Fotos: Pierre
Verger/Divulgação
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Vitalino tinha 37 anos quando foi fotografado por Verger, antes
de ser reconhecido na década de 1950
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Mostra com 140 fotos do Mestre Vitalino, feitas pelo francês Pierre
Verger em 1947, entra em cartazJúlio Cavani //
Diario
Ao retratar a arte do Mestre Vitalino com imagens em preto & branco, o
fotógrafo Pierre Verger faz o barro se confundir tanto com as texturas da
pele do escultor quanto com a terra de onde ele retira a matéria-prima usada
na modelagem, em uma comunhão de tons que traduz as relações do homem com a
natureza e os sentidos culturais e sociais expressos pela tradição das
esculturas de cerâmica de Caruaru.
O Instituto Cultural Banco Real inicia uma exposição que apresenta ao
público 140 fotos, a maioria inéditas, resultantes do encontro entre os dois
artistas.
Foi em 1947 que Pierre Verger (1902-1996) encontrou Vitalino Pereira dos
Santos (1909-1963), que ainda não era famoso na época e vivia na
informalidade no Alto do Moura, onde produzia as peças junto com seus filhos
para vender na Feira de Caruaru. O fotógrafo francês havia acabado de chegar
no Brasil e passou seis meses em Pernambuco.
"Vitalino tinha 37 anos em 1947 e só começou a ser reconhecido na década de
1950. O olhar especial de Verger o identificou antes", informa o antropólogo
Raul Lody, curador da exposição. Segundo o pesquisador, as fotos formam uma
"grade etnotecnológica", pois retratam detalhes de cada passo do processo de
produção dos bonecos e animais de barro. Além de ser carregada de
expressividade plástica e estética, a série preserva a descrição visual dos
procedimentos de extração do barro, a modelagem das figuras, a pintura delas
e a comercialização na feira.
Um conjunto de fotos distribuídas em uma mesma parede promove uma espécie de
catalogação dos temas clássicos de Vitalino, onde podem ser identificados
verdadeiros ícones do imaginário nordestino dos bonecos de barro, como os
bois e vacas, os cangaceiros, a ciranda, os músicos populares, os próprios
artesãos do barro, o caçador que sobe em uma árvore para atirar em uma onça
e outros hábitos e rituais do cotidiano. O escultor também demonstra um
desapego em relação ao preservacionismo folclórico ao reproduzir também a
presença de elementos modernos em seu meio, como uma motocicleta pilotada
por um senhor de chapéu e gravata. "Ele era um repórter de sua realidade",
considera Lody.
A exposição tem uma cenografia formada por detalhes em argila e exibe ainda
vídeos formados por filmes antigos que registraram a feira de Caruaru e o
próprio Mestre Vitalino em movimento, filmados em super 8 por cineastas como
Fernando Spencer. Na trilha sonora da sala, o público ouve músicas tocadas
pelo próprio Vitalino, que integrava a banda de pífanos Zabumba do Mestre
Vicente, gravada na década de 1950 pelo musicólogo Aloysio de Alencar Pinto.
A exposição celebra os 100 anos de Vitalino e envolve ainda um seminário com
depoimentos do filho do artista, Manuel, em três palestras nos dias 8 de
junho (19h), 8 de julho (19h) e 8 de agosto (10h). Todas as imagens têm
formato quadrado, pois Verger sempre fotografava com uma câmera Rolleiflex.
Das 140 fotografias da série, pertencentes à Fundação Pierre Verger (Bahia),
109 estão nas paredes e as outras 31 são vistas apenas nos monitores de
vídeo. A maioria nunca havia sido revelada e permanecia arquivada em
negativos. A figura de uma mão que amassa o barro recebe um destaque
especial na mostra, pois sintetiza o ofício do mestre.
Serviço
Exposição Arte do barro e o olhar da arte: Vitalino e Verger
Quando: Em cartaz até 30 de agosto
Onde: Instituto Cultural Banco Real (Avenida Barão do Rio Branco, Marco
Zero, Bairro do Recife)
Informações: 3224-1110
(©
Diário de Pernambuco)
A arte do barro de
Vitalino por Verger
Mostra do
ICBR traz 109 fotos de Pierre Verger sobre trabalho do mestre de Caruaru
Flávia de GusmãoUm encontro
de mestres, ambos com a letra V, Vitalino e Verger. Um, artista do barro, o
outro, artista da foto etnográfica, ambos afinados com o preto, o branco, o
sépia, os dois marcados pelo sentimento de terroir: aquele produto único que
se obtém apenas sob ideais condições humanas, topográficas, tecnológicas e
climáticas. Impossível de ser repetido em quaisquer outras circunstâncias,
pelo menos não da mesma forma. É disso que trata a exposição A arte do barro
e o olhar da arte – Vitalino e Verger, que segue em cartaz para
visitação pública até o dia 30 de agosto.
A mostra traz
109 fotos assinadas pelo fotógrafo Pierre Verger, que praticamente marcam a
estréia dele no Brasil. Apesar de ter escolhido como porta de entrada a
cidade de Salvador, que também se tornou sua cidade ‘natal’ e seria sua
última parada (ele faleceu na capital baiana em 11 de fevereiro de 1996, aos
94 anos), ele logo veio a Pernambuco (em 1947), onde teve estada
relativamente longa: pouco mais de seis meses.
Com a sua
icônica máquina Rolleiflex produziu um acervo – que hoje está sob a guarda
da Fundação Pierre Verger, em Salvador – de cerca de mil fotografias (a
Coleção Pernambuco). Elas são o resumo da força que movia Verger: a paixão
pelo retrato, pela captura da singularidade – do indivíduo, dos saberes, do
momento. No litoral, fotografou os tipos físicos, edificações, a
religiosidade, as profissões, os festejos. Subindo a Serra, em direção a
Caruaru, além disso tudo, deparou-se com Vitalino e nos legou a compreensão
da dimensão da arte do barro, do processo de amassar com as mãos, modelar,
queimar e povoar feiras, coleções, imaginação.
“Nesta
exposição, as pessoas sairão encharcadas de Vitalino e Verger”, afirma o
antropólogo Raul Lody, curador da Fundação Pierre Verger e também
coordenador geral desta exposição no Recife. “Nada está aqui por acaso, tudo
é fruto de uma delicada urdidura”, completa. Para apreciar esta coleção
praticamente inédita, o visitante irá caminhar por uma trilha de barro e
travará com a matéria-prima uma relação multissensorial. A música que o
acompanhará neste trajeto é produzida a partir do som dos pífanos – a
segunda grande paixão do mestre do barro, que integrava uma banda chamada
Zabumba de Mestre Vicente, formada por dois pífanos, sendo o primeiro tocado
por ele, o segundo por Manoel Rufino, o tarol por Vicente Teotônio da Silva,
o surdo por José Rufino e a zabumba por Pedro Teotônio. A banda de pífanos
tantas vezes esculpida pelas mãos do artista. E é esta música, levada na
época a propósito de qualquer cerimônia ou festividade, que serve como
“trilha sonora”.
Quatro
inserts com imagens em movimento (colaboração do cineasta Fernando Spencer)
e fotos de Verger repetidas em formatos diferentes, com releitura de closes
e variação de ângulos, dão bem a ideia da multiplicidade de olhares contida
no olhar de Verger. Mesmo estanques, algumas dessas imagens ganham
características de sequência fílmica, tanta a preocupação do fotógrafo de
registrar o passo a passo da arte do barro – do buraco cavado no chão para
coletar a matéria-prima ao movimento cadenciado das mãos. Se passadas a
rápida velocidade, poderiam virar animação. Uma das características de
Pierre Verger é que, apesar de se deter sobre um objeto/personagem
(barro/artista), ele não esquece de situar o espectador no meio
sócio-cultural tridimensionalizado pelo artista. A Feira de Caruaru, por
exemplo, patrimônio imaterial do Brasil e cenário vivido com intensidade por
Vitalino, ganha uma sequência especial: os homens vestidos com a elegância
da época, a montagem das barracas, a diversidade dos produtos, o carinho
ancestral pelas figuras de barro.
Numa das
fotografias de Verger – a da criança que acaricia com evidente estima um
boizinho de barro –, pode ser resumida a própria história de Vitalino
Pereira dos Santos. Sua mãe era louceira e vendia utensílios para ajudar no
sustento da família. Com as sobras do barro, Vitalino, criança, criava seus
animais e figuras humanas para servirem de brinquedo e, por um típico
exercício de imitação infantil, acompanhava a mãe à feira e montava a sua
própria banquinha para vender a produção. As memórias afetivas, ou a
afetividade contida em qualquer memória, são, se não o mote principal de
Verger, seguramente o viés por trás do seu registro. O eco de uma delas, por
exemplo, veio bater no século 21: o filho de Vitalino, Manuel, foi pura
emoção ao se ver retratado criança, como o pai um dia fora, aprendendo o
ofício dos bonecos de barro.
“A descoberta
de Vitalino se deu num período pós-gerra (2ª Guerra Mundial), quando é
natural a busca de referências, de identidades. Era um momento de
recuperação da memória”, situa Raul Lody. Hoje, no ano em que se comemora o
centenário do artista popular (nascido a 10 de julho de 1909 e falecido em
1963), a exposição do Instituto Cultural Banco Real reafirma a necessidade
de preservação desta memória. “Sua maestria possibilitou eternizar no barro
moldado, cozido e pintado, as memórias próximas da vida agreste, e com elas
a fama e uma valorização no mercado de arte”, resume Raul Lody.
SEMINÁRIO
Durante o
período da exposição Arte do barro e o olhar da arte – Vitalino e Verger, o
Instituto Cultural Banco Real promove o seminário Encontro com Manuel
Vitalino – histórias e memórias de Mestre Vitalino, sob a coordenação de
Raul Lody. O seminário acontecerá em três datas distintas e terá três focos.
No dia 8 de junho, segunda-feira, às 19h, o público-alvo será formado por
profissionais de educação, no dia 8 de julho, também às 19h, artistas
plásticos, artesãos e designers serão recebidos para o diálogo e, no dia 8
de agosto, às 10h, é a vez de cineastas, videastas e fotógrafos trocarem
idéias sobre a exposição e a arte de Verger e Vitalino. As inscrições são
gratuitas e podem ser feitas pelo telefone: 3224-1110.
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Exposição Vitalino e Verger – De 5 de junho a 30 de
agosto aberta ao público. Instituto Cultural Banco Real – Av. Rio Branco,
23, Bairro do Recife, fone: 3224-1110.
(©
JC Online)
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