea Rita Ribeiro em seu álbum de estreia, de 1997. A graça, a
sensualidade e o magnetismo de Cocada a fizeram um clássico de seu
repertório. Outras faixas seguiam na mesma linha, Tem Quem Queira e
Banho Cheiroso, esta incluída por Rita em seu segundo CD, Pérolas aos
Povos.
E pérolas nunca faltaram no cancioneiro de Vieira, um sambista que teve
discos lançados de forma independente. Rita e o também maranhense Zeca
Baleiro foram os grandes responsáveis por promover a música de mestre
Vieira, também conhecido como o Cartola do Maranhão. Zeca produziu o
álbum O Samba É Bom, gravado ao vivo num teatro de São Luís, com honras
de gala, quando Vieira fez 80 anos, em 2001. Sivuca, Elza Soares
entraram como convidados, além de Rita e Zeca.
Em 2004, Vieira participou de um projeto de samba no Sesc Vila Mariana,
dividindo o palco com outro veterano, o baiano Riachão. Na ocasião, o
Estado reuniu os dois para um bate-papo sobre música, sobre sua
trajetória e outros assuntos. Sempre sereno, Vieira fez comentários do
tipo: "O pobre quer ser rico, o rico quer ser nobre, o nobre quer ser
artista, o artista quer ser Deus. Depois de Deus, só pode ser artista."
Criado por uma família tradicional, Vieira mostrou-se na entrevista um
homem reservado, comedido, o oposto do fogueteiro Riachão. Sua formação
musical começou com Chopin, depois vieram os grandes cantores
brasileiros. Sereno, mas provocador, Vieira fez críticas que os polianas
da MPB atual não ousariam: "Na minha época não tínhamos esse aparato
tecnológico de hoje. Mas, pelo menos na minha terra, noto que os antigos
tinham mais talento que os novos", desafiou.
"Uma vez ouvi Djavan cantando Correnteza e minha sobrinha me disse que a
música era dele. Não podia ser, ele não tem qualidade musical para fazer
uma coisa dessas. Fui pesquisar e descobri que era de Tom Jobim e Luiz
Bonfá." E recomendou que os jovens cantores pegassem a discoteca antiga
e fossem analisar Donga, Pixinguinha, Noel Rosa, Assis Valente, Dorival
Caymmi, Ary Barroso, Vadico. "Aí iriam ver que estão longe dessa gente."
Mestre Vieira sabia o que era bom e dava aulas de cultura maranhense.
Deixou mais de 300 canções. Seu legado merece ser amplamente explorado.