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O cienasta baiano
Glauber Rocha
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Centro cultural começa em setembro a
digitalizar cerca de 100 mil documentos sobre o cineasta
Roberta Pennafort
Iniciada pouco após a morte de
Glauber Rocha, em agosto de 1981, a incansável luta de sua família pela
preservação de seus filmes e a vasta produção intelectual está rendendo
belos frutos. Uma das conquistas recentes foi a finalização do restauro de
seu último longa, A Idade da Terra (1980), que ganhará exibição especial no
dia 9 de setembro, no encerramento do Festival de Veneza - o mesmo em que
Glauber o lançou, 27 anos atrás, deixando o público e a crítica perplexos.
O cineasta, que considerava que A Idade da Terra estava para o cinema assim
como um quadro de Picasso para as artes plásticas, rebateu assim as reações
negativas: 'Os críticos estão querendo uma pintura acadêmica, quando já
estou dando uma pintura do futuro. É um novo cinema, antiliterário e
metateatral.' Sempre performático, ele chegou a fazer uma passeata depois da
divulgação da decisão do júri, o qual acusou de levar em conta apenas
critérios comerciais.
Agora, Veneza e o mundo poderão ver o filme novo em folha, em alta
definição, com som e imagem renovados. As distorções do negativo original,
que vinha sendo guardado em latas mofadas, foram corrigidas pelos Estúdios
Mega, com patrocínio da Petrobrás. O festival também exibirá Anabazys,
documentário de Paloma Rocha, filha de Glauber, e Joel Pizzini, que revela
parte de seu processo criativo durante a concepção de A Idade da Terra.
Anabazys é um dos nomes que o autor deu a uma das primeiras versões do
roteiro de seu longa.
O Tempo Glauber, centro cultural aberto por dona Lúcia Rocha, a apaixonada
mãe do diretor, também está cheio de novidades: o casarão de 110 anos, do
bairro de Botafogo não ganhou só nova cor - agora chama a atenção pela
fachada laranja -, mas também conta com moderno centro de documentação. A
sala ganhou o nome da matriarca, que passou a vida passando a ferro e
arquivando desenhos e rascunhos que o filho jogava no lixo. A base de dados
foi montada com auxílio do Arquivo Nacional.
Lá ficarão guardados, ao abrigo da umidade e em temperatura adequada, cerca
de 100 mil documentos, fotografias e textos (boa parte, inéditos), que
passarão por processo de digitalização a partir do mês que vem - primeiro,
serão acessíveis somente nos computadores do Tempo Glauber; posteriormente,
ficarão disponíveis a pesquisadores de todas as partes do planeta.
'Não sou eu quem estou dizendo que tudo isso tem de ser preservado e visto,
são as pessoas do mundo todo que têm essa necessidade e nos procuram', disse
Paloma Rocha, quase às lágrimas, na inauguração da nova fase do Tempo
Glauber. 'Minha meta é reunir e divulgar toda a obra do Glauber. Guardar
papel eu sabia fazer, mas isso eu não sei', continuou dona Lúcia.
Nessa briga por preservar a memória do cineasta, o centro cultural inaugurou
nova exposição de fotos, com registros de sua vida em família e em sets de
filmagem. O informativo site www.tempoglauber.com.br, que exibe biografia,
filmografia, vídeos e desenhos, ganhou versão em inglês; em breve, será
vertido também para o francês, o espanhol e o alemão. E o processo de
restauração de originais de Glauber continua: ainda há pelo dez metros
lineares de papel para serem tratados - o suficiente para deixar a equipe
ocupada por cerca de oito meses.