07/11/2008
Mostra reúne 20 dramaturgos que vivem e atuam no Nordeste para
apresentar e debater as diferentes vertentes de sua cena
Beth Néspoli
A Mostra de Dramaturgia Nordestina, cuja ampla programação ocupa a um só
tempo o Centro Cultural São Paulo e o Centro Cultural Banco do Brasil,
oferece ao espectador uma oportunidade rara até para os padrões da
metrópole paulistana, que costuma receber quase todos os espetáculos de
passagem ou criados no País. Afinal, neste Brasil-continente costuma ser
bem mais intenso o trânsito de peças teatrais no sentido Sudeste para o
Nordeste do que no caminho oposto, pelo menos no que diz respeito a
dramaturgos que seguem morando na região, como é o caso dos
participantes desse evento.
Assim, essa mostra na 'contramão'
que inclui espetáculos, leituras dramáticas, debates e demonstrações de
trabalho de grupos pode surpreender aqueles que só conhecem uma vertente
da dramaturgia nordestina, aquela que segue o veio da cultura popular,
divulgada sobretudo por meio da obra de Ariano Suassuna. "Na linha de
criação que remete ao sertão e trabalha com temas regionais há uma
corrente estética que aborda o sertão mais profundo, toca em temas
míticos e personagens arquetípicos", diz o escritor Newton Moreno, autor
de As Centenárias, em cartaz no Rio. "Sem contar uma outra, de temas
urbanos, que foge totalmente à cor local."
Pernambucano radicado em São Paulo, ele participa já como
'estrangeiro' numa
das mesas, assim como Luis Alberto de Abreu e Márcio Aurélio. Não por
acaso, esses três nomes estão entre os debatedores convidados, pois há
afinidade entre a obra deles e a dessas diferentes vertentes. Autor de
textos como Agreste e Assombrações do Recife Velho, este último
adaptação de histórias regionais, Newton Moreno trabalha com elementos
regionais numa criação mítica e trágica, enquanto a pesquisa de Luis
Alberto de Abreu toca o mítico pelo ângulo da comédia e dos tipos
populares, com João Teité e Matias Cão, primos artísticos de João Grilo
e Chicó. Márcio Aurélio, diretor de Agreste, tem uma escrita cênica que
se alinha mais à estética urbana e contemporânea da cena, no caso da
nordestina, conhecida aqui, em São Paulo, pela passagem do grupo
Coletivo Angu, criador do espetáculo Angu de Sangue.
Claro que nada é tão estanque, há um contaminação entre essas vertentes,
o que sem dúvida será tema debatido nesse encontro. Marcos Barbosa, por
exemplo, autor de Virgolino e Maria, Auto de Angicos, recentemente em
cartaz com Marcos Palmeira e Adriana Esteves no elenco, é também autor
de Quase Nada, encenada no ano passado em São Paulo pelo diretor Alain
Brum, uma peça de forte impacto sobre a história de um casal de classe
média que mata um garoto num assalto.
A mostra conta com 20 dramaturgos de oito Estados e tem curadoria de
Sebastião Milaré, feita em parceria com o dramaturgo e encenador Racine
Santos, do Rio Grande do Norte. Os espetáculos - a parte da programação
que interessa a todo espectador - foram escolhidos de forma a abarcar
essa variedade de vertentes. Deus Danado, de João Denys (RN), segue a
linha do sertão mítico e profundo, enquanto Como Nasce Um Cabra da
Peste, de Altimar Pimentel (AL), homenageado no evento, se alinha ao
cômico popular. Curiosamente, uma outra montagem de Deus Danado, de
Mossoró (RN), já fez temporada no Sesc da Avenida Paulista.
Sinhá Flor, que tem texto e direção de Eliézer Rolin, aborda a relação
de duas velhas num asilo e ao que tudo indica é um desses espetáculos
que, embora lide com elementos locais, aqui alcança comunicação
universal. Lesados, de Rafael Martins (CE), já apresentado no Festival
Internacional de Teatro de Rio Preto, segue a linha urbana, fala da
apatia de uma gente sem causa, e poderia talvez ter sido escrita por um
autor de qualquer parte do País.
Escolha O Que Ver Ou Ouvir Da Cena Nordestina
ESPETÁCULOS
Como Nasce Um Cabra da Peste, de Altimar Pimentel (AL)
Direção de Eliézer Rolin com a Agitada Gang (PB)
Hoje e amanhã no CCSP
De quinta a domingo no CCBB
Lesados, de Rafael Martins (CE)
Direção de Yuri Yalmamoto, Grupo Bagaceira (CE)
De sexta a domingo no CCSP
Do dia 13 a 16 no CCBB
Deus Danado, João Denys (RN)
Direção de Nildo Garbo, com o Grupo Teatro Arte-em-Cena (PE)
De 20 a 23 no CCBB
Dias 25 e 26 no CCSP
Sinhá Flor, de Eliézer Rolin (PB)
Direção do Eliézer Rolin, Cia. Sírius de Teatro (PB)
De 27 a 30 no CCBB
Dias 2 e 3 de dezembro no CCSP
Horários: CCSP, de ter a sáb., 21 h, dom., 20 h
CCBB: ter a sáb. 19h30, dom. 18 h
PALESTRAS
Formas da Cultura Popular na Dramaturgia Contemporânea
Com Oswald Barroso (CE), Racine Santos (RN) e Luis Alberto de Abreu (SP)
Mediação: Sebastião Milaré (SP)
Amanhã, 16 h, CCSP
Raízes da Moderna Dramaturgia Nordestina
Com João Denys (PE), Paulo Vieira (PB) e Newton Moreno (SP)
Mediação: Sebastião Milaré (SP)
Quinta, 16 h, CCSP
A Encenação Contemporânea, Formas Tradicionais
Com Tácito Borralho (MA), Lindolfo Amaral (SE) e Márcio Aurélio (SP)
Mediação: Sebastião Milaré (SP)
Sexta, 16 h, CCSP
LEITURAS DRAMÁTICAS
O Romance do Conquistador, Lurdes Ramalho (PB)
Sábado, 16 h
Meire Love - Uma Tragédia Lúdica, Suzy Elida (CE)
Dia 15, 16 h
Aparição e Vagabundo, Vital Santos (PE)
Grupo Teatro Arte-em-Cena
Dia 22, 16 h
À Luz da Lua os Punhais, Racine Santos (RN)
Cia. Sirius de Teatro (PB)
Dia 29, 16 h
(©
Estadão)
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