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Novo Curador da Bienal, Moacir Dos Anjos |
Evento, que deve ocorrer entre setembro e outubro de 2010,
terá ainda outros cinco nomes para o projeto curatorial
"Um tema costuma constranger as obras", diz Moacir Dos
Anjos, explicando que a 29ª terá uma "plataforma discursiva"
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
Política, sem a institucionalização de um museu ou o afã
pelo novo de uma feira de arte. Em síntese, essas são as linhas gerais que
vão direcionar a organização da 29ª Bienal de São Paulo, segundo o curador
Moacir dos Anjos, anunciado hoje pelo presidente da Fundação Bienal, Heitor
Martins, conforme a Folha havia adiantado.
De Londres, via Skype, o pernambucano Dos Anjos, 46,
explicou o projeto inicial que irá conduzir a preparação da mostra, ainda
sem data de abertura definida, mas que deve ocorrer em fins de setembro ou
começo de outubro do próximo ano. "O Moacir é o coordenador do grupo
curatorial, outros cinco nomes ainda devem ser incluídos, três deles
estrangeiros. O conceito de equipe é importante para marcar um pluralismo de
visões", afirmou ontem Martins, na sede da Fundação Bienal. Os demais
curadores serão anunciados em agosto.
A 29ª Bienal não terá um tema específico, mas será
organizada como uma "plataforma discursiva", disse Dos Anjos. "Um tema
costuma constranger as obras a um ponto específico e por seu tamanho." De
acordo com o projeto apresentado pelo curador, isso significa que "o aspecto
central dessa plataforma será o reconhecimento do caráter ambíguo que a arte
exibe desde que se viu liberta de sua função de meramente representar o
mundo".
O curador trabalha a exposição com um título ainda
provisório, "Há sempre um copo de mar para um homem navegar", verso do poeta
alagoano Jorge de Lima. "Vamos dar ênfase à arte como produtora de uma visão
de mundo que, em potência, pode transformar a realidade", disse o curador,
ao explicar o caráter político da mostra.
Ao preparar o projeto da 29ª Bienal, Dos Anjos falou que
teve em mente outras mostras, com as quais pretende dialogar: "Não sou
ingênuo ou arrogante para achar que vou inventar a roda. A Documenta 11, de
2002, a última Bienal de Sydney, e a 24ª e 27ª Bienais de SP são as mostras
que tive em mente para elaborar o projeto."
Sobre a Documenta 11, Dos Anjos ressaltou a mescla entre
os vínculos estabelecidos da arte feita no presente com a produção do
passado, o que deve ocorrer também na 29ª Bienal. Outro viés importante da
exposição, também segundo o curador, será seu caráter experimental, que foi
lembrado a partir da concepção do crítico Mário Pedrosa em sua famosa
formulação "a arte é o exercício experimental da liberdade".
A produção brasileira também será fortalecida, sem ser
organizada em gueto. "Pretendo romper com a leitura crítica dominante que a
arte política brasileira ocorreu só nos anos 1960 e 70."
Segundo Martins, a exposição deve custar cerca de R$ 25
milhões, além de R$ 5 milhões para o setor educativo. O curador volta amanhã
para Recife. Ele não terá residência permanente em São Paulo.
(©
Folha de S. Paulo)
Moacir
assume a Bienal SP
Fundação anunciou o crítico e curador
pernambucano Moacir dos Anjos para o desafio de organizar edição de 2010
O economista e crítico pernambucano Moacir dos Anjos, 45 anos, é o curador
da 29ª Bienal de Arte de São Paulo, prevista para estrear entre setembro e
outubro de 2010. A mostra tem como título provisório Há sempre um copo de
mar para um homem navegar, verso extraído de Invenção de Orfeu, do poeta
alagoano Jorge de Lima. Ex-diretor do Museu de Arte Moderna Aloísio
Magalhães (Mamam) de 2001 a 2006, ele começou sua trajetória dentro das
artes na Fundação Joaquim Nabuco, na década de 90. Atualmente, está em
Londres, finalizando um pós-doutorado sobre as relações entre o
local-regional e o global-universal na arte contemporânea. Ele volta da
capital inglesa esta semana e deve assumir o posto imediatamente. A notícia
foi divulgada oficialmente ontem, pela Fundação Bienal de São Paulo,
organizadora do evento.
O primeiro convite para coordenar uma das
maiores exposições do mundo chega para o crítico como uma prova de fogo. A
Fundação Bienal atravessa uma crise sem precedentes, que desembocou em
críticas de todos os tipos para a 28ª edição da mostra – apelidada de
“Bienal do Vazio”, vista por apenas 162 mil pessoas. O curador terá dois
desafios simultaneamanente: produzir uma Bienal em pouco mais de um ano e
estabelecer um formato viável para uma megaexposição de arte contemporânea,
devolvendo-lhe a credibilidade.
META AMBICIOSA
Moacir dos Anjos participou ontem de
videoconferência sobre seus planos para a Bienal de São Paulo. Ele
apresentou metas ambiciosas dentro do seu empenho em resgatar a relevância
da mostra “Nosso objetivo tem que ser o máximo possível, atingir um milhão
de pessoas”.
Essa marca que quase foi alcançada pela
edição de 2004 (917 mil visitantes), mas que desde então vem caindo (em
2006, foram 535 mil visitantes), apesar de ter se tornado gratuita há três
anos. “Temos que elaborar formas de atrair o público mostrando que a Bienal
não é lugar de cultura de massa, mas tampouco é elitista. A arte
contemporânea tem a capacidade de falar das coisas da vida cotidiana, o que
possibilita que seja entendida por todos”.
A 29ª Bienal não terá um tema, mas uma
plataforma, como nas duas edições anteriores. “A intenção é enfatizar a
natureza política da arte enquanto algo que possui autonomia. A plataforma
pretende reafirmar a potência da arte, seu poder de reconfigurar visões de
mundo”.
Para o curador, apesar da grave crise
institucional na Fundação, do grande número de bienais no mundo e dos
debates sobre o esgotamento do formato, há um lugar importante a ser ocupado
pela Bienal de São Paulo, “não apenas por sua história, mas por ser
realizada no Brasil, um dos principais centros de produção artística
mundial”.
O custo previsto para a realização da 29ª
Bienal é de R$ 25 milhões. Mais R$ 5 milhões serão investidos no programa de
arte educação. Segundo Martins, serão necessários ainda R$ 10 milhões para
custeio de despesas e saneamento de dívidas. Ele também tenciona captar
recursos para reformar o prédio criado por Niemeyer.
ARTE INVISÍVEL
Dentro desse escopo, Moacir dos Anjos, que
vai se dividir entre Recife e São Paulo, afirma que a mostra, com
participação de 100 a 150 artistas e terá a arte brasileira como presença
importante, permeando toda a exposição. “É possível dizer que será uma
mostra de arte brasileira invisível”, diz o coordenador, que pretende
“pensar a história recente da produção nacional pelo viés que une política e
estética”.
Artistas e curadores pernambucanos que já
trabalharam com Moacir dos Anjos não têm dúvidas a respeito da sua
capacidade de levar o projeto adiante. Para a crítica e curadora de arte
Cristiana Tejo, o título de curador da Bienal de São Paulo é um dos maiores
reconhecimentos dentro da área, não apenas no Brasil, mas também no contexto
internacional. “Há muitas pessoas no mundo que gostariam de ocupar esse
lugar. Apesar das dificuldades que enfrenta, a Bienal é um espaço de
projeção internacional para artistas e pensadores da arte”, ressalta.
Cristiana acredita que a crise em torno da
Bienal não atinge tanto a mostra quanto a Fundação Bienal. “A instituição
tem vários problemas de administração. O desgaste evidenciou que ela não é
tão sólida quanto se pensava. Não tem raízes. Seu papel é o produtora de
eventos, mas não é assim que se constrói uma bienal.” A curadora explica que
uma exposição desta grandeza precisa de tempo e de verba assegurada para
acontecer. Para ela, as falhas que vieram à tona na última edição tiveram o
papel importante de tornar pública a crise.
A Fundação Bienal trocou várias peças-chave
envolvidas na realização da exposição, inclusive o presidente da
diretoria-executiva, elegendo Heitor Martins para o cargo. Graduado em
administração pública pela FGV-SP, e com mestrado de administração de
empresas na Universidade de Michigan, espera-se que ele consiga imprimir um
perfil administrativo mais profissional. “Vejo esse mea culpa da Fundação
como algo positivo. Pelo que percebi do novo presidente, acredito que ele e
Moacir consigam trabalhar bem em conjunto. Um projeto curatorial é reflexo
das pretensões do presidente. É preciso ter clareza da relevância dessa
função”, completa Cristiana Tejo.
(©
JC Online)
Pernambucanos comemoram a escolha do
curador
O artista plástico José Patrício, que já participou de edições
anteriores da Bienal e trabalhou com Moacir dos Anjos na Fundaj, comemora a
notícia da nomeação. “Ele chega a esse cargo merecidamente, porque é um
curador muito comprometido com o resultado do trabalho, não com outras
questões paralelas, que às vezes atrapalham o desenvolvimento de um projeto
como este. Ele tem condições de fazer um trabalho excelente”, reforça
Patrício. O artista acrescenta que Moacir tem um diferencial em relação a
outros curadores brasileiros: “Ele teve sua formação cultural no Recife, mas
é um cidadão do mundo, com um olhar amplo. É a primeira vez que alguém cuja
carreira foi construída fora do eixo Rio-São Paulo assume esse cargo”.
“Fico muito feliz, pelo reconhecimento de seu trabalho extremamente
sério e competente. Moacir hoje é um nome nacional inquestionável, com
trânsito internacional. Ele está altamente preparado para realizar uma
Bienal”, afirma o artista plástico Gil Vicente, que participou, em 2002,
da 25ª edição da Bienal. Gil não teme que a crise tire o brilho da
atuação do curador pernambucano. “Se ele aceitou o convite, sabe o que
vai fazer e terá condições de dar prosseguimento ao desafio de encontrar
novos modelos para exposições do estilo das bienais”, pontua.
Outro artista local que comemora a indicação é Rodrigo Braga. “Moacir
ajudou bastante a construir o nosso meio de arte contemporânea em
Pernambuco. Ele promoveu várias boas exposições de artistas de outros
Estados, e nos possibilitou adquirir esse conhecimento e proporcionou
que nomes daqui participassem de exposições em outros lugares, fazendo a
arte circular”, diz Rodrigo.
(©
JC Online)
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