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Trama cinza no sol de Búzios em Cannes

26/04/2009

 

 

O diretor pernambucano Heitor Dhalia

Heitor Dhalia celebra seleção para Un Certain Regard e diz que filme estrelado por Cassel fecha ciclo

O pernambucano (radicado em São Paulo) Heitor Dhalia considera que a exibição de À deriva, seu terceiro longa-metragem, na mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes, fecha um ciclo e dá início a um outro, totalmente novo. O filme, nascido de uma parceria entre a brasileira O2, de Fernando Meirelles (Cidade de Deus), e a Focus Features inglesa, é a primeira co-produção internacional assinada pelo diretor de O cheiro do ralo (2006).

– Há dois anos estive em Cannes vendendo o projeto do filme a investidores estrangeiros. Agora, vou aproveitar a estreia mundial dele no festival para anunciar novas parcerias internacionais – avisa o cineasta de 39 anos, que estreou na direção de longas com o sombrio Nina (2004). – À deriva coroa um momento de crescimento que busco há tempos. Estou pegando uma onda que vai apontar um novo começo na minha carreira lá em Cannes.

Filme mais solar

À deriva foi rodado nos arredores de Búzios, na Região dos Lagos. Conta a história de Filipa (Laura Neiva), adolescente que passa as férias de verão com a família em uma casa de praia. Escrito pelo próprio Dhalia, a trama descreve um rito de passagem de uma jovem à sombra da iminente separação dos pais, o escritor Mathias (vivido pelo ator francês Vincent Cassel, de Senhores do crime), e a professora Clarice (Deborah Bloch). É o filme mais solar do diretor, que costumava perseguir personagens e ambientes melancólicos.

– Por incrível que possa parecer, considero esse meu filme mais pessoal. O enredo tem mais a ver comigo, está carregado de traços autobiográficos muito fortes, a infância à beira-mar, a deterioração do casamento dos meus pais. À deriva diverge dos meus outros trabalhos, não tem nada de sombrio, mas é o meu filme mais maduro.

Isso não significa, no entanto, uma mudança de rota radical na filmografia do diretor

– Se você pegar o protagonista, perceberá que ele é uma figura deslocada, em desacordo com o entorno, o que é uma característica comum a todos os meus filmes. Todos eles são centrados em figuras solitárias, em desarmonia com um mundo à volta – explica. – À deriva é apenas mais maduro, mais delicado, com uma mão bem mais leve.

Vincent Cassel foi o primeiro a ligar para Dhalia, no início da manhã de ontem, para dividir com o diretor a satisfação de ver À deriva na programação oficial do festival. A lista de Cannes ainda pode ser acrescida de mais títulos nos próximos dias. Ano passado, quando voltou ao Brasil como padrinho do Panorama do Cinema Francês, o ator demonstrou grande entusiasmo com sua estreia no cinema brasileiro. Matias é personagem atípico na carreira de Cassel, mais lembrado pelos tipos sagazes, dinâmicos e truculentos que interpretou ao longo dos anos, como no violento Irresistível.

– Ele é um homem fraco, como muitos outros que existem por aí. A história é contada do ponto de vista da filha do casal, que oferece uma visão nostálgica e romântica da situação – contou Cassel.

Dhalia não é um diretor estranho no circuito dos festivais. Nina, seu primeiro longa, ganhou menção especial da crítica russa no Festival de Moscou e o prêmio de Fotografia no Festival de Cinema Latino-Americano de Lima (Peru). O cheiro do ralo, produção independente que custou cerca de R$ 300 mil inspirada no livro homônimo de Lourenço Mutarelli, participou da seleção oficial do Festival de Sundance, ganhou o prêmio Especial do Júri, o da Crítica e o troféu Redentor de Melhor Ator (Selton Mello) no Festival do Rio e o troféu Bandeira Paulista do júri internacional na 30ª Mostra Internacional de São Paulo.

– O cheiro do ralo também me abriu as portas nos Estados Unidos, onde agora tenho representação. À deriva seguiu esse caminho da internacionalização. Estou estudando muito dramaturgia, desenvolvendo roteiros mais fortes, e isso me proporcionou associações muito boas lá fora – acredita o diretor. (Carlos Helí de Almeida)

(© JB Online)


Crítica/"Coutinho.Doc - Apartamento 608"

Documentário expõe processo criativo de Eduardo Coutinho

Produção acompanha o cineasta em "Edifício Master", que ele cogitou cancelar

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

O DVD duplo de "Edifício Master" (2002), que traz comentários de Eduardo Coutinho e entrevistas de pré-seleção, já permitia que se vislumbrasse o processo de trabalho do cineasta, ainda mais exposto em "Coutinho.Doc - Apartamento 608", de Beth Formaggini, que estreia hoje, às 21h, no programa "É Tudo Verdade", do Canal Brasil.

O apartamento do título era o quartel-general da produção no Master, em Copacabana, com seus 12 andares de quitinetes e conjugados. Coutinho diz que buscava a "alma" do edifício.

Trocava, assim, favelados -personagens de seus filmes anteriores, "Santo Forte" e "Babilônia 2000", ambos de 1999- pela classe média baixa. Trocava e, no início do trabalho, não gostava. Na favela, "você chega e é aquela coisa maravilhosa" - os moradores falam sem subterfúgios. Em Copacabana, porém, ele cogitou, com base nas entrevistas preparatórias, a inviabilidade de fazer o documentário que queria.

"Um troço brochante, sabe? Difícil. Não [se] pode fazer um filme medíocre sobre mediocridade", explica para a equipe. "Queria que houvesse mais invenção, mais mentira." Seu desalento é tamanho que alguém da produção procura tranquilizá-lo: "Se você acha que não tem filme, para tudo".

Houve filme, e "Apartamento 608" ajuda a entender como, graças à presença de Formaggini em reuniões da equipe e, já iniciadas as filmagens, nas entrevistas com moradores que, agora, arrancavam de Coutinho expressões de satisfação.

"Não sei se vai ter o filme que eu quero. Vai ter o filme que deu para fazer", reavalia o cineasta à medida que "invenção" e "mentira" também começavam a aparecer. "Eu não gosto das pessoas em geral, não me interesso. Quero uma hora com elas, não a vida inteira."

Atores

Conseguiu entre 25 e 30 dessas horas em torno do que é "crucial" na vida dos moradores, e delas extraiu os 110 minutos de "Master". A certa altura, alguém da equipe propõe a ele que, da próxima vez, faça algo bem diferente. "Já pensou, você com atores?", diz. "Eu adoraria", responde Coutinho - que atenderia à sugestão em "Jogo de Cena" (2007) e "Moscou" (2009).

COUTINHO.DOC - APARTAMENTO 608

Quando: hoje, às 21h, e amanhã, às 14h
Onde: Canal Brasil
Classificação indicativa: não informada
Avaliação: bom


SITE

EDUARDO COUTINHO

 

VÍDEO

Bate-papo Heitor Dhalia 1/9_Oficina Tela Brasil

 

 

 

Com relação a este tema, saiba mais (arquivo NordesteWeb)


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