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Foto: Divulgação

Cena de O Homem que Desafiou o Diabo
 

Aventuras e desventuras de um anti-herói picaresco e amoral divertem em O homem que desafiou o diabo

Marcos Toledo
mtoledo@jc.com.br

O Nordeste está na moda e, desde que Luiz Gonzaga lançou a música-manifesto Baião (dele e de Humberto Teixeira), em 1946, e provocou uma verdadeira revolução na música popular brasileira, as expressões artísticas nacionais nunca estiveram tão de olho na região quanto na atual fase pós-manguebeat. No cinema, o sucesso de crítica das produções independentes locais, de temática regional (nem sempre regionalista), desperta o interesse de grandes produtores, que parecem buscar uma fórmula com a qual possam aliar essa qualidade estética a uma linguagem mais comercial capaz de obter resultados mais satisfatórios nas bilheterias. Essa é a impressão que se tem ao assistir O homem que desafiou o diabo (2007), longa-metragem que estréia hoje nos cinemas.

Tamanho interesse, legítimo, faz com que até mesmo artistas há muito afastados de suas origens nordestinas se vejam motivados a um reencontro com suas raízes. É o caso do diretor potiguar Moacyr Góes, que depois de sua estréia com Dom (2003), livre adaptação do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, teve uma carreira marcada por produções de encomenda para Xuxa, padre Marcelo Rossi e Luciano Huck & Angélica. Um dos produtores, o veterano Luiz Carlos Barreto, também é nordestino, nascido no Ceará mas, a exemplo de Góes, radicado no Rio de Janeiro.

“Natal está dentro de mim”, disse o diretor em uma coletiva de imprensa realizada em São Paulo, na semana passada, durante o pré-lançamento do longa. “Esse filme foi um reencontro. Tive a chance de me sentir mais nordestino.” Na entrevista, Góes – que refez o roteiro primeiramente adaptado pelo paraibano Bráulio Tavares – confirmou que procurou com esse trabalho realizar “um certo resgate da fala, da oratória do Nordeste”, inspirado no termos que ouvia quando criança.

O texto original, As pelejas de Ojuara (1986), é do também potiguar Nei Leandro de Castro. O material chegou às mãos de Góes, após alguns tratamentos, pelas mãos de Barreto, que havia tomado conhecimento do romance por meio de uma jornalista do Recife cujo nome, até o dia da entrevista, lamentava não se lembrar.

Como acontece no livro, o filme é um mix de histórias que conta as aventuras e desventuras de um anti-herói picaresco e amoral – vivido pelo ator Marcos Palmeira – pelo sertão nordestino. Ojuara nada mais é do que Araújo ao contrário, ou a inversão de caráter de um caixeiro viajante (francamente calcado no Vadinho de Dona Flor e seus dois maridos, produção de maior sucesso da família Barreto) que é impelido a casar com a filha quarentona (Lívia Falcão) de um comerciante (Renato Consorte) do interior, a qual desvirginou. Ao virar motivo de chacota na cidade, Araújo se revolta contra tudo e contra todos – tal qual Michael Douglas em Um dia de fúria (1993) – tranformando-se num cavaleiro errante e mulherengo, mistura de Don Quixote com Robin Hood e John Holmes.

A partir daí, a obra passa a flertar diretamente com o realismo fantástico (embora Barreto discorde, para ele, a referência é a literatura picaresca) em causos díspares, uma colagem de histórias longa e irregular, que oscila entre momentos quentes e mornos. De tão longo, o filme acaba sem terminar. Apesar do esforço de toda a equipe, O homem que desafiou o diabo ainda carece de uma unidade estética que pede esse tipo de trabalho, a qual o espectador mais cinéfilo já se acostumou a ver nas produções ditas menos comerciais.

(© JC Online)


Pernambucanos no elenco

A limitação estética, tanto da imagem quanto da narrativa, do longa-metragem O homem que desafiou o diabo é compensada pelo esforço da equipe técnica e do elenco, o ponto alto da produção. No rol de atores, além de Marcos Palmeira no papel do protagonista, dois nomes roubam a cena, coincidentemente, dois pernambucanos de Garanhuns: Lívia Falcão e o estreante Hélder Vasconcelos. O filme conta ainda com Fernanda Paes Leme, e participações de Sérgio Mamberti, Flávia Alessandra, Antônio Pitanga, Leandro Firmino da Hora, Leon Góes, Lúcio Mauro e do cantor Otto.

“Tem uma coisa nesse filme que é o envolvimento das pessoas, que abraçaram o projeto”, disse a produtora Lucy Barreto, esposa de Luiz Carlos Barreto. E isso é notado na tela. No caso dos atores, um dos principais méritos dos realizadores foi conciliar as incertezas e inseguranças dos artistas ainda na pré-produção.

Para o músico e dançarino Hélder Vasconcelos – que desde que fez uma ponta em O baile perfumado (de 1997), ainda como integrante do grupo Mestre Ambrósio, queria que seu trabalho lhe conduzisse a uma oportunidade no cinema –, a hesitação se deu pelo próprio personagem, uma representação folclórico-nordestina do diabo. “O filme é de verdade. Você está brincando com um ícone que representa o mal. Vou usar o maracatu, o meu sagrado hoje, para caracterizar o símbolo oposto?”, perguntou-se o ator.

Após conversas com os realizadores, Hélder se convenceu de que o que eles queriam era o resultado de seus 15 anos de pesquisa sobre as manifestações populares. “Vi a possibilidade de criar um ícone universal com as características nordestinas. Foi quando percebi a importância do personagem”, afirmou o artista.

Com experiência também no teatro e na TV, inclusive como diretora e produtora, Lívia Falcão titubeou para aceitar o papel por outro motivo. A atriz, que já havia lido o texto original, conhecia bem o teor erótico da fogosa quarentona Dualiba, que se casa com Araújo, e desconfiou, a princípio, do tratamento que seria dado à personagem em cena. “Nunca tinha feito uma cena de sexo. Não tenho preconceito com esse tipo de cena, mas não sabia como ia ser filmado”, contou a atriz. A tranqüilidade também veio após uma conversar com o diretor e o resultado, em vez de comprometedor, é bem engraçado.

(© JC Online)


'O Homem que Desafiou o Diabo' remete ao cordel

Temática nordestina domina filme com caixeiro viajante José Araújo (Marcos Palmeira) como protagonista

Alysson Oliveira, Reuters

SÃO PAULO - O longa nacional O Homem Que Desafiou o Diabo, que estréia em todo o país nesta sexta-feira, 29, é uma espécie de reciclagem de sucessos recentes como O Auto da Compadecida e Lisbela e o Prisioneiro. A paternidade aqui não pertence a Guel Arraes, mas ao diretor Moacyr Góes (Dom, Trair e Coçar é Só Começar).

O Homem Que Desafiou o Diabo inspira-se numa tradição de aventuras românticas e cômicas situadas no Nordeste brasileiro, consolidada (especialmente na bilheteria) por Arraes nos últimos anos. 

Aqui, novamente, o protagonista é um herói que vive aventuras e desventuras por um Nordeste mais fantasioso do que real. O personagem é o caixeiro viajante José Araújo (Marcos Palmeira, de O Casamento de Louise) - uma espécie de malandro charmoso e de bom coração. 

Chegando a uma cidadezinha, conhece uma solteirona chamada Dualiba (Lívia Falcão, da novela Eterna Magia). Depois de um rápido namoro, acaba sendo forçado a casar com ela. O tempo passa e ele tanto se submete aos caprichos sexuais da mulher e às exigências do sogro, que se torna motivo de piada na cidade.

Quando descobre, Araújo se revolta e dá o troco, assumindo uma nova identidade, Ojuara (seu sobrenome ao contrário). Usando roupa de couro, sai pelo sertão buscando aventuras e ajudando os fracos e oprimidos. O objetivo do personagem é encontrar uma terra lendária, chamada São Saruê. 

Essa espécie de Robin Hood nordestino vai encontrar tanto criaturas míticas, quanto o grande amor da vida dele. As pequenas aventuras do personagem vão se seguindo, como se fossem esquetes de um programa humorístico. Ele cruza seu caminho com o diabo (o estreante Helder Vasconcelos), engana-o e os dois tornam-se desafetos. As contas entre os dois vão ser acertadas apenas no final do filme. 

Entre os personagens que entram e saem da vida do caboclo, estão Preto Velho (Antonio Pitanga, de Zuzu Angel), uma criatura devoradora de homens chamada Mãe de Pantanha (Flávia Alessandra, de No Meio da Rua) e um coronel (Sérgio Mamberti, de Tônica Dominante), que lhe oferece a mão da filha (Giselle Lima, da série de televisão Mandrake). 

Em todo o filme, procura-se um diálogo com a literatura de cordel, com seus tipos peculiares e seu humor popular. O roteiro, co-escrito pelo diretor e Bráulio Tavares (do humorístico Sai de Baixo), é baseado no romance As Pelejas de Ojuara, de Nei Leandro de Castro.

(© Estadão)

VÍDEO:
Veja o trailer de
'O Homem que Desafiou o Diabo'


 

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