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Vida em sintonia com a arte

16/11/2008

 

 

Foto: Blog Fernando Machado

Geninha Rosa Borges
 
Paixão de Geninha da Rosa Borges pelo teatro é mote da montagem Algum amor para Eugênia, texto inédito, escrito especialmente para o projeto O Aprendiz em Cena

Tatiana Meira // Diario

Realidade e ficção se misturam em Algum amor para Eugênia, texto inédito, escrito especialmente para o projeto O Aprendiz em Cena, por Antonio Edson Cadengue. Servindo como aquecimento para o 11º Festival Recife do Teatro Nacional, que começa na próxima quarta-feira, o espetáculo em homenagem à atriz Geninha da Rosa Borges terá suas primeiras apresentações neste sábado e domingo, às 19h, no Teatro Hermilo Borba Filho. E mais duas sessões na quarta e quinta-feira, no mesmo horário e local.

A arte do ator serve como eixo temático principal do Aprendiz em Cena deste ano, que mantém a investigação artística como objetivo, desde que foi criado, em 2002, pelo Centro Apolo-Hermilo, através da troca de conhecimentos entre atores e atrizes consagrados nos palcos e encenadores no começo da carreira. Nesta versão, o encenador Eduardo Machado, 23 anos, diretor do grupo Osicran de Teatro, de Igarassu, foi selecionado para dirigir a peça. "Foi uma experiência bastante engrandecedora, desde que começamos os ensaios, em setembro. Decidi os elementos do espetáculo, mas estava cercado por uma equipe que se doou muito", ressalta Eduardo.

Algum amor para Eugênia cruza as memórias de Geninha, atriz de 86 anos, com vozes imaginárias. Traz no elenco Marilena Breda, como a atriz, e Pascoal Filizola, que representa seu ouvinte e serve como "um duende, ou o espírito do teatro". "O cenário representa uma peça que acabou de terminar. Usamos muita metalinguagem na encenação, pois a vida desta atriz também se confunde com a história do próprio teatro pernambucano", conta Eduardo Machado. Ele acrescenta que quando a atriz se vê sozinha, aproveita o momento para reconstituir suas memórias e se fortalece para um outro desafio.

A direção de arte é de Marcondes Lima, que também participou da curadoria, ao lado de Luís Augusto Reis e Williams Sant'Anna. Geninha que começou a trilhar sua trajetória artística na década de 1940 e até hoje integra o elenco do Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP).

Com dois prêmios da Apacepe de Incentivo às Artes Cênicas, concedidos pelo Janeiro de Grandes Espetáculos no currículo - recebidos por O mistério das figuras de barro, de Osman Lins, em 2004 e por Três viúvas de Arthur, de Arthur Azevedo em 2006 - o Aprendiz em Cena é uma das iniciativas de maior repercussão do Centro Apolo-Hermilo ao longo do ano.

Serviço

Algum amor para Eugênia, no projeto O Aprendiz em Cena
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho (Bairro do Recife)
Quando: Até 20 de novembro, sempre às 19h
Quanto: R$ 10 e R$ 5 (meia-entrada)
Informações: 3232-2030/ 3232-2028

(© Diário de Pernambuco)


Geninha da Rosa Borges Um caso de amor ao teatro

Foto: Val Lima/Divulgação

Marilena Breda interpreta atriz de
86 anos e é dirigida pelo jovem
encenador Eduardo Machado

Fábio Lucas

O despertar

Esse iniciozinho meu, esse despertar para o teatro, me veio desde criança, no colégio. E foram as freiras, eu já disse aos quatro ventos, foram as Dorotéias que descobriram isso em mim. Eu era a mais despachada, gesticulava, era falante. Então, não tinha festa no colégio, não tinha chegada de autoridades, de freiras importantes, de superioras que eu não fosse falar pelo corpo discente.

A descoberta

Então teve uma chamada "noite de estrelas", em benefício dos leprosos. E Dr. Waldemar me viu (NR.: Waldemar de Oliveira, médico e encenador, fundador do Teatro de Amadores de Pernambuco, que completa 60 anos em 2001). Nessa festa eu dançava, eu cantava, eu fazia esquetes. E Dr. Waldemar me assistiu e aí, como a gente vê nesses filmes, né?, eu fui descoberta por Waldemar de Oliveira. Ele então falou comigo, perguntou se eu gostaria de fazer parte de um grupo de teatro que ele tinha e eu fiquei feliz da vida. Uma moça da sociedade não pisava no palco para fazer teatro. Então ele foi pedir aos meus pais autorização e eles deram, porque Dr. Waldemar na época era uma pessoa de altíssimo gabarito aqui no Recife. E continuamos amadores até hoje.

Amador X Profissional

Houve uma mudança de mentalidade em todas as pessoas. O amadorismo continua, eu acho que é apenas um respeito a uma bandeira levantada por Waldemar de Oliveira, que é um ícone falecido. Há a necessidade de todo trabalho, por pequeno que seja, ser remunerado. Há uma frase de Hermilo (Borba Filho), que eu também digo muito pra não pensarem que eu sou contra o profissionalismo. Ele diz que a profissão dignifica a arte, e isso é verdade. Se eu fosse começar hoje, claro que eu seria uma atriz profissional, eu apenas não posso fazer isso, já estou na minha hora de ir embora, e eu tenho que defender uma bandeira que eu defendi quando era mocinha.

No palco

Eu sempre tive muita sorte, eu não sei o que é, eu acho que tem atores, atrizes que trocam uma energia maior com o público, eu não sei se é a voz, se é a cumplicidade, se é que eles sentem, se tem alguma verdade, mesmo essa verdade real, entre aspas, do palco, mas eu sempre fui muito feliz nesse ponto. Eu já fiz 78 diferentes personagens. Eu já fiz tudo que você possa imaginar. Eu já fui preta, já fui branca, já fui rica, já fui pobre, já fui tudo.

Cinema

Dessas 78 personagens que eu fiz, meu Deus, eu não contei as de cinema! Eu fiz o primeiro filme falado feito em Pernambuco (O Coelho Sai), dirigido por Firmo Neto. Depois eu fiz Paraíba Mulher-Macho, de Tizuka Yamazaki. Em Baile Perfumado, eu fiz a D. Armênida que era a dona do bordel. Depois eu fiz um curta, O Pedido. E agora eu fiz um de Sandra Ribeiro, A Partida, com Paulo Autran. Esse ainda não foi finalizado.

O diploma

Olhe, eu vou lhe contar uma que você nem vai acreditar. Eu fui homenageada em Portugal. Na Mostra Internacional de Teatro, Meeting 99 Geninha da Rosa Borges. Em Valongo, uma cidade que fica a oito minutos do Porto. Em 68, eu fiz um estágio na Inglaterra. E, de lá, fui à França e levei O Marido Domado, de Ariano. E foi uma coisa maravilhosa. E, que sorte, que sorte!, imagine, Anysio Teixeira, o maior educador do Brasil, estava na platéia e quando chegou no Brasil me escreveu esta carta. E eu vou ler, viu? É pequenininha: "D. Maria Eugênia, recordo-me da Maison du Brésil, da peça de Ariano Suassuna, O Marido Domado, representada pela senhora e seu marido, Otávio da Rosa Borges. A impressão que me deixou a peça foi a de uma deliciosa transfiguração poética, de um pouco da rude candura nordestina, daquele palco desnudo do Le Corbusier. A representação entusiasmaria o autor. Tudo o que Ariano Suassuna escreveu, graças à senhora e ao seu marido, ganhou tal graça, tal frescura, que a peça parecia não apenas pular viva e espontânea, de uma noite de folguedos do sertão brasileiro, mas atingir aquela intensidade irreal de transcendência artística. A arte parece sempre ser uma transposição imaginativa da realidade. Foi isto o que a senhora nos deu, naquele começo de noite da Maison du Brésil, em Paris. Saí dali para o meu avião com um pouco da acre poesia nordestina, cantada em meu espírito. Creia que é com muita satisfação que eu desejo com essas palavras agradecer-lhe a oportunidade que tive de assistir à pequena peça de Suassuna recriada pela sua arte e a de seu marido. Com os cumprimentos muito cordiais, Anysio Teixeira". O papel era da Presidência da República, Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, CAPES. Já pensou que maravilha ter uma carta dessas! Ariano, depois, me disse: "Isto não é uma carta. Isto é um diploma!"

Vida de atriz

Eu acho que a minha grande dificuldade foi em relação à família. Eu boto a carapuça: eu acho que não dei aos meus filhos o que poderia ter dado. Engraçado, a gente se ilude muito. Eu pensei que eu ia ser atriz, e conhecida, e aplaudida, com muitos amigos, entende? Mas filho gosta é de beijinho, de carinhozinho, de sentar no colo, né? Eu acho que nessa parte eu falhei muito. Eu dava assim, no geral, o que eu achava que era o melhor. Eles estudaram sempre nos melhores colégios, tiveram aquela coisa de aula de dança, aula de violão, aula de inglês, francês e tudo. Então eles têm um bom lastro. Mas, esse outro lado, de colinho e de beijinho, não é tanto, porque eu também não sou uma pessoa disso, mas filho não reconhece isso.

Finale

O teatro foi quase tudo na minha vida... E eu digo a você, eu ’tô vivendo uns pedaços de tempo que estão enchendo a minha vida que eu acho que são frutos ainda dessa coisa minha com o teatro. (FL)

Com relação a este tema, saiba mais (arquivo NordesteWeb)


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