O
cantor carpinense transforma em livro o diário de cinco anos de turnês, que
até então estavam disponível apenas em seu blog na internet
José Teles
teles@jc.com.br
Nômade, o diário
de viagens que Silvério Pessoa autografa hoje, a partir das 19h, na sede da
edições Bagaço, no Poço da Panela, surgiu do blog Monolítico-tema, no qual o
artista se comunicava com seu público e traçava o roteiro de suas turnês
pelo Brasil, Europa e Ásia, entre 2003 e 2008. É um dos primeiros blogs do
gênero que se transfere do virtual para o material, com uma qualidade que
surpreendeu o próprio Silvério: “Para mim realmente foi uma grata surpresa,
porque o blog é um pouco frio e o livro ficou muito colorido, dinâmico, bem
versátil”.
Em
suas 184 páginas, fartamente ilustradas, o cantor tece comentários,
observações, traça suas andanças e sua trajetória, do sítio da avó (que
virou faixa do primeiro disco da Cascabulho) até shows em Tóquio: “Nasci em
Carpina, Zona da Mata Norte de Pernambuco. Região úmida. No sítio de minha
vó Alaíde, respirei o ar da cana-de-açúcar, vi na feira e ouvi na Rádio
Planalto de Carpina os cantadores, o maracatu rural, as cirandas e trios de
forró... Minha música é uma síntese das canções da Zona da Mata, Agreste e
Sertão, e da sonoridade e idéias dos jovens dos Centros Urbanos... Em 1994,
morando em Jaboatão dos Guararapes, Vila Rica, e estimulado pelas idéias do
Movimento Mangue, ouvi Chico Science dizer: “Faça o que você é que dá
certo...”. Silvério fez a coisa certa. Ajudou a fundar o grupo Cascabulho,
com o qual fez a primeira excursão ao exterior. Deixou a banda em 2000, e
arquitetou uma carreira solo das mais bem-administradas entre os músicos
pernambucanos da sua geração.
Seu primeiro
disco individual revisitou uma parte do repertório de Jacinto Silva, a que
se referia ao povo humilde que labuta na cana-de-açúcar. Bate o mancá – O
povo dos canaviais, lançado em 2001, numa produção independente, abriu o
caminho para o mercado internacional, quando passou a ser distribuído na
Europa, a partir de 2004, pelo selo L’Autre Distribution. A parceria com o
produtor francês Marc Regnier alavancou a carreira de Silvério Pessoa lá
fora. Ao longo dos cinco anos documentados no blog, e agora em livro, ele se
tornou presença constante nos principais festivais do verão europeu, num
intenso intercâmbio com artistas do Sul da França. Sua presença no filme
Moro no Brasil, do finlandês Mika Kaurismaki, que concorreu no festival de
Cannes, o tornou ainda mais conhecido. Foi, como diz Silvério, “uma boa
janela para a divulgação do meu trabalho na Europa”. No filme ele é uma
espécie de cicerone, levando a equipe de filmagem da Zona da Mata até o
Agreste e litoral.
Os textos são
curtos e leves. Funcionam bem na internet, e ainda melhor no livro, como por
exemplo: “LÍNGUA outra loucura. Depois de passar pelo espanhol, em dialetos
diferentes, como o galego e o catalão, entramos na França, depois ouvimos o
dinamarquês, o inglês, voltamos ao francês e, agora, em Sarawah, se fala o
malinês, chinês, o inglês (por causa da colonização da Inglaterra), e alguns
falam o francês”. Ou ainda, a espontaneidade ao comentar um festival numa
floresta na Malásia: “O SHOW – não existe comentar um show desses! Não
existe! Depois de 5 dias de festival, recebemos a enorme responsa de fechar
a noite, e ainda fui convidado para o ser o mestre de cerimônia do final do
festival, chamando para uma enorme canja todas as bandas participantes!
Imaginem. Lindo, emocionante, tendo uma floresta como cenário e um público
de 10.000 pessoas novamente gritando: frevoooo! Frevoooo!” Da Malásia
algumas páginas à frente e lá estão Silvério e banda de volta à Zona da Mata
Norte, com shows em Paudalho e Carpina, comentados com o mesmo entusiasmo
com que comenta um passeio na Holanda, ou um show em Paris, e tudo
fartamente documentado por muitas fotos. O fecho fica com versos de Cecília
Meireles: “Sei que canto. E a canção é tudo/ tem sangue eterno e alma
ritmada/ E um dia sei que estarei mudo: – mais nada”.
»Lançamento do livro Nômade, de Silvério Pessoa, com com sessão de
autógrafos, e exibição de trechos de turnês do cantor e banda em telão, a
partir das 19h, na sede da Edições Bagaço, Rua dos Arcos, 150, Poço da
Panela. Preço: R$ 40. Outras informações: 3441.0132.
(©
JC Online)