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O escritor Homero Fonseca detalha seus planos

02/12/2008

 

 

Foto: Alexandre Belém/Interpoética

O jornalista e escritor pernambucano Homero Fonseca

O jornalista Homero Fonseca tomou uma decisão corajosa. Abandonou um projeto bem sucedido de revista cultural para se dedicar integralmente à literatura. Pelo que se pode tomar do seu mais recente livro, Roliúde, quem poderá sair ganhando são as letras brasileiras. Nesta entrevista, concedida ao correspondente do Café Colombo na Feira do Livro de Porto Alegre, Fábio Gomes, Homero explica as razões de ter saído da revista Continente Multicultural, fala da organização da próxima Bienal do Livro de Pernambuco e ainda de seus projetos literários.

Por Fábio Gomes

O escritor e jornalista pernambucano Homero Fonseca esteve no Rio Grande do Sul entre os dias 3 e 5 de novembro, participando da 54ª Feira do Livro de Porto Alegre, justamente num momento de importantes mudanças em sua vida, onde a palavra de ordem é “desacelerar”. Três dias antes de viajar ao Sul, Homero afastou-se do cargo de superintendente de edição da revista Continente Multicultural, onde trabalhou nos últimos oito anos; e ao retornar a Pernambuco, passou a dividir sua semana entre São José da Coroa Grande e o Recife, equilibrando seu tempo entre novos projetos literários e a curadoria da Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, como ele mesmo nos explica nesta entrevista gravada no último dia de sua recente estada em Porto Alegre, 5 de novembro.


FABIO GOMES – Quais foram as circunstâncias que levaram o senhor a optar por sair da revista Continente?

HOMERO FONSECA – Eu passei oito anos na revista, com muita honra e com muito prazer. Fui primeiro editor executivo, depois editor, diretor editorial e por último superintendente de edição. E realmente, foi uma etapa importante da vida. Agora eu estou partindo para desacelerar um pouco meu ritmo diário de trabalho. Vou morar com minha esposa em São José da Coroa Grande, mas vou manter um escritório no Recife, onde irei dois, três dias por semana para fazer contatos. De São José, continuarei trabalhando no meu laptop, o mundo hoje, a partir do advento da Internet, é uma aldeia global como (Marshall) McLuhan nunca sonhou. Eu tenho vários projetos em andamento. O primeiro é a própria curadoria da Bienal 2009, que a partir de agora temos que nos debruçar com muito afinco. Além da Bienal, eu tenho três projetos de livro em processo de análise no MinC (Ministério da Cultura), para receber o certificado da Lei Rouanet, que são sobre toponímia de três estados nordestinos, a exemplo do que eu fiz com Pernambucânia – O que Há nos Nomes das Nossas Cidades (2006) – procurando, numa perspectiva multidisciplinar, o significado dos nomes das cidades do ponto de vista histórico, etimológico, cultural, filológico, geográfico etc. E tenho o esboço de outro romance, ainda sem título. De São José eu acho que vou conseguir fazer com mais tempo e com mais tranqüilidade. 


FABIO GOMES – Um dos anúncios que já foi feito aqui na Feira do Livro de Porto Alegre, relativo à próxima Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, é que o Rio Grande do Sul será o estado homenageado em 2009. Vocês já têm alguma diretriz a seguir para a montagem dessa programação?

HOMERO FONSECA – Veja só: em primeiro lugar vamos ressaltar que nisso há uma recíproca. Houve o convite da Feira do Livro de Porto Alegre, que já está na sua 54ª edição, é a mais tradicional do Brasil, provavelmente da América Latina, é um belíssimo evento cultural, e que neste ano homenageou Pernambuco, proporcionando a vinda de duas dezenas de escritores, que viemos debater, lançar livros, apresentar nossas obras, fazer intercâmbio com o público e outros escritores. Como recíproca, como contrapartida, nós vamos, levar uma delegação gaúcha à próxima Bienal do Recife. Agora, não podemos adiantar nada, porque vamos formalizar à Câmara Riograndense do Livro, que é a promotora da Feira daqui, o convite para que ela lidere esse processo, em articulação com outras entidades locais, Governo do Estado, Prefeitura de Porto Alegre, para dizer quem serão os convidados, que elementos culturais gaúchos serão levados para o público pernambucano. Na nossa participação aqui este ano, a literatura foi o foco, os escritores foram os protagonistas. Mas isso não é uma coisa isolada. Isso está dentro do universo cultural geral de Pernambuco. Então nós trouxemos pra cá a literatura de cordel, as xilogravuras de J. Borges, emboladores, violeiros, músicos, dançarinos… O Ariano Suassuna deu a aula-espetáculo Nau, que é uma grande síntese da cultura pernambucana e nordestina, com imensa receptividade. Isso também nós esperamos que os gaúchos façam, que levem outros aspectos importantes (de sua cultura), como uma forma de dar maior conhecimento mútuo de nossas culturas, dos nossos saberes. Pode parecer um discurso provinciano – mas não é – o fato de que nós denunciamos, e os gaúchos concordam com isso, essa hegemonia que há séculos se estabelece no eixo Rio-São Paulo, como se só se escrevesse, houvesse música, houvesse cultura no Rio e São Paulo. E esse intercâmbio Rio Grande-Pernambuco – e que vai continuar, tanto aqui quanto lá, com outros estados – vai proporcionar uma demonstração da diversidade cultural brasileira, que não passa só por aquilo que é produzido no Rio e São Paulo. Nós não negamos o que é produzido lá; nós negamos é que seja a única coisa válida em termos de cultura brasileira. 


FABIO GOMES – Eu vi no estande de Pernambuco aqui na Feira uma entrevista sua à Globo Nordeste, falando que a idéia inicial para seu romance Roliúde (2007) tem alguma ligação com o grande escritor pernambucano Hermilo Borba Filho. Qual é a ponte que liga a idéia do romance a Hermilo, e quanto há de Hermilo no resultado final?

HOMERO FONSECA – Eu não sou o mais indicado a dizer algo sobre o resultado final, os leitores e os críticos é que vão dizer. Pra mim, muito me honra qualquer vinculação com Hermilo, que foi não só um grande romancista e contista, como grande dramaturgo, diretor de teatro, estudioso da cultura popular, pesquisador, animador cultural – um líder cultural pernambucano da maior importância. A coisa aconteceu quando eu tava lendo um livro sobre Pré-História do Nordeste. Veja como são tortuosos os caminhos da literatura… O livro (Pré-História do Nordeste do Brasil) é de autoria da professora da Universidade Federal de Pernambuco, Gabriela Martin. Lá pras tantas, ela se referindo àquelas inscrições rupestres, àquelas pinturas de caverna, ela diz que aquilo não é arte, as pessoas às vezes confundem, aquilo é comunicação. Às vezes, comunicação com o sagrado, às vezes comunicação de documentação da vida cotidiana. A partir daí, ela faz uma digressão sobre a necessidade humana de se comunicar, de contar história em variadas circunstâncias… Todo tipo de sociedade tem esses contadores de histórias, essas pessoas que fazem esse registro da memória coletiva. E aí diz que Hermilo Borba Filho, certa vez, tinha se referido a um personagem que ele conheceu na Amazônia que era um contador de filmes, que ia de barco pelo Rio Amazonas subindo, enveredando pelos igarapés, parando pelas aldeias e aldeolas e narrando os filmes e ganhando dinheiro. Quando eu li esse trechinho do livro da Pré-História nordestina, eu digo “Nossa Senhora! Que personagem maravilhoso! Que personagem de ficção! Como se pode desenvolver a história de um camarada desses!” E comecei a esboçar o romance. Aliás, esse romance que eu vou concluir agora, eu já vinha começando a pensar nele, abandonei porque esse (Roliúde) veio mais forte. E comecei a me dedicar a construir o personagem, um contador de história. Teria que ser um personagem pícaro, de grande oralidade, de grande verve pra poder prender e fascinar as platéias a ponto de viver disso, ganhar dinheiro com isso. Só que no iniciozinho eu já percebi que não podia fazer exatamente como Hermilo tinha falado, na Amazônia, porque eu não conheço a Amazônia, não conheço os costumes, a mentalidade, a fauna, o meio-ambiente… como é que ia ser? Então eu vi que poderia ser no Nordeste, onde é comum ter contadores de filmes amadores, nas casas de família, nos colégios, nas praças e tal; apenas o transformei num profissional. E por esse caminho tortuoso eu produzi Roliúde, tendo esse personagem picaresco, Bibiu, como protagonista. E diria que o que há de comum com Hermilo – que em nenhum momento eu tomei como modelo, nada disso -: eu sempre li Hermilo, conheço boa parte da obra dele, admiro muito, mas sem dúvida a temática tem a ver, o homem inserido naquele seu espaço regional sem ser regionalista, sem ser provinciano, em nenhum momento negando sua configuração própria, o seu caráter próprio e ao mesmo tempo universal.


FABIO GOMES – Já falamos de Pernambucânia e Roliúde. Antes desses, o senhor lançou outros quatro livros, Viagem ao Planeta dos Boatos (1996), A Vida é Fêmea (2000), Mário Melo: A Arte de Viver Teimosamente (2001) e Pequeno Teatro da Vida (2002). Um livro-reportagem, uma biografia, e dois livros de contos e crônicas.

HOMERO FONSECA - Mário Melo é um perfil, não chega a ser uma biografia. Viagem ao Planeta dos Boatos é um livro-reportagem. Eu sempre amei a literatura, mas enveredei pelo jornalismo para ganhar a vida. São duas atividades paralelas, ambas trabalham com a palavra, mas não se confundem em nenhum momento. E de um campo você aprende pra ir para o outro. Por exemplo: da literatura, eu aprendi para o jornalismo a tentar escrever de maneira mais elegante, de maneira menos comum. Do jornalismo para a literatura, eu aprendi a observação da vida, dos tipos humanos, que vão ser minha matéria-prima para a ficção. Agora, a literatura exige sugestão, exige ambigüidade, exige que o leitor tenha uma parcela de construção do texto, do conteúdo, do personagem, enquanto que no jornalismo é o contrário: você tem que ter o possível de precisão, de objetividade, de deixar claro para o leitor os fatos que aconteceram. Essas duas vertentes então sempre estiveram próximas a mim. O primeiro livro foi justamente um livro-reportagem, sobre um fenômeno que aconteceu no Recife em 1975. Foi uma grande enchente, seguida de um boato de que a barragem do Tapacurá havia estourado, provocando um pânico coletivo na cidade. Fiz matéria pro jornal, na época eu trabalhava no Estadão. Em seguida, fui aprofundando, vendo aquilo à luz da psicologia social, da sociologia, do jornalismo, da política, da cultura, comparando com outros casos semelhantes de pânico produzidos por rumores e produzi esse primeiro livro. Meu segundo livro foi de contos, A Vida é Fêmea. São contos de uma temática só: mulheres em ação erótica, urbanas, liberadas, com nível de informação muito grande, com o grande problema da responsabilidade por sua liberdade, que é a essência da questão existencial, e também com suas indecisões. É bem diferente de Roliúde. Aí não tem nada a ver com cultura popular nem com oralidade. Há outra oralidade… (risos).

(© Café Colombo) 


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Blog de Homero Fonseca

 

ÁUDIO

O escritor pernambucano conta a Fabio Gomes - www.jornalismocultural.com.br - sua participação no Sarau Elétrico, em Porto Alegre - nov/2008

Homero Fonseca - Entrevista


 

VÍDEO

Clipe sobre o livro Roliúde

 

 

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