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O mote mais triste de Otacílio Batista

06/08/2003

Os irmãos Dimas e Otacílio Batista
 

Repentista de versos certeiros da dinastia de poetas populares do Pajeú – irmão de Dimas e Lourival – morreu ontem, aos 79 anos, em João Pessoa

JOSÉ TELES

   A lendária trindade da cantoria nordestina, formada pelos irmãos Batista, de São José do Egito, encerrou-se ontem, com a morte, em João Pessoa, de Otacílio Batista, 79 (completaria 80 em setembro), em conseqüência de problemas respiratórios e cardíacos. Ele sofria de diabetes e esclerose. Os outros “faraós”, como os irmãos eram também cognominados, Lourival, o “Louro”, e Dimas, faleceram, respectivamente, em 1992 e 1987.

   Otacílio Batista era o mais novo e mais bem-humorado do trio. Orgulhava-se de ter cantado para todos os Presidentes da República, de Gaspar Dutra (1945) a FHC, e para o Papa João Paulo II. Nascido em Itapetim, então distrito de São José do Egito, no Sertão do Pajéu, Otacílio Batista vivia em João Pessoa, onde cantou pela última vez, no início do ano passado, com o parceiro Oliveira de Panelas. Por telefone, da capital paraibana, também adotada por ele, Oliveira falou com emoção do colega com o qual por 23 anos formou uma das duplas mais duradouras da história do repente.

   Ele cantou pela primeira vez com Otacílio Batista em São Paulo: “Isso foi em 1975, em seguida voltei para o Nordeste, quando passamos a cantar juntos. A amizade nossa era como a de pai para filho. Gravamos quatro CDs e três LPs, e viajamos pelo Brasil inteiro e até ao exterior. Fomos a Cuba, Bolívia e Portugal. O repente perdeu um gênio. Ele deixa uma lacuna enorme na poesia brasileira”. Na hora, com a voz potente, que o levou a ser alcunhado de “O Pavarotti do Sertão”, Oliveira de Panelas improvisou esta décima para o amigo: “Por ser leal cantador/ Vivemos os mesmos planos/ Em nossos 23 anos/ Entre a alegria e a dor/ Porém quis o Criador/ Lhe envolver em um véu/ Para receber o troféu/ Que Deus lhe deu de presente/ Hoje foi fazer repente/ Nas cantorias do céu”.

   Embora já fossem lendas no Nordeste, os irmãos Batista só se tornaram conhecidos nacionalmente a partir dos discos da gravadora Marcus Pereira, que empreendeu um mapeamento da música regional do país em 1973. A gravação dos repentistas de São José do Egito levou jovens autores da MPB a se interessar pela cantoria. O Quinteto Violado, por exemplo, lançou no álbum Pilogamia do Baião, de 1979, Martelo agalopado, uma composição de Otacílio Batista, em parceria com o também cantador Diniz Vitorino. Seu maior sucesso na música popular aconteceu em 1982, com Mulher nova, bonita e carinhosa, faz o homem gemer sem sentir dor, um mote que virou canção (assinada com Zé Ramalho) e alavancou a carreira da cearense Amelinha, e inclusive foi o título do LP da cantora daquele ano.

   Ivanildo Vila Nova, um dos maiores nomes do repente atual, revelou que pretende fazer, no próximo ano, uma cantoria em homenagem a Otacílio Batista, em Itapetim, sua cidade natal: “Cantei váris vezes com ele. Era sem dúvida uma das legendas do repente. Dos três irmãos, para mim era o que cantava mais bonito e o mais humorista”. O humor de Otacílio Batista aflorava em versos como estes: “Admiro o vagalume/ Voando ao morrer do dia/ Desafiando a ciência/ Que o homem na Terra cria/ Com um pisca-pisca na bunda/ Sem precisar bateria.”

(© Jornal do Commercio-Pe)

Com relação a este tema, saiba mais (arquivo NordesteWeb)


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