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Vital Farias troca sucesso por uma liberdade radical

14/09/2003

 

Ele prefere ser dono do próprio nariz, só canta onde acha conveniente e desdenha as grandes gravadoras

JOSÉ TELES

   Entre o final dos anos 70 e início dos 80, Vital Farias emendou um sucesso atrás do outro: Veja Margarida, Caso você case, Sete cantigas para voar, Ai que saudade d’ocê, em seguida, por várias razões, entre as quais discordar das regras que regem o show business, ele saiu de cena. Passou a fazer apresentações ocasionais, palestras e, desde 1998, a montar um estúdio, trabalho recém-finalizado. Hoje, às 21h, no Teatro Santa Isabel, Vital Farias faz mais uma apresentação, com a filha Giovanna, com a qual lançou, no ano passado, Uyraplural, um CD (duplo), o primeiro pelo MBC, selo que ele mesmo criou.

   Ao estrear em disco, em 1978, Vital Farias já estava na estrada desde 1965, quando deu baixa do exército e alistou-se no rock and roll, como guitarrista do conjunto Os Quatro Loucos, de João Pessoa: “Eu tocava um pouco violão e aprendi uma parte de I want to hold your hand, dos Beatles, com meu inglês bicóse tu iú. Entrei no conjunto por causa disso, e porque estava na época à deriva, sem saber o que fazer da vida”, confidencia, em entrevista por telefone, de sua casa em João Pessoa, onde vive desde meados da década de 80.

   É difícil imaginá-lo empunhando uma guitarra cantando sucessos do Credence ou Beatles, como fez por alguns anos com Os Quatro Loucos, o mais famoso conjunto da Paraíba (no qual foi substituído por Zé Ramalho). Vital Farias até se orgulha dessa fase de sua carreira, embora abomine o rock americano (que considera destrutivo), e não encontre razões plausíveis para o perene sucesso do sessentão Mick Jagger. No entanto tem os Beatles no local mais alto do panteão dos músicos que admira: “Para mim é uma coisa santa, não conheço nada internacional com tanta qualidade”.

   CANSADO DE ENGOLIR SAPOS – No Recife ele não se apresentava desde 1997, quando participou, no Teatro do Parque, de um tributo a Che Guevara, em memória aos 30 anos da morte do guerrilheiro argentino. Em João Pessoa não canta há uma década, e afirma que jamais voltará a cantar lá, sem revelar a razão da decisão radical: “Sou dono do meu nariz, canto onde acho conveniente”.

   Suas eventuais viagens podem incluir a vizinha Campina Grande ou a mais distante Curitiba, para cantorias (não usa o termo “show”) ou palestras. Das multinacionais do disco afastou-se desde o LP Sagas Brasileiras, de 1982. Depois disto participou dos dois volumes do projeto Cantoria, da Kuarup, com Elomar, Xangai e Geraldo Azevedo: “A gravadora queria que fizesse música de sucesso, a Universal até pediu para eu fazer uns sambinhas. Mas eu não sou de samba”, diz, revelando uma de suas insatisfações com as multinacionais, das quais ele confessa ter chegado a engolir alguns sapos. Um dos mais indigestos, a gravação de Ai que saudade d’ocê, com o galã Fábio Jr. incluída na trilha de uma novela global, que ele não esconde não ter gostado: “Foi uma casualidade”.

(© Jornal do Commercio-PE)


Radical na política e na música

Vital Farias se rendeu ao computador, mas segue fiel ao seu estilo e à esquerda

   Embora não comungue de afinidades com computadores, o cantor e compositor Vital Farias revela que aprendeu a dominá-los. “Fui obrigado. Os meus já estão até falando nordestês. Na verdade, eu já não agüentava mais gravar com pessoas que não entendiam o que eu queria. Escrevia um arranjo mas nunca saía como eu imaginava. Então decidi montar meu próprio estúdio. Hoje faço arranjo, regência, masterização. Tive que aprender para não continuar sendo empregado”.

   De esquerda “pela sede de justiça social”, Vital não esconde que está desiludido com o PT, embora ainda não com o presidente Lula: “Ele é uma pessoa formidável, mas está engessado dentro da estrutura do partido”. Apoio integral dele tem o MST. É possível inclusive que ele abra o show de hoje com um hino dos sem-terra. “Minhas apresentação são assim, eu não faço roteiro, só quando vou começar é que sei a primeira música que vou cantar. Talvez comece com a do MST, não sei.”

   Elogios ele não poupa à filha Giovanna Farias, que vive no Rio de Janeiro. “Tem uma coisa que noto na maioria das cantoras brasileiras, elas não evoluem, como se não quisessem amadurecer. Ficam com aquela voz de criança. Giovanna não, ela cresceu, é um mezzo soprano que não imita ninguém, e toca muito bem violão”. Giovanna, 33, canta desde os 14 (debutou exatamente no antológica cantoria com o pai, Elomar, Geraldinho e Xangai). Embora somente agora tenha estreado um disco com seu nome na capa, ela tem 18 anos de estrada e começa a incrementar a carreira solo.

   Em Saga, Cantigas e Cantilenas ela canta na maior parte do tempo acompanhada por Vital Farias, um repertório que é uma retrospectiva da obra conhecida do pai, mais algumas inéditas e canções do injustamente pouco conhecido compositor paraense Waldemar Henrique (Tamba-tajá e Uyrapuru). Vital pode adiantar trechos das peças nas quais vem trabalhando, a obra sinfônica intitulada Epopéia Negra e a Missa dos Agricultores do Sertão do Cariri Parahybano, ambas inéditas.

(© Jornal do Commercio-PE)

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