28/07/2008
Divulgação
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O escritor João Ubaldo Ribeiro, oitavo brasileiro a levar o prêmio
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Ganhador do Camões, escritor afirma que usará os 100 mil como
"aposentadoriazinha'
"Espero que não tomem [o prêmio] de volta", brinca, sobre controvérsia
relativa à decisão do júri de analisar apenas brasileiros neste ano
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Foi com sua habitual ironia que João Ubaldo Ribeiro, 67, falou à Folha
sobre os 100 mil (cerca de R$ 246 mil) que receberá por ter vencido, no
sábado, o Prêmio Camões, a principal distinção concedida a autores de língua
portuguesa.
"Gostaria de lembrar que se trata de 100 mil. Pode parecer muito, mas não
compra as dependências de empregada de um apartamento aqui pertinho na
[avenida] Delfim Moreira [Leblon, zona sul do Rio]. Portanto, não posso sair
por aí como quem sai do "Big Brother" nem tampouco posar pelado, pois tenho
o receio de que o mercado seria reduzido".
Baiano radicado no Rio, o autor de "Sargento Getúlio" (1971), "Viva o
Povo Brasileiro" (1984) e "O Sorriso do Lagarto" (1989), entre outros
livros, é o oitavo brasileiro a levar o prêmio (veja quadro abaixo). Ele
completou a resposta sobre o dinheiro dizendo que irá aplicar no banco, para
sua "aposentadoriazinha". "Se fosse aposentado pelo INSS, estaria ganhando
R$ 1.200 por mês. Já sou oficialmente velhote."
Sobre o significado do prêmio para sua carreira, afirmou: "É sempre
consagrador, é "o" prêmio da língua portuguesa, não deixa de ser especial.
Mas não estou tão seduzido assim pela glória. É consolador numa vida de
briga, às vezes difícil, porque a vida de quem vive de escrever não é fácil,
e nem sempre pude viver de escrever".
Polêmica
No sábado, a agência de notícias Lusa informou que o vice-presidente da
Sociedade Portuguesa de Autores, José Jorge Letria, questionou a decisão do
júri, formado por Maria de Fátima Marinho, professora da Faculdade de Letras
da Universidade do Porto, pelo escritor brasileiro Marco Lucchesi e pelo
poeta e jornalista angolano João Meio. Segundo a agência, Letria disse que
"precisam ser apresentadas razões justificáveis" para o fato de o júri ter
decidido analisar apenas escritores brasileiros neste ano.
Ubaldo disse que não soube da controvérsia. Ele foi jurado do prêmio em
1994, ano em que Jorge Amado foi o vencedor. "Na época, havia discussão
sobre certas regras, como um rodízio entre países. Não lembro se definiram
algo. Posso dizer que: a) Sou membro da Sociedade Portuguesa de Autores e
ele [Letria] deve saber disso; b) Não tinha idéia de que se estava
discutindo o Camões, porque não vivo pensando nessas coisas. Só sei que
deram o prêmio e espero fervorosamente que não o tomem de volta."
Em abril, a Alfaguara iniciou uma série de reedições da obra de Ubaldo,
com "Sargento Getúlio" e "Viva o Povo Brasileiro". Para agosto, está
previsto o relançamento do infantil "A Vingança de Charles Tiburone" (1990)
e, para janeiro, o do ensaio "Política: Quem Manda, Por Que Manda, Como
Manda" (1981). Em novembro, será lançada a coletânea de crônicas "Correio da
Noite".
Novas obras, porém, devem esperar. "Não tenho tempo", justifica. "Recebo
dezenas de originais, centenas de e-mails, solicitações as mais diversas.
Como da amiga que posa nua e quer que eu faça uma frase dizendo como ela é
linda pelada [já fez, por exemplo, para "Playboys" de Maria Zilda e Vera
Fischer], achando que é fácil. E não é, tem de suar o mês todo para imaginar
algo de que fulana goste e que minha mulher não desaprove."
(©
Folha de S. Paulo)
OUTROS VENCEDORES
Brasileiros premiados
2005
Lygia Fagundes Telles
2003
Rubem Fonseca
2000
Autran Dourado
1998
Antonio Candido
1994
Jorge Amado
1993
Rachel de Queiroz
1990
João Cabral de Melo Neto
(©
Folha de S. Paulo)
João Ubaldo vira 'celebridade' após Prêmio Camões
Tasso Marcelo/AE
'Pareço até BBB', brinca o escritor
Amigos e colegas cumprimentaram o escritor pelo
reconhecimento internacional
Daniele Carvalho
RIO - No dia seguinte à conquista do Prêmio Camões 2008,
o escritor baiano João Ubaldo Ribeiro manteve o humor e o senso crítico
que o tornaram internacionalmente conhecido. De seu apartamento no
Leblon, zona sul do Rio, ele se deliciava com a quantidade de
telefonemas e e-mails recebidos de amigos e escritores desde a tarde de
sábado "Estou me sentindo uma celebridade. Pareço até um BBB", brincou
ele, referindo-se ao reality show. Oitavo
brasileiro a receber a homenagem, criada pelos governos de Portugal e
Brasil, em 1988, Ubaldo foi escolhido pelo conjunto de sua obra, que
contribui para o enriquecimento do patrimônio literário e cultural da
língua portuguesa. Apesar de se dizer feliz e satisfeito com a
premiação, ele lamentou o pouco destaque que o assunto ganha no
País."Talvez se eu me chamasse John Brock e ganhasse um prêmio nos
Estados Unidos, seria mais conhecido e teria mais espaço no
noticiário."
Dizendo-se de mau humor - situação difícil de ser
identificada diante de seus comentários hilariantes - , João Ubaldo
avalia que o pouco interesse do brasileiro pela leitura tem como causa a
forma com que a literatura é ensinada nas escolas. Segundo ele, os
alunos, muitas vezes, são obrigados a ler textos para depois responder a
questões confusas e mal elaboradas. "Os livros didáticos de literatura
estão repletos disto. Eu teria dificuldade de responder a perguntas
feitas até sobre textos meus", disse.
O reconhecimento internacional obtido em um país em
que poucos buscam a companhia de um livro foi lembrado por Lygia
Fagundes Telles, última brasileira a receber o Prêmio Camões (2005). "É
um afago à alma. É árduo o ofício de um escritor em um país como o
Brasil, que tem tantos analfabetos. O prêmio me trouxe muitas alegrias.
João Ubaldo merecia este reconhecimento", afirmou a escritora.
A utilização de elementos técnicos e temáticas
populares foi apontada pelo imortal da Academia Brasileira de Letras
(ABL), Antônio Carlos Secchin, como a principal característica da
literatura de Ubaldo. "Ele é o erudito de bermudas. Ele não é um autor
ingênuo e é sofisticado", resumiu. Para ele, as obras "Viva o Povo
Brasileiro" e "Sargento Getúlio" são exemplos claros desta dualidade.
"Viva o Povo Brasileiro é uma obra fundamental para a
literatura nacional. O livro sintetiza a alma de nosso povo", acrescenta
o também imortal Cícero Sandroni, que descreve João Ubaldo como uma
pessoa de relacionamento ameno e agradável."Sentimos falta dele na ABL,
mas sabemos que ele produz muito. É o tipo de escritor que mergulha e se
dedica totalmente quando está escrevendo um romance. Seu trabalho é
admirável", comentou Sandroni.
A consistência da obra de João Ubaldo também é
lembrada pelo escritor Silvano Santiago, que considera Ubaldo um dos
nomes mais importantes da literatura brasileira na segunda metade do
século XX. "Ele faz parte daquela geração de baianos talentosos como
Glauber Rocha. No exterior, ele é tido como o sucessor de Jorge Amado.
Boa parte de seus livros é publicada, inclusive, pelas mesmas editoras
dos livros de Jorge", contou ele, acrescentando que a premiação trará
ainda mais destaque à obra de Ubaldo.
Para o poeta e roteirista Geraldo Carneiro, que
adaptou "O Sorriso do Lagarto" para uma minissérie de televisão, Ubaldo
consegue dialogar com os mais variados públicos. Os dois dividem
atualmente o texto do seriado "Faça a sua História", apresentado aos
domingos pela TV Globo."Temos um relacionamento ótimo. Adaptar os livros
de João Ubaldo para a televisão não é uma tarefa difícil. Seus
personagens são muito ricos e seu texto é repleto de ação", elogiou
Carneiro.
(©
Estadão)
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Com relação a este tema, saiba mais (arquivo NordesteWeb)
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