Fotos: PE360Graus
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Centro
poderá abrigar coleção da arquiteta que morreu na sexta-feira sem ver
exposto ao público seu último trabalho, um projeto museográfico no Museu
do Homem do Nordeste
Olívia Mindêlo
oliviamindelo@jc.com.brO ímpeto
criativo e incansável de Janete Costa não se foi com ela na noite da
última sexta-feira, quando fechou os olhos pela última vez. A arquiteta
e curadora, que faleceu depois de longa luta contra um câncer, deixa
como legado mais do que os frutos de seu trabalho, mas a marca de uma
personalidade que não descansou até o fim. O pulso ativo fica para quem,
daqui em diante, tem a tarefa de dar continuidade aos projetos iniciados
por ela. Fica também para uma legião de admiradores e profissionais
influenciados por sua atuação.
De acordo
com a galerista Lúcia Santos, filha da arquiteta, um dos desejos da mãe
era fazer circular a ampla coleção pessoal de arte popular que acumulou
ao longo da vida, como amante e impulsionadora dos “artistas do povo”. O
acervo familiar está sendo negociado para ficar um tempo, por meio de
comodato, com o Instituto do Imaginário, em São Paulo. “O desejo dela
não era vender as peças, mas mostrá-las”, conta Lúcia, responsável pela
curadoria da coleção a partir de agora. Projetos de exposições e até um
centro em sua homenagem estão sendo pensados no momento.
O que
amigos e familiares lamentam é o fato de Janete Costa ter morrido sem
ver concretizado o último grande trabalho de sua carreira: o Museu do
Homem do Nordeste, da Fundação Joaquim Nabuco, em Casa Forte. O espaço,
fechado há mais de quatro anos para reformas, vai reabrir as portas no
dia 17 deste mês com novo projeto museográfico, assinado justamente pela
arquiteta. Aliás, doado por ela. A diretora do museu, Vânia Brainer,
conta que, como havia entraves burocráticos para a contratação direta de
Janete, ela preferiu não cobrar nada pelo trabalho, temendo que alguém
de fora pudesse vir a fazê-lo. “Ela disse que era uma questão de
pernambucanidade. Então, abriu mão do valor, que não era baixo”, conta,
sem querer revelar o suposto cachê.
“Ficamos
surpresos. E ela materializou no papel tudo que a gente havia pensado
para o museu. Ela deu uma lição mesmo dessa pernambucanidade, de amor
pela arte, pela cultura. Nossa amizade foi de curta duração, mas vai
ficar como o contato profissional mais importante até agora da minha
vida”, ressalta Vânia. Pouco antes de morrer, Janete também doou cinco
obras do artista Lourenço para o acervo do mesmo museu, que devem ser
expostas quando o segundo andar do espaço for inaugurado em 2009 (se
tudo der certo).
Ao
Instituto Ricardo Brennand, na Várzea, Janete Costa vendeu uma coleção
de vidros, uma paixão tão grande quanto sua mania por colecionar
antigüidades e obras de arte. As 107 peças podem ser vistas
permanentemente num espaço reservado da pinacoteca do IRB.
VIDA
INTENSA
Janete
Costa morreu aos 76 anos como se tivesse vivido cem. Desses, meio século
de vida foi dedicado ao trabalho, através do qual desenvolveu mais de
três mil projetos, percorrendo o mundo afora em busca inspiração. “Ela
tinha um ímpeto de criação muito grande. Quando viajávamos, via uma
coisa e já colocava no projeto pouco tempo depois. Tinha uma necessidade
de inovar e um olho muito aguçado”, lembra o arquiteto e amigo Carlos
Augusto Lira, que iniciou a vida profissional no escritório de Janete e
Borsoi, influências declaradas em sua carreira.
Com o
arquiteto Acácio Borsoi, agora viúvo, foi casada durante mais de 40 anos
e teve uma filha, Roberta Borsoi, também arquiteta. Do primeiro
casamento, foram três filhos, Cláudia, Mário e Lúcia Santos. Para todos,
a mãe é uma referência incontestável, na vida pessoal ou profissional.
“Ela foi
pioneira em quebrar o tabu de que arte popular devia estar na casa de
campo ou de praia. Ela colocou a obra desses artistas dentro da sala de
estar de muitas pessoas importantes, dando o mesmo peso dos artistas
consagrados. Durante 40 anos ela fez isso, divulgando o trabalho em
bonitas exposições”, ressalta o filho e arquiteto Mário Santos, radicado
no Rio de Janeiro.
Além de
realizar mostras com artistas populares e inseri-los em seus projetos,
Janete Costa incentivou o trabalho deles, prestando consultoria e apoio.
Recentemente, ajudou a brotar a produção de Garanhuns, sua cidade natal,
através de projetos com novos talentos. Os frutos são notáveis.
(©
JC Online)
O adeus à arquiteta Janete Costa
"Todo meu bem". Foi com esta frase que o arquiteto Acácio Gil Borsoi, de
84 anos, despediu-se da esposa, a arquiteta e decoradora Janete Ferreira
da Costa, 76, sepultada neste sábado no cemitério Morada da Paz, em
Paulista. A pernambucana, que faleceu na noite da última sexta, era um
dos nomes mais conhecidos da arquitetura nacional e lutava há mais de
três anos contra um câncer no estômago. Familiares, amigos e
personalidades do estado estiveram no velório para acompanhar a
despedida.
Janete morreu em casa, em uma pequena Unidade de Terapia Intensiva (UTI)
particular, montada na semana passada pelo Hospital Português, depois de
ter passado 42 dias internada no centro médico. Segundo a assistente
Alzinete Henrique da Silva, a arquiteta preferiu ficar seus últimos
momentos acompanhada da família e, mesmo sentindo muitas dores e
precisando ficar boa parte do tempo sedada, ela não parou de trabalhar.
"Na última quinta-feira, estava olhando alguns projetos. Era realmente
uma lutadora, não desistiu", comentou Alzinete.
"Janete é uma das poucas pessoas que indo embora deixa um vazio enorme
no país", comentou Ricardo Brennand, amigo que lembrou de momentos
importantes e de exposições dela pelo mundo. "Ela foi uma das maiores
divulgadoras dos artistas populares brasileiros. Criou uma escola",
completou Borsoi.
Além do marido, com quem foi casada por 40 anos e tinha uma única filha,
Roberta Borsoi, a decoradora deixa outros três filhos, quatro netos e um
bisneto. Juntos eles mantêm o escritório Borsoi Arquitetura Ltda, na
Avenida Domingos Ferreira, em Boa Viagem, e mais duas filiais, uma no
Rio de Janeiro e outra em São Paulo. Os projetos que estavam em
andamento, como um museu em Belo Horizonte, outro na Paraíba e alguns
trabalhos para o governo de Pernambuco, serão continuados pelos filhos
da arquiteta, que já haviam assumido os escritórios.
"Durante todo este tempo, ela se manteve forte e espirituosa, sempre
surpreendendo os médicos e superando diversos percalços. Nos últimos
dias, estava mais frágil e, depois de terpassado bastante tempo no
hospital, pediu aos médicos para ir para casa. Agora, deveremos tocar a
bola para frente, pois foi isso que ela sempre nos ensinou", disse a
filha Roberta, que cuida do escritório no Recife.
Janete, que teve diversas de suas obras executadas no Brasil e no
exterior e também era especialista em arte popular, nasceu no interior
do estado, em Garanhuns, em 1932, e aprendeu seu ofício na Faculdade
Nacional de Arquitetura, no Rio de Janeiro. Entre os trabalhos mais
conhecidos, destacam-se as restaurações de bens históricos, como o
Teatro Arthur Azevedo e o Palácio dos Leões, no Maranhão, além do Solar
do Jambeiro e a Igreja São Lourenço dos Índios, no Rio.
A sensibilidade de Janete Costa como curadora e colecionadora pode ser
conhecida em duas mostras que estão em cartaz no Recife. No Instituto
Ricardo Brennand, há uma sala formada por peças que ela colecionava
junto a Borsoi. A arquiteta também fez a curadoria da exposição do
acervo do Museu de Arte Popular, reaberto no Pátio de São Pedro.
(©
Diário de Pernambuco, 30.11.2008) |