Crítica/artes plásticas
NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Há alguns tipos de silêncio. O de John Cage, pleno e musical, e o
silêncio do diretor de um museu da Croácia, que, durante a guerra,
percorria o mundo em palestras silenciosas, dizendo, após algum tempo,
que não era possível dizer mais nada. É dessa qualidade o vazio que
compõe as telas de Leonilson, expostas no Centro Universitário Maria
Antonia, com curadoria de Carlos Eduardo Ricciopo.
Não é um vazio que ressalta as figuras nele contidas. É como se ele
emergisse delas e elas também nascessem dele. É um vazio carregado de
dor e de curiosidade, e sua impotência adquire potência máxima. Não se
trata do vazio da depuração, mas do branco e da economia da
concentração. As imagens e palavras mínimas -o pato, o louco, o cristo,
o matemático- apresentadas por cabeças saindo de dentro de cabeças, fogo
escapando por olhos, umbigo e sexo, o infinito, não são metáforas de sua
dor e de seu desejo de comunicação.
São, como diz Lisette Lagnado em seu texto sobre o autor, metonímias.
Enquanto as metáforas, simbólicas, diluem livremente a imagem e a
transportam para outras dimensões de interpretação, a metonímia, mantém
a imagem em seu próprio espaço, remete a ela mesma. Dessa forma, o louco
é o louco, o fogo é o fogo, o espelho é o espelho.
Palavras exatas
Essa também é uma razão por que Leonilson recorre às palavras que
compõem-se totalmente com o vazio e com as imagens. As palavras, mais do
que as imagens, dizem mais exatamente o que querem dizer, escapando do
risco do que Leonilson afirmava não querer: a representação.
Num dos cadernos expostos, o artista diz: "Não quero representar
nada". "O trabalho realiza o meu desejo e quero que realize também o
desejo dos outros." Em um trabalho significativo, com um pontilhado
representando o mar, margeado pela pergunta "Oceano, aceita-me?", e em
que o branco do papel faz as vezes do oceano, é possível conhecer esse
desejo de Leonilson, e que certamente não deixa de ser o nosso, que
vamos vê-lo: ser aceito, mas por uma superfície que nos perca, para que,
ao menos por um tempo, possamos ser infinitos, loucos, artistas, bobos,
otários, carentes e vagabundos.
LEONILSON
Quando: ter. a sex. (12h às 21h); sáb. e dom. (10h às 18h); até 24/8
Onde: Centro Universitário Maria Antonia (r. Maria Antonia, 294,
tel. 0/xx/11/ 3255-7182; livre)
Quanto: entrada franca
Avaliação: ótimo
(©
Folha de S. Paulo)
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Leonilson