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Virgínia Rodrigues busca novo caminho

15/10/2008

 

 

Foto: Divulgação

 

 

Crítica/"Recomeço"

Conhecida pelo repertório "afro", cantora lança disco de canções "voz-e-piano" acompanhada por Cristovão Bastos

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Por mais que sua voz lhe permita cantar qualquer coisa, Virgínia Rodrigues ainda estava atrelada a um repertório "afro" -na falta de um adjetivo menos impreciso. Em seus últimos discos, interpretou os blocos da Bahia ("Nós", 2000) e os afro-sambas de Baden & Vinicius ("Mares Profundos", 2003).

Mas ela volta com um salto inesperado, num desvio saudável e corajoso. Não por acaso, o CD se chama "Recomeço". Será lançado de amanhã a sábado no teatro Rival, no Rio. O show chega a São Paulo em novembro. É um disco de canções, voz-e-piano, em que ela é acompanhada por Cristovão Bastos -que já tocou com craques desse formato como Nana Caymmi e Gal Costa.

Sempre discreto, Cristovão atrai Virgínia para uma região de interpretação mais contida, em que ela só pode usar a potência da voz para reforçar as letras, não pelo prazer em si da emissão.

Mas, em parte, o repertório já favorece o uso da extensão vocal.

"Beatriz" (Edu Lobo/Chico Buarque) e "Por Toda Minha Vida" (Tom Jobim/Vinicius de Moraes) são músicas que pedem isso, e ela mostra o falsete poderoso e outros recursos.

O desafio dessas e de outras faixas é que já são canções muito e bem gravadas. "Canção de Amor" (Elano de Paula/Chocolate), por exemplo, é uma das intocáveis de Elizeth Cardoso. Mas Virgínia a registra com muito cuidado, quase dizendo as palavras na primeira passagem, deixando para se soltar um pouco no final.

Há algo de Elizeth em Virgínia, aliás: a fusão do canto lírico com o popular, uma sofisticação que parece natural, conciliando matéria bruta e delicadeza. Ao mergulhar agora nas valsas e nos sambas-canções, Virgínia se aproxima ainda mais da "divina".

Caráter trágico

O CD abre com "Todo Sentimento" (Cristovão/Chico), que Elizeth gravou. É a senha do "recomeço", pois Virgínia soa muito diferente, como uma alemã do lied. Mas está lá o fundo negro da voz, numa moldura melódica e poética marcadamente brasileira.

O "tempo da delicadeza" está também em "Estrada Branca" (Tom/Vinicius); "A Noite do Meu Bem" (Dolores Duran); "Boa Noite, Amor" (José Maria de Abreu/Francisco Matoso) e na pouco conhecida "Triste Baía de Guanabara" (Novelli/ Cacaso). Mas o disco possui um caráter trágico, como pede a voz de Virgínia.

Dor, despedida, abandono são agudos em "Eu Te Amo, Amor" (Francis Hime/Vinicius). Não se passa ileso.

Virgínia e Cristovão recuperam "Alma" (Sueli Costa/Abel Silva), tão gasta pela versão de Simone. Uma recuperação que provoca estranheza, como quase todo esse "Recomeço". Vale muito driblar os primeiros incômodos e constatar como o estranho pode ser sublime.

RECOMEÇO
Artista: Virgínia Rodrigues
Gravadora: Biscoito Fino
Quanto: R$ 32, em média
Avaliação: ótimo

(© Folha de S. Paulo)

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