Notícias
Dicionário mapeia Câmara Cascudo

20/09/2003

Câmara Cascudo em Moçambique

Verbetes críticos organizam panorama e guiam a leitura da vasta obra do folclorista potiguar

ROGÉRIO EDUARDO ALVES
DA REPORTAGEM LOCAL

   Embora a classificação de folclorista que normalmente acompanha o nome Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) não diminua sua extensa produção, raramente são lembradas suas outras facetas, como a de ficcionista, a de biógrafo ou a de historiador.

   Sem deixar nenhuma delas de fora, o "Dicionário Crítico Câmara Cascudo", organizado pelo historiador Marcos Silva, 52, quer ampliar a visão que se tem das áreas de atuação do potiguar e fornecer um guia de leitura para sua obra.

   Os 91 verbetes que compõem o volume rastreiam os títulos lançados por Cascudo, muitos deles esgotados ou esquecidos. "Um dos objetivos do livro é reorganizar a leitura de Câmara Cascudo e apresentar um panorama da vasta produção num único volume", diz Silva, professor de retórica da imagem na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.

   Uma das lembranças interessantes e pouco lidas é a do primeiro e único romance do etnógrafo, chamado "Canto de Muro". A análise de Telê Ancona Porto Lopes localiza o livro, "esgotado na primeira tiragem da Livraria José Olympio, em 1959, e na segunda, quando entrou, em 1977, para a Coleção Sagarana, da mesma editora carioca (...)".

   Para depois resenhar: ""Canto de Muro" é, de fato, um "romance de costumes" (...) que se debruça sobre o mundo dos animais, tendo como personagens insetos, aves, répteis, pequenos mamíferos moradores e visitantes de um quintal abandonado, o canto do muro velho, em Natal, onde árvores, trepadeiras, chão, ruínas e refugos guardam existências miúdas em constante sobressalto".

   Da mesma maneira é apresentado, por Jomard Muniz de Britto, o raro "Prelúdio e Fuga do Real", que teve uma edição em 1974, "um dos mais estranhos e complexos livros, não apenas de sua [de Cascudo] vasta bibliografia".

   Os colaboradores que escrevem sobre os vários títulos, "mais de cem livros, muitos depois fundidos", foram convidados pela semelhança de seus campos de pesquisa com o do autor. Com isso, procura-se confrontar "temas e problemáticas que ele definiu com o estado atual do conhecimento", escreve Silva na nota preliminar ao "Dicionário Crítico".

   A releitura da participação de Cascudo como importante personalidade do movimento modernista nacional alinha-se com essa preocupação. "Ele foi amigo pessoal e colaborador de Mário de Andrade na viagem de pesquisa folclórica, musical e estética que o modernista paulistano fez a Natal na década de 1920", escreve Silva.

   Não por acaso, o primeiro livro do escritor é de 1921. ""Alma Patrícia", em sendo uma obra de crítica, traz as marcas de um autor preocupado com a produção literária do Rio Grande do Norte (...). Sem dúvida, para a cultura local, foi uma obra importante", analisa Moacy Cirne.

   Esse caminho de construção do "cânone do Rio Grande do Norte", como diz Silva, tem continuidade com os textos biográficos de personalidades de sua região, como em "Vida de Pedro Velho" ou em livros históricos como "Mossoró, Região e Cidade".

   Para além das restrições que as posições políticas e teóricas de Cascudo podem resultar, uma vez "marcadas por um recorte conservador, do monarquismo explícito à liderança integralista no Rio Grande do Norte (...) desdobrando-se no convívio cordial com o Estado Novo e a ditadura militar", esse "Dicionário Crítico" apresenta a diferenciada colaboração do autor para o conhecimento da cultura nacional popular.

DICIONÁRIO CRÍTICO CÂMARA CASCUDO. Organizador: Marcos Silva. Editora: Perspectiva. Quanto: R$ 45 (352 págs.)

(© Folha de S. Paulo)

Com relação a este tema, saiba mais (arquivo NordesteWeb)


powered by FreeFind


Google
Web Nordesteweb